Como vão ficar pouco tempo, "Abocanham o que podem"
"Bomba de nêutrons" por Eleonora de Lucena
A bomba de nêutrons mata seres vivos e poupa prédios. Não parece ser outro o objetivo do governo,
que, sem qualquer pudor, segue implacável com sua sanha destrutiva. Sem o aval das urnas, faz corte
de gastos, derrubada de direitos, repressão a protestos.
Atônita, a população mal consegue acompanhar a avalanche regressiva. Todo o dia sai uma medida
Atônita, a população mal consegue acompanhar a avalanche regressiva. Todo o dia sai uma medida
contra a sociedade. A Petrobras vai sendo dilapidada; o ensino, enxovalhado; a saúde, depauperada;
a Previdência, privatizada. Desemprego e desesperança vicejam.
No Planalto, outra avalanche: a de denúncias de corrupção. Num clima de salve-se quem puder,
inépcia e hipocrisia dançam uma ópera bufa cruel. Bezerra da Silva tinha razão ao cantar o refrão de
"Reunião de Bacana".
(...) O Brasil é maior que essa gente.
Começam a sair da penumbra os interesses externos no terremoto institucional brasileiro. A aliança
Começam a sair da penumbra os interesses externos no terremoto institucional brasileiro. A aliança
do país nos Brics não agrada aos EUA, que não querem dar espaço a desafios à sua hegemonia.
Donald Trump embaralha o cenário. Cercado de empresários, ele conseguirá mexer na estrutura
produtiva mundial, contrariando interesses de corporações? Qual o impacto disso no Brasil? As
próximas eleições na Alemanha e na França vão reforçar a desglobalização?
As mudanças convulsivas nas entranhas do capitalismo financeiro (em crise há quase dez anos)
atormentam as elites globais e desnorteiam seus aliados na periferia.
Aqui, as arestas dentro do poder ficam mais agudas. A disputa pela privatização do bolo estatal é
aberta, gera instabilidade e estraçalha a democracia e o Estado de Direito.
Há 50 anos, Jango, JK e Lacerda, com ideias tão diferentes, tentaram erguer a frente ampla contra a
ditadura militar. A repressão podou a iniciativa. Mas o mesmo espírito voltou com força, anos
depois, no movimento pela anistia, no apoio a greves, na luta pelas Diretas-Já.
Na história brasileira, muitos outros momentos demonstraram a possibilidade de luta conjunta. No
século 19, o primeiro movimento social do país surgiu com a campanha pela abolição da escravidão.
Para além dos combates nos quilombos, advogados, artistas, poetas se uniram contra o brutal
modelo.
O nascente Exército se negou a exercer o papel de capitão do mato para caçar escravos rebelados.
No século 20, a luta pelo monopólio do Estado na exploração do petróleo resultou na convergência
entre Forças Armadas, empresários e setores populares com o governo nacionalista de Getúlio
Vargas. Contrariando pressões externas, o país criou a gigante Petrobras.
Em todos esses momentos, o pano de fundo foi a ideia de projeto de nação. Hoje, o neoliberalismo
empurra para a fragmentação e divisão. Há grupos de todo o tipo e isso enriquece a democracia. Mas
o momento dramático do país exige mais.
O derretimento do país deve ser enfrentado por frente mais ampla, para além da esquerda. O que é
preciso reunificar é a própria nação. E desativar a bomba de nêutrons, dando fim à "reunião de
bacana".
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