domingo, 26 de agosto de 2018

Agiotagem legalizada: Bancos ganham R$ 72 bi somente com tarifas


Gilberto Menezes Côrtes

Eles são “discretos e silenciosos”. Mas não são como os “alquimistas” de Jorge Benjor, “ativos e perseverantes” na arte de tentar transformar, com “seus preciosos cadinhos”, matéria em ouro. Os bancos brasileiros, se superam. Mesmo com o PIB em queda, a retração de empréstimos às grandes empresas e a inadimplência de 63,4 milhões de pessoas, conseguem transformar os “cadinhos” das tarifas em fonte de lucro bilionário.
Só no primeiro semestre, as receitas com tarifas e serviços financeiros dos 10 maiores bancos do país superaram os R$ 72,3 bilhões. Não só um aumento muito acima da inflação em 12 meses. Na Caixa, Itaú, Bradesco, Santander e Banco do Brasil, as receitas com contas correntes e cartões de crédito/débito seguem crescendo na faixa de dois dígitos.
No balanço semestral dos grandes bancos salta aos olhos outra questão. Os ganhos das receitas e tarifas já cobrem cerca de 80% das despesas com pessoal e administrativas, que incluem os investimentos em tecnologia. Eis aí o segredo dos ganhos desses alquimistas. Nos últimos cinco anos, quando o país atravessava a maior recessão da história, investiram pesado em informática e tecnologia, enxugaram o pessoal e passaram a ter custos operacionais cada vez menores.
Quem banca isso? Você, meu caro leitor, leitora. Quanto mais informatizada for sua relação diária com o seu banco, mais lucro você transfere ao banco em forma de “cestas especiais de tarifas”. Faça um balanço de quantos talões de cheque e extratos impressos você tira mensalmente. Com os negócios cada vez mais no ambiente on line ou via celular, estimulados pelas campanhas publicitárias do Itaú, Santander e Bradesco, que criou a “Bia”, você esquece de se perguntar o porquê das taxas crescentes.
Mas seu banco não esquece e, a depender do status da conta corrente, lhe debita de R$ 20 a R$ 90 todos os meses. Por ano, o valor vai de R$ 140 a R$ 1.080. Fora a aranuidade daquele cartão de crédito que o gerente lhe ofereceu com gratuidade por 12 meses e você aceitou. Isso foi planejado, como os bancos destacaram em 2017 o “planejamento de tarifas especiais”. Um bote calculado no seu bolso.
Fundos de Investimento

Se você consegue economizar um pouco do salário mensal e faz investimentos, há tarifas mais silenciosas. As taxas de administração dos fundos de investimento (ações, DIs e Renda Fixa) fazem uma diferença tremenda: descontos que variam de 1,2% a 1,7% podem garantir rendimentos real ou perdas para a inflação. As frações nas taxas de administração foram o sucesso de algumas instituições não bancárias que atrairam grandes investidores com tarifas zero de T.A. Os grandes bancos perderam fatias importantes ao longo de 2016 e 2017. Diante disso, o maior deles, o Itaú Unibanco, resolveu comprar metade da XP Investimentos, a mais bem sucedida boutique financeira do país. Mantendo tarifas zero, tomaria clientela da concorrência e esperava assumir o controle total em 2020. Mas o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) entrou em campo. Ao ver risco de maior concentração bancária, fez objeções que levaram o Banco Central a impor restrições à escalada do Itaú no capital da XP, uma instituição que não cobrava tarifa.
Imagine que ganhos você transfere ao banco nos seus investimentos quando mal se sabe quanto lhe cobram de tarifas? Na conta do telefone ou da TV a cabo, é mais ou menos claro o que está sendo cobrado e o que, de fato, é usado. É possível, por exemplo, reduzir o pacote do SMS.
O terreno das tarifas bancárias é misterioso como a ação dos alquimistas. Nenhum gerente apresenta uma cesta mais em conta. Apenas ampliam as franquias, pouco ou nada usadas, e as cobranças mensais, com resultados extraordinários, para os bancos.
Veja a comparação com o Orçamento de 2018. De janeiro a junho, os bancos arrecadaram R$ 72,3 bilhões em receitas de tarifas e taxas de administração. O Orçamento da Educação é de R$ 89 bilhões. O gasto da União com a Saúde é de R$ 119,2 bilhões.
Sao gastos financiados com os impostos indiretos — que incidem no consumo, da energia elétrica e combustíveis até bebidas e cigarros, que têm as maiores alíquotas —, além do Imposto de Renda na fonte e impostos estaduais e municipais. Uma das críticas à questão tributária brasileira, injusta e regressiva, que taxa mais a renda dos mais pobres e alivia a dos mais ricos, é a falta de transparência. E as tarifas bancárias?
Não há um detalhamento de cada conta. Assim, discretos e silenciosos, os banqueiros seguem acumulando fortunas bilionárias, por juros escorchantes ou tarifas abusivas. Nas barbas do Banco Central.

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