sábado, 29 de julho de 2017

Nem a maconha escapa do apetite voraz da indústria do Ogro Negócio

Plantas modificadas geneticamente em laboratórios clandestinos e o uso de venenos nunca 
testados colocam em risco a saúde de quem faz uso recreativo ou medicinal 

São Paulo – Quem recorre ao canabidiol contra os efeitos adversos da quimioterapia, para o tratamento de doenças como esquizofrenia, Parkinson e epilepsia, entre outras, ou quem faz uso recreativo da maconha, pode estar exposto a muito mais do que os efeitos desejados da Cannabis sativa.
É grande a chance de estar sendo envenenado com resíduos de agrotóxicos presentes na planta, que a longo prazo causam graves males, como câncer, alterações endocrinológicas e até mesmo aquelas ligadas ao sistema nervoso central, que estariam sendo tratadas.
Isso sem contar a possibilidade de a erva ser geneticamente modificada, escondendo em cada gota de extrato ou tragada inúmeros riscos certeiros, cuja gravidade ainda não foi totalmente descrita pela ciência.
Essas notícias, um tanto desanimadoras, vêm do Canadá. De acordo com a legislação vigente, as folhas da maconha não devem ser tratadas antes, durante ou após o processo de secagem com agrotóxicos que não tenham sido devidamente testados e registrados para essa finalidade específica.
No entanto, entre os agrotóxicox liberados pelas autoridades sanitárias para aplicação na cannabis, sete contêm substâncias que, ao serem queimadas, liberam partículas tóxicas. É o caso do bicarbonato de potássio e outros sais de potássio, que quando aquecido e inalado pode causar efeitos colaterais graves, como confusão, batimentos cardíacos irregulares, forte dor estomacal, vômitos, diarreia e ansiedade. Está no grupo o agrotóxico Actinovate SP, da Monsanto, composto em sua maioria (99%) por "outros ingredientes".
Especialistas consultados pela reportagem afirmam que é impossível identificar e testar esses "outros ingredientes". Tampouco saber quais são os efeitos colaterais trazidos por alterações físico-químicas ocorridas nas folhas durante a queima, bem como a inalação de tantos ingredientes desconhecidos combinados às já conhecidas substâncias nocivas por mínima que seja a dosagem.
Lucros
Também vem do Canadá a informação de uma patente depositada pela Tweed Co., que manipulou geneticamente a Cannabis para aumentar seu teor de tetrahidrocanabidinol (THC), um dos cerca de 400 compostos que é utilizado em diversos medicamentos. A notícia não deixa de ser bem vinda para os usuários recreativos porque se trata também da principal substância psicoativa.
A Monsanto, que sempre aparece na história quando o assunto é agrotóxicos e transgênicos, teria iniciado o desenvolvimento de duas plantas geneticamente modificadas para resistir ao herbicida glifosato, que ela própria fabrica. Oficialmente, a companhia nega que esteja investindo em biotecnologias para essa finalidade.
Não faltam motivos para duvidar do posicionamento da empresa recentemente comprada pela alemã Bayer. Em relatório, a consultoria Greenwave Advisors estima que o emergente setor da maconha, caso a erva seja legalizada em todo o território norte-americano, poderá ser uma indústria com receitas da ordem de US$ 35 bilhões até 2020. Isso é mais que as receitas obtidas com a publicação de jornais e pela indústria de confeitaria.
Circulam também rumores da existência de uma maconha supostamente transgênica, desenvolvida em laboratórios clandestinos nos Estados Unidos e na Holanda, que estaria sendo cultivada no Paraguai desde 2003.
"Seriam plantas com maior concentração de THC e que estariam prontas para a colheita em metade do tempo que leva a planta convencional, o que significa duplicar a produção no mesmo espaço de tempo", diz o pesquisador aposentado da Embrapa e atualmente convidado do Laboratório de Engenharia Ecológica da Unicamp, José Maria Gusman Ferraz.
Considerando essa experiência como um ensaio para grandes corporações, ele acredita que poderiam vir a ser incorporados a resistência aos agrotóxicos e o aumento da concentração de alguns dos mais de 50 componentes presentes no princípio ativo da maconha convencional.
"Mas há a possibilidade de outras alterações indesejáveis e danosas na planta. Quando mudamos o seu metabolismo, ocorrem inúmeras outra alterações que não são controladas e nem têm como ser avaliadas para a liberação. Portanto, existe risco de se produzirem efeitos colaterais nesta novas plantas e em tudo o que vier a ser feito com a sua utilização. E a exemplo do que acontece com outros transgênicos, vir a contaminar geneticamente as populações nativas, reduzindo sua biodiversidade", explica o pesquisador que é um dos autores do livro Lavouras Transgênicas – Riscos e Incertezas.
Viagem
Nessa perspectiva, segundo ele, quem faz uso recreativo, corre vários riscos. Como o de não saber mais se o efeito da velha e combatida maconha, agora cultuada e luxuosamente embalada, quiçá com o T de transgênico da embalagem do pacau ou bagulho agora promovido a cigarro.
Ex-integrante da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), responsável pela liberação de organismos geneticamente modificados, Ferraz faz especulações espirituosas caso a maconha transgênica desembarcasse no Brasil.
"Talvez fosse mais divertido se houvesse uma avaliação do produto durante a plenária. Seguramente iríamos ouvir confissões inusitadas em um ambiente muito mais descontraído."
Ele arrisca um palpite: "O grupo minoritário na Comissão, que zela pelo cumprimento das regras de biossegurança e do princípio da precaução, certamente ficaria com a fama de careta por se recusar a degustar um produto que ainda não tem a comprovação de sua segurança à saúde e ao meio ambiente. E votaria contra".

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