quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

O ANO DA COVARDIA DE TEMER TEVE TAMBÉM A CORAGEM DO ESTUDANTE GAY QUE DESAFIOU O ITA


Talles recebe o diploma no ITA

O ano que ficou marcado pela covardia de Temer foi redimido pela coragem do estudante Talles de Oliveira Faria.
O Brasil ganhou com o golpe um presidente que sobrevive de recuos e que não vai a Olimpíada e velório por medo de vaia.
Um sujeito que acabou comparecendo ao estádio da Chapecoense apenas depois que o pai de um zagueiro morto na tragédia pediu-lhe “vergonha na cara”.
Deu cano também no funeral de Dom Paulo Evaristo Arns por receio do “ambiente de esquerda”. Um anão moral que demonstra do que é feito ao articular as reformas com um Congresso dominado por tipos como ele.
“Hoje, no Brasil, se você não tiver coragem, você não consegue governar”, chegou a dizer. O Brasileiro do Ano, pelo menos segundo a Istoé, é um poltrão.
A sorte é que, ao mesmo tempo em que temos Michel se esgueirando do sofá de casa para o Planalto, olhando para os lados enquanto tenta se salvar, há gente como Talles.
Aos 24 anos, ele é autor de um gesto corajoso que contrasta com a iniquidade do governo. Foi à cerimônia de colação de grau no ITA de salto alto e vestido vermelho estampado com palavras de ordem.
Conta que sofreu perseguição na honorável instituição por ser homossexual, com punições diversas que o teriam levado a se desligar da Aeronáutica no meio do curso.
Em maio de 2015, ele se vestiu de drag queen no Dia Mundial do Combate à Homofobia junto com outros colegas. Foi processado por ferir “o decoro da classe”.
Críticas ao catolicismo no Facebook foram motivo de punição por agressão a símbolos religiosos. Sua versão da bandeira brasileira também foi censurada.
Sofreu sanção por causa de um ato de apoio a Dilma. De acordo com Faria, alunos que se manifestaram a favor de Aécio Neves não sofreram nada.
Formou-se em engenharia da computação, mas afirma que sua opção original era a carreira militar. Desistiu por conta de “episódios de constrangimento”. Fala que foi preso por quatro dias por usar cabelos descoloridos e depois por usar blush. Tudo com as devidas notificações de oficiais.
Em seu depoimento no Facebook sobre a repercussão da colação de grau, Talles escreveu que “a Aeronáutica não é homofóbica, mas não tinha nenhum LGBT assumido em toda a EPCAR [Escola Preparatória de Cadetes do Ar] quando entrei em 2009. Mais de 900 alunos, nenhum LGBT. Todos os meninos falavam apenas de garotas e se apaixonavam apenas por garotas”.
“Não me aceitaram, violentaram-me, riram de mim, tentaram me tornar invisível. Que a exposição os mudem porque eu vou continuar me amando e me fazendo muito presente mundo afora”.
Em junho, ainda na interinidade, Michel Temer anunciou que estava devolvendo aos comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica atribuições que lhes foram retiradas por Dilma relativas a direção e gestão.
A Reforma da Previdência não inclui os militares.
Michel e sua corriola de velhos teriam muito a aprender com Talles, não fossem eles quem são. Coragem, dizia Hemingway, é graça sob pressão.


O incrível depoimento do estudante gay que recebeu o diploma do ITA de vestido e salto alto

por : Kiko Nogueira

Talles de Oliveira Faria, formando do curso de engenharia do reputado ITA, Instituto de Tecnologia Aeronáutica, de São José dos Campos (SP), fez um protesto durante a solenidade de colação de grau do sábado, dia 17.
Homossexual, ele recebeu o diploma trajando um vestido com palavras de protesto. Talles diz ter sido vítima de homofobia na instituição. 
Abaixo, seu depoimento publicado no Facebook:

Desde os 12 anos, eu sempre ouvi coisas maravilhosas sobre o ITA. Sobre ser a melhor universidade do país, a possibilidade de receber dinheiro durante a graduação, a quantidade de oportunidades que se abriam ao fazer essa faculdade. O ITA era meu grande sonho. Mal sabia que seria a maior decepção de minha vida.
Durante o ensino médio estudei numa escola militar da Aeronáutica (EPCAR) e já fui para lá com muito medo que descobrissem sobre minha orientação sexual, expulsassem-me e que minha família, que na época não sabia, descobrisse que havia sido expulso devido a minha orientação sexual. Seria uma grande tragédia, já que na época sentia vergonha por ser LGBT.
Eu não conhecia nenhum regulamento da aeronáutica e não precisava para saber que era um ambiente homofóbico. Desde pequeno as pessoas nos ensinam que ser LGBT é vergonhoso e levamos muito tempo para superar essas feridas.
Senti como a homofobia acontece nas Forças Armadas através da invisibilidade, da chacota e da expulsão daqueles que ousam se abrir em relação a sua orientação sexual. Assim, se passam os anos e os homossexuais lá presentes precisam levar uma vida marginalizada e escondida para que não o descubram e o eliminem. Invisíveis, vivem suas vidas.
Cheguei no ITA e decidi que pra mim bastava. Aceitem-me como sou ou sejam expostos pelo que vocês são. Não me aceitaram, violentaram-me, riram de mim, tentaram me tornar invisível. Que a exposição os mudem porque eu vou continuar me amando e me fazendo muito presente mundo afora.
Ainda assim é muito difícil para muitas pessoas enxergarem as Forças Armadas como uma instituição homofóbica. Para elas, vamos mostrar o seguinte tutorial sobre ser LGBT nas FFAA:
A Aeronáutica não é homofóbica, mas não tinha nenhum LGBT assumido em toda a EPCAR quando entrei em 2009. Mais de 900 alunos, nenhum LGBT. Todos os meninos falavam apenas de garotas e se apaixonavam apenas por garotas.
A Aeronáutica não é homofóbica, mas faziam piadas com os estudantes mais efeminados. Ser efeminado é ser viado e ser viado é ser piada. Ninguém quer ser piada, ninguém quer ser LBGT.
A Aeronáutica não é homofóbica, mas em todas as escolas militares sabíamos do caso do aluno homossexual da escola da Marinha. Motivo de piadas por anos.
A Aeronáutica não é homofóbica, mas um certo professor militar de um certo cursinho elitista aí é conhecido por todos os alunos por seus discursos de ódio contra LGBTs em suas aulas.
A Aeronáutica não é homofóbica, mas seria o fim das FFAA quando fosse criado um coletivo LGBT na AFA (Academia da Força Aérea).
A Aeronáutica não é homofóbica, mas os instrutores e militares em posições de poder desejam boas férias com as namoradas, fazem piadas com puteiros e quando citam homossexuais é pra debochar e dizer que “chave com chave não abre porta”.
A Aeronáutica não é homofóbica, mas existe professor que para explicar transistores é preciso falar que tem transitor macho e transistor fêmea e que não existe meio termo.
A Aeronáutica não é homofóbica, mas “não existe elétron triste, não tem elétron com problemas psicológicos, não tem elétron gay”, disse certo professor.
A Aeronáutica não é homofóbica mas todos os meus amigos LGBTs morriam de medo que alguém os descobrisse e os desligasse.
A Aeronáutica não é homofóbica mas quando descobriram que dois amigos meus estavam namorando na EPCAR tiraram um deles do Código de Honra e começaram a perseguir o outro com punições.
A Aeronáutica não é homofóbica mas quando os alunos LGBTs foram descobertos, os discursos de ódio saíram do armário. Amigos se afastaram, viraram as costas. Esse sentimento é terrível, perder alguém que você se importa e que você achava que se importava com você por causa de sua orientação sexual.
A Aeronáutica não é homofóbica, mas durante formatura militar “Vocês sabem onde está fulano (LBGT assumido)? Deve estar chupando pau por aí.” Todos riem. Denunciamos. Ninguém ouviu nada. Caso encerrado.
A Aeronáutica não é homofóbica, mas faziam piadas e imitavam os trejeitos e as vozes do nosso comandante por que achavam que ele era viado.
Se era, ninguém sabia, continuaria invisível e piada, mas a aeronáutica não é homofóbica.
Heterossexual é exposto, é divertido, é público, é o decoro da classe, é a moral e são os bons costumes.
Homossexual é vergonhoso, deve ficar escondido e só ser mencionado para ser piada. Homossexual é depravado, é nojento, é desrespeitoso.
A Aeronáutica não é homofóbica, mas quando os cadetes da AFA ficaram sabendo que tinha homossexual assumindo-se, prometeram desligar todos. “Vou fazer pedir pra ir embora. Aqui não tem viado. Vai pagar flexão até pedir pra ir embora.”. E isso aconteceu.
A Aeronáutica não é homofóbica, mas quando homossexuais assumidos ousaram ir para a AFA, foram perseguidos por cadetes escolhidos para serem “Líderes”. Ouviram “eu sei que você é viado e vou fazer você pedir desligamento.”
A Aeronáutica não é homofóbica, mas nosso amigo, cadete mais antigo da AFA, o qual também não era assumido, prometeu que tentaria não deixar que outros cadetes perseguissem nosso amigo LGBT assumido que ousou ir pra AFA.
A Aeronáutica não é homofóbica, mas pintar cabelo é coisa de mulher. Escureça esse cabelo e se apresente amanhã.
A Aeronáutica não é homofóbica, mas só vamos permitir que Aspirantes deixem de ser Aspirantes no ITA quando forem viados. Ao menos, o primeiro caso.
A Aeronáutica não é homofóbica, mas usar maquiagem é coisa de mulher.
A Aeronáutica não é homofóbica mas quando você é viado, você tem que ser perfeito: voz grossa pra ser respeitado, sem trejeito, as maiores notas, o melhor físico, nunca falar de homem ou agir de forma descontraída. Nunca falar sobre sua sexualidade. Você pode ser viado desde que nunca aja como um. Pode ser viado mas tem que ser como se fosse hétero. O padrão militar é hétero, mas a Aeronáutica não é homofóbica.
Estou farto dessa hipocrisia, dessa violência, dessa gente de bem que deita na cama e não tem consciência do ódio que propaga e das vidas que destrói. Estou farto das piadas, estou farto da invisibilidade, da violência, de tudo.
Agora, se você ainda acha que não havia motivos para minha manifestação e que meus motivos não são válidos, volte ao tópico 1.
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