sexta-feira, 20 de junho de 2008

DE OLHO NO MUNDO

Há uma semana, o presidente afegão Hamid Karzai ameaçou botar seu exército em território paquistanês para combater o Talibã, lá. Mas a guerra voltou para o seu lado da fronteira. Desde sábado, o Talibã pressiona Kandahar, a cidade natal de Karzai – seu irmão é o governador –, e espécie de capital da etnia patane.

É também a cidade onde surgiu o Talibã. A mesma cidade onde fica a mesquita na qual, dentro, está guardado um manto que um dia pertenceu a Maomé e que, perante a vitória do Talibã nos anos 1990, seu líder máximo, o mulá Omar, um dia vestiu em público.

Ainda hoje pela manhã, as tropas da OTAN, auxiliadas por helicópteros, lutavam contra a ofensiva Talibã. Dura dias. Homens bomba, dentro da cidade, explodem-se em mercados, nas ruas. O Talibã invadiu a cadeia e soltou todos os seus que estavam presos na terça-feira. Não há dúvidas de que tiveram ajuda de soldados e oficiais do governo. Quem é do governo está escondido. O bairro de Arghandab foi conquistado e está cercado por minas.

Não há, a médio ou longo prazo, nenhuma chance de o Talibã, após assumir o controle de Kandahar, mantê-lo. Ao menos, não enquanto a OTAN estiver no país. Mas estrategicamente o ataque faz sentido. Primeiro, mostra à população quem manda. Mesmo após a derrota final do grupo do mulá Omar, em 2001, o Talibã continua presente. E, quando os ocidentais deixarem o país, lá estarão eles de volta. Quem tiver desagradado a sombra do Talibã neste momento terá um ajuste de contas pela frente.

O outro objetivo é desviar a atenção das forças internacionais. Até os canadenses, que deveriam estar dedicados apenas à patrulha, tiveram que se envolver nos combates intensos que ocorrem. Enquanto isso, a pressão sobre o Khyber Pass, na fronteira do país com o Paquistão, relaxa. É onde estão os principais líderes da al-Qaeda, incluindo Osama bin-Laden.

Sete anos após ter deixado o poder, o Talibã está tão forte quanto esteve nos dias anteriores à tomada do poder. Nenhum assunto deveria ter mais prioridade para EUA e Europa, hoje, do que a prisão de bin-Laden e o desmantelamento da cúpula da al-Qaeda. Tais ações enviariam uma poderosa mensagem para o mundo. No entanto, os EUA não conseguem se envolver profundamente no Afeganistão por estarem sufocados pelo Iraque, que exige sua máxima atenção e concentração.

Enquanto isso, nos círculos internacionais, a discussão envolve quem deve suceder Hamid Karzai, cujo mandato está por expirar. Há um bocado de gente propondo o atual embaixador do país na ONU, Zalmay Khalilzad. Há um pequeno detalhe, porém: ele é cidadão norte-americano. Não é possível que alguém tenha dúvidas de como será percebido no país.

Neste contexto, imaginar uma guerra envolvendo o Irã é uma piada.

Escrito por Pedro Doria

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