A visão de uma blogueira negra sobre os médicos do país. Tente encontrar negros entre os
estudantes de medicina no Brasil.
O texto abaixo, de Mara Gomes, foi publicado originalmente no site Blogueiras Negras.
A medicina é uma das mais requisitadas e importantes profissões existentes no mundo. Por isso, é preciso ter um grande conhecimento para se tornar médico, uma coisa alcançada com longos anos de estudo.
Para conseguir cursar medicina no Brasil é necessário um conhecimento escolar de qualidade — adquirido, principalmente, em escolas particulares e cursinhos caríssimos.
Nossos médicos são formados, em sua maioria, por uma classe particular de pessoas. Pessoas que possuem um bom dinheiro, estudam em escolas particulares requisitadas, tiveram as melhores oportunidades e viveram uma vida abastada sem muitos problemas financeiros.
São raros os médicos que não vieram desse grupo. Não são todos, é claro, mas se trata da grande maioria. Esse grupo vive em um mundo à parte.
São pessoas que digerem e espalham informações burras da mídia racista e classista. Não entendem os problemas dos menos favorecidos, adoram colocar seus pontos de vista como se fossem os centrais em toda e qualquer discussão de minorias, acham cotas desnecessárias e injustas e dizem que o bolsa família é esmola para acomodar pobre.
Quem nunca encontrou um desses por aí, não é? Encontrei muitos na universidade, psicólogos e futuros psicólogos. E, pior, já até encontrei em postos de saúde. Duvido que alguém que frequenta os postos de saúde não tenha tido o mesmo contato.
Lembra aquele doutor(a) que sem olhar você no rosto demorou menos que 5 minutos para criar um “diagnóstico”? Para eles nós somos clientes e não pacientes.
Será que nos consideram “pessoas”? Porque a nossa medicina deixou de ser humanizada faz tempo. Para muitos médicos não existem pessoas, existe um grande negócio.
Essa é a classe que nos atende nos postos, e não se trata só de médicos. Pessoas assim também estão por trás da grande mídia, e são elas que ditam o que é certo e o que é errado.
Sim, isso é assustador, somos controlados pela grande classe média brasileira. No último dia 27 de agosto, vimos o que uma parte dessa corja de sábios ignorantes fez: chamaram médicos cubanos de escravos em sua chegada ao aeroporto de Fortaleza.
Para eles, a regra foi quebrada. É ofensivo ver um médico que não possua o porte hegemônico — o homem branco, classe média com “cara de médico”. O que veio de Cuba foram médicas com “cara de empregada doméstica”: como lidar com isso?
Mas o que é ter cara de empregada doméstica? O que é ter cara de médico? O Brasil tem tantos médicos brancos e empregadas negras que isso acaba entrando para um padrão – que, infelizmente, a classe média usa para classificar todos.
Há sim uma injustiça acontecendo aí e isso é uma questão não só de xenofobia, mas de racismo institucional. A regra foi quebrada e a classe médica ficou enfurecida. Sabemos que eles não estão perdendo empregos. Não um caso de direitos trabalhistas. É algo mais forte que isso e é cego quem não quer ver.
Recentemente a Universidade Federal da Bahia formou uma turma de médicos na qual só 3 ou 4 eram negros. Isso não faz sentido se a Bahia abriga, de acordo com o IBGE, uma população de 70% de negros.
A situação não muda em outros estados brasileiros. Numa favela, quantas pessoas estudam medicina, ou pelo menos têm a esperança real de poder um dia se tornar médico?
Como afirmou Cintia Santos Cunha, estudante brasileira negra da Universidade de Ciências Médicas de Havana: “No Capão Redondo, ninguém sonha ser médico”.
O texto abaixo, de Mara Gomes, foi publicado originalmente no site Blogueiras Negras.
A medicina é uma das mais requisitadas e importantes profissões existentes no mundo. Por isso, é preciso ter um grande conhecimento para se tornar médico, uma coisa alcançada com longos anos de estudo.
Para conseguir cursar medicina no Brasil é necessário um conhecimento escolar de qualidade — adquirido, principalmente, em escolas particulares e cursinhos caríssimos.
Nossos médicos são formados, em sua maioria, por uma classe particular de pessoas. Pessoas que possuem um bom dinheiro, estudam em escolas particulares requisitadas, tiveram as melhores oportunidades e viveram uma vida abastada sem muitos problemas financeiros.
São raros os médicos que não vieram desse grupo. Não são todos, é claro, mas se trata da grande maioria. Esse grupo vive em um mundo à parte.
São pessoas que digerem e espalham informações burras da mídia racista e classista. Não entendem os problemas dos menos favorecidos, adoram colocar seus pontos de vista como se fossem os centrais em toda e qualquer discussão de minorias, acham cotas desnecessárias e injustas e dizem que o bolsa família é esmola para acomodar pobre.
Quem nunca encontrou um desses por aí, não é? Encontrei muitos na universidade, psicólogos e futuros psicólogos. E, pior, já até encontrei em postos de saúde. Duvido que alguém que frequenta os postos de saúde não tenha tido o mesmo contato.
Lembra aquele doutor(a) que sem olhar você no rosto demorou menos que 5 minutos para criar um “diagnóstico”? Para eles nós somos clientes e não pacientes.
Será que nos consideram “pessoas”? Porque a nossa medicina deixou de ser humanizada faz tempo. Para muitos médicos não existem pessoas, existe um grande negócio.
Essa é a classe que nos atende nos postos, e não se trata só de médicos. Pessoas assim também estão por trás da grande mídia, e são elas que ditam o que é certo e o que é errado.
Sim, isso é assustador, somos controlados pela grande classe média brasileira. No último dia 27 de agosto, vimos o que uma parte dessa corja de sábios ignorantes fez: chamaram médicos cubanos de escravos em sua chegada ao aeroporto de Fortaleza.
Para eles, a regra foi quebrada. É ofensivo ver um médico que não possua o porte hegemônico — o homem branco, classe média com “cara de médico”. O que veio de Cuba foram médicas com “cara de empregada doméstica”: como lidar com isso?
Mas o que é ter cara de empregada doméstica? O que é ter cara de médico? O Brasil tem tantos médicos brancos e empregadas negras que isso acaba entrando para um padrão – que, infelizmente, a classe média usa para classificar todos.
Há sim uma injustiça acontecendo aí e isso é uma questão não só de xenofobia, mas de racismo institucional. A regra foi quebrada e a classe médica ficou enfurecida. Sabemos que eles não estão perdendo empregos. Não um caso de direitos trabalhistas. É algo mais forte que isso e é cego quem não quer ver.
Recentemente a Universidade Federal da Bahia formou uma turma de médicos na qual só 3 ou 4 eram negros. Isso não faz sentido se a Bahia abriga, de acordo com o IBGE, uma população de 70% de negros.
A situação não muda em outros estados brasileiros. Numa favela, quantas pessoas estudam medicina, ou pelo menos têm a esperança real de poder um dia se tornar médico?
Como afirmou Cintia Santos Cunha, estudante brasileira negra da Universidade de Ciências Médicas de Havana: “No Capão Redondo, ninguém sonha ser médico”.
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