sexta-feira, 28 de agosto de 2015

OS EQUIVOCOS DO PT



Jornal GGN - Foram quatro vitórias presidenciais consecutivas, sendo a última, contra Aécio Neves (PSDB), a mais apertada para o PT. Desde então, na visão do governo Dilma Rousseff e do próprio partido, o País mergulhou num clima de terceiro turno desenfreado, temperado com boas pitadas de crise econômica e política. Uma receita para sacudir as instituições. Hoje, com resquícios de Mensalão, novidades diárias da Lava Jato, ameaças de impeachment, desafios na economia, entraves à governabilidade e até boneco de Lula vestido de presidiário passeando pelo País, a dúvida é saber se o PT sobreviverá à opinião pública até 2018. E mais: será que o partido já discute o que deve ser mudado até lá? 
Na visão do deputado federal e vice-líder do governo na Câmara, Paulo Teixeira, o diagnóstico não pode ser "precipitado". Em entrevista exclusiva ao GGN, concedida na última segunda (24), ele apontou os erros que o partido cometeu desde que chegou ao poder, e admitiu que ou o PT é "passado a limpo" para continuar desempenhando um papel importante junto aos grupos de esquerda, ou será reduzido a nada.Paralelamente a isso, Teixeira defendeu uma reforma ministerial que faça o governo Dilma dar respostas mais rápidas e adequadas à conjuntura política atual.
Abaixo, os principais pontos da entrevista.
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Jornal GGN - O que é o PT hoje?
Paulo Teixeira - Uma leitura do PT tem que ser feita com calma. Por que? Porque o PT está sob ataque. Agora, qualquer precipitação pode piorar a saída que o PT precisa nesse momento de crise.
Acho que o PT tem algumas variáveis, vou começar pelas melhores. O PT no governo Lula e Dilma, não sozinho, conseguiu mudar muito profundamente o Brasil. E nessas mudanças, mexeu com interesses. Alguns foram centralmente contrariados. O tema do marco regulatório do petróleo, esse contrariou interesses econômicos pesados. O segundo interesse econômico que nós ajudamos a contrariar foi essa articulação dos BRICs, de criar um banco, isso mexe com a moeda no mundo, a hegemonia americana. O terceiro aspecto que nós contrariamos foi do empresariado brasileiro na medida em que implementamos uma economia de maior valorização dos salários. E, por último, acho que a gente também contrariou interesses no sentido do lugar simbólico da elite. Esse lugar mudou muito. Universidade, aeroporto, carros, os centros de consumo.
Nesse processo, cometemos equívocos. Quais equívocos que eu acho que nós cometemos? Nós não tratamos a reforma política como um tema fundamental e imprescindível na nossa trajetória. Nós tínhamos que ter feito uma reforma porque o sistema político degrada os partidos na medida em que submete a todos ao poder econômico e ao voto personalista. Nós tínhamos que melhorar o sistema politico, e não conseguimos.
Em segundo lugar, acho que tivemos um problema no desenho das nossas alianças. Era mais correta ter tido uma prática de frente de esquerda, com alianças ao centro. E nós deixamos essa prática de relação mais orgânica com os partidos de esquerda de lado, e fomos, num certo voluntarismo, em direção ao centro.
E também cometemos erros sérios, principalmente relacionados a não ter mexido no tema da necessidade de uma mídia mais democrática, uma opinião pública mais extensa. A opinião pública hoje é muito parecida com a que era em 2003. Nós conseguimos mexer no monopólio.
E há a questão dos erros que foram cometidos no tema do financiamento eleitoral, em 2005 e agora em 2013, essas duas crises.
Outro tema que vejo que está em questão é a própria representação. Os sindicatos, os partidos, eles não jogam o mesmo papel que jogavam a 30 anos atrás. Quer dizer, hoje com essa nova economia digital, você tem um novo cidadão e ele tem uma ação mais direta. Consegue, pelo meio digital, dar suas opiniões, desejos, fazer mobilizações. E isso requer uma mudança nesse sujeito-partido.

GGN - Aquele modelo de partido que era o PT dos anos 80 se perdeu com a chegada ao poder?

Teixeira - Engraçado, semana passada tivemos lá no Instituto Lula a Jornada Pela Democracia. Uma das participantes foi a Maria Rita Kehl. E a Maria foi muito resumida na fala dela. Disse: ‘Olha, eu estou gostando desse evento na rua, dos petistas irem para a rua, que é uma maneira deles desaburguezarem-se’. Quer dizer, o exercício do poder também gerou um vício, um distanciamento nosso, e aumentou o déficit democrático.
O PT perdeu essa intensidade que tinha na sua fundação, que era da intensa democracia. Acho que nós precisamos retomar isso. Acho que não é agora [que o PT deve iniciar o processo de mudança], pois trazer essa discussão para dentro, sob ataque, nos impede de ter dedicação às duas tarefas [governar e sair da crise]. Tem que passar esse processo que nós estamos vivendo de forte ataque e abrir um debate de oxigenação do PT. Se o PT souber fazer isso, sai fortalecido. Se não souber, diminui e vai se tornando um partido menor e mais regionalizado, eleitoral apenas.

GGN - A Fundação Perseu Abramo parece ser a única interessada em discutir as saídas da crise para o PT. Os demais setores parecem que não ter essa gana, não?
Teixeira - É, acho que do ponto de vista da esquerda brasileira, o PT joga um papel muito importante. Por isso é importante que consiga botar a mão nos temas mais importantes e sair revigorado. A Fundação Perseu Abramo joga um papel fundamental, decisivo, nos debates que promove. Tanto de conjuntura como debates de mais profundidade. Também nas publicações que faz, nos cursos que organiza. O Márcio Porchmann fez uma revolução na Fundação. E o PT joga um papel importante na defensiva.
O PT joga um papel, e agora precisa ser passado a limpo para continuar jogando. Por exemplo, essa relação com os partidos de esquerda, na minha opinião tinha que ser orgânica, não pontual. Tem que ser muito parecido com que o Uruguai fez, a Frente Ampla. A Frente Ampla tem uma existência formal, uma maneira de atuação mais permanente. Nós não podemos ter uma relação com os partidos de esquerda pontual, só quando tem crise, ou quando tem eleição. Temos que fazer de maneira mais permanente.

GGN - O senhor fala em esperar abaixar um pouco a poeira para conseguir discutir internamente a crise do PT. Mas e se esses ataques não cessarem? Quando o PT irá discutir a saída da própria crise?
Teixeira - O fato é que, claro, nós precisamos estabelecer uma governança, eu diria assim, mais colegiada. Isso são providências que podem ser adotadas já. Agora, um debate mais profundo sobre organização requer um momento em que se possa olhar mais para dentro. Não é o momento que estamos vivendo agora, nós estamos sob ataque, tivemos sedes invadidas, bomba [no Instituto Lula]. Veja isso que fizeram com o presidente Lula, de quebrar o sigilo bancário...

GGN - Aliás, o fato de o governo levar quatro dias para tomar uma atitude em relação a esse crime de vazamento de informação das contas de Lula não mostra também uma certa apatia?

Teixeira - Nassif, eu tenho a impressão de que nós montamos um governo numa conjuntura, e nós estamos em outra. Eu sou da opinião de que se tinha que se ter uma reforma ministerial para reorganizar o governo, para ter essa agilidade que precisa ter. Esse caso, por exemplo, é um caso gravíssimo. Quer dizer, é um Estado de Direito que começou a ser violado.

GGN - O regulamento diz que o Ministério Público Federal atua quando provocado. Mas o que vemos é para cada notícia que sai contra o PT, há uma representação no MPF. Quando se tem denuncias contra políticos de outros partidos, a atuação do PT em relação ao MPF é totalmente apática. Será que não falta uma estratégia jurídica para o partido como um todo?

Teixeira - Eu acho que sim. Nós estamos vivendo um ataque que requereria um contra-ataque, da mesma forma. Quer dizer, nós temos que cobrar rapidez em todas essas investigações relacionadas a quebra de sigilo.

GGN - Talvez se esse vazamento tivesse ocorrido contra o FHC, no mesmo dia o governo atuaria para mostrar o seu republicanismo. Porque parece que quando é contra a oposição, o governo quer mostrar que é republicano. Contra um dos seus, quer mostrar que não está protegendo. Não é um paradoxo complicado, não?

Teixeira - É um governo que precisa dar respostas mais imediatas, por isso eu defendo a ideia de uma reforma ministerial que possa dar nova agilidade ao governo e, digamos assim, responder a conjuntura.
Leia a primeira parte da entrevista com Paulo Teixeira aqui.
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