terça-feira, 9 de agosto de 2016

DE “MACACA” A “HEROINA”, QUANTOS QUE ONTEM XINGARAM RAFAELA DIAS HOJE A BAJULAM?


Como a Folha tratou Rafaela 
em 2012. A foto mostra como 
a Folha tratou Rafaela Silva 
em Londres em 2012. Ela foi 
achicalhada como macaca 
nas redes sociais, respondeu. 
Mas para a Folha ela xingou 
torcedores no Twitter.

por : Marcos Sacramento

Neste momento o país aplaude a
glória de uma mulher negra e ex-
favelada. Mas não se iludam.
A euforia diante do ouro da judoca
Rafaela Silva não pode ser considerada um trunfo sobre o racismo.
Se a história fosse diferente, com a vitória da adversária Dorjsürengiin Sumiya nos segundos finais
da luta, Rafaela estaria agora sendo ofendida com xingamentos alusivos à sua cor da pele.
Foi assim durante os Jogos Olímpicos de Londres, em 2012. Na época, Rafaela era uma das
esperanças de medalha da delegação brasileira, expectativa frustrada por um golpe ilegal da judoca
que levou à sua desclassificação precoce.
A reação de uns torcedores canalhas foi atacá-la nas redes sociais com xingamentos racistas que a
levaram à depressão e a considerar largar o esporte. “Macaca” foi o mais gentil.
Naquela hora, todas as qualidades de Rafaela Dias foram ignoradas. O esforço e o talento
necessários para disputar uma Olimpíada aos 20 anos de idade, as dificuldades financeiras da família
e o estigma por ter nascido na comunidade empobrecida e violenta da Cidade de Deus, nada disso
teve importância frente à ausência de uma medalha.
Hoje tudo isso é reconhecido.
O perfil da atleta, pontuado por episódios de superação que seduzem a audiência, prolifera pela internet. Esteve no Jornal Nacional, onde foi bajulada por Galvão Bueno.
É bem capaz de aparecer no Domingão do Faustão ou ajudando Luciano Huck a ganhar audiência.
Por enquanto é a esportista mais querida do país, mas quantos que agora a idolatram a xingaram
quatro anos atrás? Ou quantos estariam vomitando impropérios se a vencedora da luta fosse a judoca
da Mongólia?
Prodígio do esporte, Rafaela não levou ouro por sorte ou imperícia das adversárias. Revelada pelo
Instituto Reação, do judoca Flávio Canto, tem um currículo vencedor: conquistou medalha de bronze
nos Jogos Pan-americanos de Toronto em 2015, prata no Pan de Honduras em Guadalajara e
medalha de ouro no Mundial de 2013.
Mas é mulher negra. Basta que deixe de vencer para retornar à invisilidade, porque a grande mídia,
assim como o brasileiro médio, dá valor apenas aos vencedores. “Só fortalece quem tem mais”,
como cantou Mr. Catra.
Que ela aproveite o momento, mas não se deixe enganar pelos sorrisos que anda recebendo.


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