fizeram compra, em 2014.
Ômega — e descia o motorista, que comprava pão, mortadela Ceratti e café em um copo descartável.
Levava o café para o carro. Segundo ele, Dona Marisa descia para fumar, tomava o café e depois ia
rua da padaria (sentido São Paulo), em frente ao mercadinho Jandira.
“Eu só soube que era a ex-primeira dama quando uma pessoa me disse que era ela”, diz. Gesuldo
A padaria onde Marisa comprou pão
No roteiro traçado pelos procuradores da república para colocar Lula no centro de uma grande
organização criminosa, o sítio seria propriedade oculta do ex-presidente.
Ele teria recebido o Santa Bárbara como propina pelos contratos milionários que a Odebrecht e a
OAS mantinham com a Petrobras.
É uma história que ganhou as páginas da velha imprensa, muitos minutos (talvez horas) do Jornal
Nacional, mas não encontra amparo em provas.
Os moradores mais antigos do bairro Portão lembram que o sítio foi do senhor Gastão, que, depois, o
vendeu ao casal Adalton e Neusa Emílio Santarelli, donos de um loja na praça da Sé, em São Paulo.
Foi Adalton quem contratou para trabalhar como caseiro do sítio Élcio Pereira Vieira, que ganhou o
apelido Maradona quando veio de Brumado, na Bahia, para se juntar à família que trabalhava na
região.
“Ele é bom de bola e deram este apelido a ele logo que começou a jogar nos campos aqui da região”,
conta um morador do bairro.
Maradona não dá entrevista nem atendeu à campainha quando estive lá, na quarta-feira, 25 de julho.
Colegas peladeiros contam que ele ficou arredio à imprensa depois que viu como o Jornal Nacional
distorcia a notícia do sítio. “O que ele via na TV não tinha nada ver com o que via no sítio.”
Também se escandalizou com o vazamento de algumas fotos para a TV e para a revista Veja, em que
aparece ao lado do Lula.
Em uma das fotos, está com a mãe.
“Eram coisas pessoais do cara. O que isso tem a ver com a história do sítio?”, conta um vizinho.
Maradona começou a trabalhar e a morar no Santa Bárbara em 2005, cinco anos antes da propriedade ser vendida.
Para Lula?
Celeste, dono de uma loja de material de construção no bairro, diz que muito antes da Polícia Federal
aparecer por lá havia o boato de que o sítio era de Lula, mas, como conhecia o Maradona, perguntou
a ele: O sítio é do Lula?
“Ele respondeu que não, era de outra pessoa, acho que Fernando”, disse. E foi logo avisado: “Eu
nunca apoiei o Lula, nunca votei nele, mas acho essa história muito estranha”.
Celeste segue na conversa, recusando gravação, e diz que, hoje, com a queda no movimento do
comércio, começa a perceber que Lula faz falta. Não em Atibaia, onde nunca o viu, mas como
presidente da república.
“Ele (Lula) é um vendedor, sabia como promover o Brasil. Faz falta um líder como este. Nunca
pensei que fosse dizer isso: mas faz falta”.
Celeste é primo de Gesuldo, o gerente que ganhou destaque por dizer que viu Marisa na padaria. E
fiz a pergunta a Gesuldo: Lula é dono do sítio?
“Não sei, não dá para afirmar. Hoje, quando você vê a internet, parece que tudo começou a inverter.
O bandido agora é o Sergio Moro”, afirmou, sem esconder que admira o juiz de Curitiba.
A loja onde foi comprado cimento para a reforma: fechada
Se o Ministério Público Federal insistir na tese de que Lula é dono do Santa Bárbara, vai repetir a
mesma farsa do triplex do Guarujá.
O antigo dono do sítio confirmou, em depoimento, que vendeu a propriedade a Fernando Bittar e a
Jonas Suassuna, que são amigos do filho de Lula, Fábio, com quem já tiveram negócios.
No caso de Bittar, o dinheiro usado para a compra saiu de uma poupança do pai, Jacó, antigo amigo
de Lula, e foi para a conta do filho e, daí, para a conta de Adalton, proprietário anterior.
Jonas Suassuna entrou na história porque Fernando e Jacó não tinham dinheiro para comprar toda a
área, que inclui uma reserva de mata.
Jonas, que é rico, comprou a área de mata como investimento, e para atender aos amigos. Eles não
queriam que, para chegar à área de mata, se fizesse uma estrada de acesso cortando o sítio.
No cartório, havia duas matrículas para a propriedade. Uma era da área onde ficava a casa, a piscina
e o açude. A outra matrícula era de mata.
É o que contam os depoimentos e os documentos juntados no processo.
E Lula?
Ele está no centro desta história, mas não como proprietário. Nem como proprietário oculto.
Quem acompanhou de perto a transação conta que o sítio foi comprado para satisfazer dois
interesses: Fernando Bittar procurava uma área de lazer para comprar, com recursos que o pai lhe
transferiria, talvez como antecipação de herança — sobre isso, não há informação no processo.
Jacó Bittar, pai de Fernando, sofre de Mal de Parkinson e estava em crise de depressão quando foi
chamado por Lula para passar a frequentar a Granja do Torno, uma das residências oficiais da
presidência da república em Brasília.
Essa convivência teria feito bem a Jacó, que, no final do mandato de Lula, teria sugerido a compra
de um sítio para que continuassem a conviver nos fins de semana.
Comprado o sítio entre outubro e novembro de 2010, parte do acervo presidencial de Lula foi levado
para lá.
A dificuldade para encontrar um lugar para guardar o acervo é uma encrenca, que já foi alvo de
processo contra Lula.
Neste caso, o ex-presidente foi absolvido — a outra parte do acervo, bem maior, foi guardada num
depósito da Granero, com os custos pagos pela OAS.
No dia 15 de janeiro de 2011, Lula esteve no sítio pela primeira vez, com a família. Fernando e Jacó
Bittar estavam lá e o receberam.
Em junho de 2011, foi feita a primeira festa junina na propriedade, com enfeites que eram do acervo
presidencial.
O sítio era sempre muito movimentado, com encontros e festas frequentes, o que é um traço da da
personalidade de Lula: ele não gosta de ficar sozinho.
Como palestrante bem remunerado, Lula tinha recursos para comprar a propriedade e registrar no
próprio nome — ela custou R$ 1,7 milhão.
Mas não fez isso porque, ao que tudo indica, a propriedade não foi comprada para ser dele. Lula tem
um sítio pequeno, perto de São Bernardo, herança de família de Marisa Letícia.
Um jovem que prestou serviço na propriedade de Fernando Bittar em Atibaia conta que, uma vez, a
pedido da ex-primeira-dama, cortou lenha para que ela levasse para o que ela chamava de “meu
sítio”.
No sítio dela em São Bernardo, há um fogão a lenha, que ela gostava de usar. É um detalhe, um
testemunho, suficiente para mostrar que Marisa separava as coisas.
“Ela me pediu para cortar lenha para ela levar para o sítio dela. Lembro bem”, afirmou.
Mas havia no sítio em Atibaia dois pedalinhos e uma canoa de alumínio que ela comprou. Sim, a
família Lula usava o sítio.
Os pedalinhos, que custavam R$ 5,6 mil, foram comprados a pedido dos netos
Marisa Letícia, Maradona e Lula: foto pessoal vazada como prova — prova de quê? Só se for
da irresponsabilidade de procuradores
Uma pessoa que frequentou o sítio conta que estava lá quando os netos de Lula viram o termômetro
da piscina, no formato de um patinho e pediram à avó que comprasse um patinho igual àquele, só
que grande, para eles poderem passear pelo lago.
Na compra, Marisa aproveitou para comprar o barco de alumínio, usado por Lula para pescar. Onde
está o crime?
Na parte mais delicada do processo, há a reforma da cozinha, feita pela OAS em 2014, quando Lula
já não era presidente havia quatro anos.
É ilegal? Não.
Lula não era servidor público e, portanto, não pode se acusado de corrupção.
Mas se deve discutir essa reforma do ponto de vista ético.
As empreiteiras quiseram agradar um ex-presidente da república, como aconteceu no caso do
aeroporto feito na propriedade vizinha à fazenda de Fernando Henrique Cardoso, em Minas Gerais.
São brechas que uma pessoa pública não deveria permitir, porque comprometem a independência e
dão oportunidade a um escândalo, a depender do interesse da mídia.
No caso de Lula, a reforma da cozinha do sítio do amigo foi apresentada como crime grave, indício
do maior esquema de corrupção da Via Láctea. No caso de Fernando Henrique, a construção do
aeroporto foi ignorada.
É uma questão ética que precisa ser discutida, mas daí a imaginar que Lula se vendeu por uma
reforma de cozinha ou que ele entregou contratos da Petrobras por essa reforma, feita no sítio que
não lhe pertencia, é uma aberração.