terça-feira, 20 de junho de 2017

Fachin tira de Moro três ações contra Lula. Deveria tirar todas.



POR FERNANDO BRITO  

Fala-se nos jornais, com grande estardalhaço, da decisão de Luiz Edson Fachin de ter tirado da Vara de Curitiba três ações contra Lula, redistribuindo-as para Brasília (duas) e São Paulo (uma). É uma decisão absolutamente óbvia, cujo único problema é não ter sido tomada antes e para todas as ações.
E vou explicar.
Um das mais graves violações em todo este processo da Lava Jato e a do princípio do juiz natural da qual derivam outras, como da espetacularização dos julgamentos, a parcialidade do Juízo e o cerceamento da defesa. E, ainda numa escala muito maior, a contaminação de todo o sistema judiciário brasileiro, seja por amedrontamento em agir diferente de Sérgio Moro, seja pela ânsia de ser, cada um, um novo Moro, ávido pela fama de juiz-ferrabrás.
Explico, para os que não são muito afeitos às categorias do Direito o que é juiz natural. É o inverso de tribunal de exceção, esta coisa típica do autoritarismo e da ditadura. O princípio do juiz natural é uma garantia do cidadão, não um privilégio ou “direito adquirido” do magistrado.
O critério da distribuição do processo é de natureza geográfica (lugar da infração, ou da moradia do Autor ou Réu), à competência (trabalhista, cível, criminal, fazendária, etc), às prerrogativas de fôro (juízes, promotores, deputados, senadores, etc) e a duas outras coisas de que ardilosamente se serviram para entregar a Sério Moro o quase monopólio judicial de tudo quanto se refira – ou possa se referir – a corrupção de agentes públicos no Brasil: a conexão e a continência.
É na conexão que a porca torce o rabo, no caso da Lava Jato. A conexão visa a reunir processos evidentemente ligados, não a colocar determinado tipo de crime – ou de autor, ou de vítima – sempre sob o mesmo juízo, aquele onde tiver sido cometido o crime de maior gravidade penal.
Moro agarrou-se ao fato de que um doleiro paranaense “chumbrega”, seu cadeeiro velho – já havia dado a ele o benefício de uma delação premiada no caso Banestado – cuja lavagem de dinheiro para “clientes” (que desviavam da Petrobras) ocorria em Brasília, num posto de gasolina (donde o nome Lava Jato) para ir atraindo para si tudo o que dizia respeito a corrupção ativa e passiva (crimes mais graves que o do “branqueamento do dinheiro).
Gustavo Badaró, professor em Direito Processual da PUC de São Paulo, explica na Revista Brasileira de Ciências Criminais (está aqui e é trabalho para quem tiver fôlego para ler um estudo técnico-jurídico de profundidade).
“Ainda que se reconheça essa enorme conexão de tudo o que envolva corrupção da Petrobrás em mais de uma década, bastaria que um único desses crimes conexos, fosse mais grave do que o delito de lavagem de dinheiro, como, por exemplo, corrupção passiva, que possa ter ocorrido em Brasília ou Rio de Janeiro, para que o foro de atração não fosse o da Subseção Judiciária de Curitiba.”
Além do mais, explica o professor, o “fundamento” da conexão – pelo fato de os processos jamais serem reunidos e terem trâmite comum, era, basicamente o “é do Moro”. Ou, como explica o professor porque seria a “vontade popular” que ao Condenador das Araucárias fossem enviados todos os processos referentes à corrupção de agentes públicos no Brasil.
Por minha conta, vou além: no caso de Lula, desenvolveu-se um arsenal imaginário de convicções políticas para ligar um apartamento no Guarujá a contratos na Petrobras, sem que disso – mesmo que o imóvel estivesse sendo a ele transferido ilegalmente – houvesse base alguma em fatos. Do princípio até quase ao final, até que conseguissem um ex-executivo que, negociando a amenização de suas penas, estivesse disposto a assinar as conclusões “teóricas” do Ministério Público de que um apartamento de classe média e a guarda de uns caixotes tivesse sido a contrapartida de favorecimento em contrato de bilhões, dos quais os negociadores tiraram dezenas e até centenas de milhões de dólares!
A justiça brasileira, a mídia ‘direitíssima’ de nosso país e a oposição – agora devorada por seu próprio monstro – fizeram de Sérgio Moro o único juiz deste país. Ou porque tudo é com ele e, quando não é, não há para outro juiz agir senão como Moro.
Desculpem a longa explanação, mas a politização da Justiça é algo muito, muito grave. Porque, embora lhe dê muito poder, na verdade, retira a sua autonomia. Transforma a todos, inclusive aos ministros da mais alta corte, em homologadores ou imitadores de Sérgio Moro, primeiro e único juiz do Brasil.
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