terça-feira, 28 de novembro de 2017

GLOBO E MINISTERIO PÚBLICO INVADEM CELAS E PUBLICAM VIDEOS DE DETENTOS


Presos sem culpa formada são expostos como canibais!   

Uma vistoria realizada pelo MP na última sexta-feira (24) no presídio de Benfica, no Rio, foi
divulgada, em cadeia nacional, pela Rede Globo. Nas imagens as celas de Sérgio Cabral, Anthony
Garotinho, Jorge Picciani, Rosinha Matheus e Adriana Ancelmo são revistadas, e remédios e
alimentos são apreendidos.  De acordo com a Constituição, no artigo 5º, inciso X: “são invioláveis a
intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo
dano material ou moral decorrente de sua violação”, medida constitucional que vale, inclusive, aos
presos resguardados pelo Estado.

É de ter vergonha do Ministério Público
Por Eugênio José Guilherme de Aragão ex Ministro da Justiça

Sem mais, nem menos, eis que o programa “Fantástico” da Rede Globo exibe imagens de Sérgio
Cabral e Garotinho, ex-governadores do Rio de Janeiro, na prisão em que se encontram. Presos
estão, sem culpa formada, porque seriam, ao ver de juízes deformados pela tal “opinião pública”, tão
perigosos quanto Hannibal Lecter, o assassino serial engaiolado no filme “O silêncio dos inocentes”.
As imagens dos políticos preventivamente presos teriam sido obtidas com apoio imprescindível de
membros do Ministério Público do Rio de Janeiro, aquela mesma instituição que convidou Kim
Kataguiri para palestrar sobre “bandidolatria”. Desviaram-se criminosamente de sua função de
fiscalizadores da execução penal para exporem a intimidade de pessoas presas preventivamente.
Há algo de muito doentio com nossas instituições persecutórias, aí incluído o judiciário com
competência penal, porque há muito deixou de ser isento para comungar, com o ministério público e
a polícia, a cosmovisão falso-moralista e punitivista. Hoje, quem cai nas garras dessa troika, que não
espere justiça. Não espere imparcialidade. Saiba que corre o risco de ser exposto, junto com sua
família, à execração pública, conduzido de baraço e pregão diante das câmeras de televisão. Pouco
interessa se o caso contra si é frágil ou forte; a gravidade da acusação que pesa é medida pela
audiência que possa ser atraída, composta de um público cúpido em se deleitar com a desgraça
alheia.
Se o suspeito exposto é uma personalidade pública, a audiência vai ao delírio, para regozijo da mídia
e, sobretudo, dos meganhas travestidos de juízes, promotores e investigadores.
A Schadenfreude virou sentimento legítimo. Nunca, depois do iluminismo, se festejou tanto, nestas
terras, o suplício exposto de alvejados pelo sistema persecutório, quanto nos dias atuais, em tempos
de Lava-Jato. Falta só amarrá-los na roda e esquartejá-los em praça pública. E a massa celerada
ovaciona o ministério público que lhe proporciona tamanho show. Pouco lhe interessa que o próximo
a cair nas malhas dessa instituição sem freio e sem critério pode ser cada um daqueles que ali estão
em espasmódico orgasmo de ira descontrolada. Porque, para virar alvo de promotores ou
procuradores falso-moralistas e redentoristas, basta estar no lugar errado, na hora errada.
E, em tempos de Lava-Jato, os Dallagnóis da vida assumem abertamente que “sem exposição” não
seria possível responsabilizar os alvos de sua sacrossanta operação. Na falta de provas, de argumento
técnico, o delírio das massas legitima a repressão. Por isso anunciam, para sua audiência de sádicos
psicopatas, que 2018 será o ano da “batalha final” da Lava-Jato, um clímax imperdível, a coincidir
com as eleições gerais e, claro, com prometido potencial de influenciá-la em proveito de quem, por
juizecos e promotorecos, são tidos como merecedores da confiança popular.
Não escondem que o teatro sórdido montado contra personagens de visibilidade tem finalidade
política. Depois de terem virado heróis nacionais por força de midiática atuação à margem da
Constituição e das leis processuais, querem se assenhorar do Estado como um todo, avalizando, ou
não, quem se candidate a cargo eletivo. Cria-se, assim, o index personarum prohibitorum do
ministério público.
Resta-nos prantear essa instituição, que traiu sua mui promissora missão constitucional de promotora
dos valores democráticos e dos direitos fundamentais, para se tornar um cínico verdugo a buscar
aplauso de uma gentalha embrutecida, sem escrúpulos. Tudo em nome de um primitivo conceito de
moralidade que não se sustenta diante dos abusos cometidos, da ambição desmedida e da ganância
por desproporcionais vantagens pela função mal e conspiratoriamente exercida.
Triste fim do ministério público a que pertenci em atividade com tanta honra. Vulgarizou-se.
Amesquinhou-se. Tornou-se um trambolho, um estorvo para as forças democráticas deste país.
Gordo e autossuficiente, deleita-se no seu bem-estar, sem preocupação com milhares de brasileiras e
de brasileiros impactados pela baderna política e econômica que causaram; brasileiras e brasileiros
que não moram no Lago Sul de Brasília, não moram em Ipanema ou no Leblon do Rio de Janeiro e
nem nos Jardins de São Paulo. Não têm recursos para planos de saúde eficientes que nem o Plan-
Assiste do Ministério Público da União e nem para colocar filhos em escola privada. Será que os
promotorezinhos e os procuradorezinhos pensam que essa população se alimenta de blá-blá-blá
moralista? Acabaram os empregos, acabaram-se os direitos — “MAS temos o combate à corrupção!”
É esse discurso que vai encher a barriga dos que foram esmagados pelo golpe do “mercado” e de
seus interesseiros lacaios? Não acredito...
Um ministério público que precisa de aplauso para trabalhar descarrilhou. A repressão penal, lembra
Foucault, por tangenciar perigosamente os fundamentos do Estado democrático de Direito e toda
nossa autocompreensão civilizatória, precisa ser levada a efeito, em nossos dias, com discrição e até
certa vergonha. Porque se houve grave lesão a bem jurídico fundamental, foi todo o sistema de
prevenção que falhou. Falhou a educação, falhou a vigilância, falharam os legisladores e falhou a
própria justiça que não soube cumprir seu papel de exemplo.
Claro que é muito mais fácil apontar para um culpado e extirpá-lo para deleite de um público que se
diz ofendido, do que perquirir as causas do comportamento desviante e propor medidas concretas
para seu enfrentamento, que não seja mais repressão midiática. Mas, preguiçoso trabalha dobrado. A
sociedade que se contenta com o atalho da persecução penal e festeja seus verdugos não superará
seus vícios, mas afundará na barbaridade e na ignorância e, por isso, será o terreno fértil para
aproveitadores inescrupulosos. A corrupção não diminuirá, apenas se organizará para driblar os falso-
moralistas. E um dia inexoravelmente cairá a máscara desse ministério público que nada fez a não
ser barulho e tanto nos envergonha. Trabalharemos dobrado para nos desvencilharmos desse
trambolho e enfrentarmos seriamente a tal corrupção.
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