O juiz e a namorada na praia: metade da história
por : Kiko Nogueira
O juiz federal paranaense Marcelo Antonio Cesca, 33 anos, está tendo seus 15 minutos de fama depois que uma foto sua na praia, com uma namorada bem mais nova, virou notícia. Junto às imagens, ele escreveu no Facebook: “Eu agradeço ao Conselho Nacional de Justiça por estar há 2 anos e 3 meses recebendo salário integral sem trabalhar, por ter 106 dias de férias, mais 60 dias pra tirar a partir de 23/03/14, e por comemorar e bebemorar tudo isso numa quinta-feira”.
Era um “protesto”. Cesca foi afastado em 2012 com um diagnóstico de depressão. Mas, segundo ele mesmo, três médicos o apontaram como apto para voltar ao trabalho.
Com um salário calculado em 22 mil reais, virou o símbolo da vagabundagem, de que o Brasil, nas palavras imortais de Sheherazade, não é um país civilizado.
Mas será essa a história completa?
Não.
Seu afastamento compulsório foi embasado em processo que tramita no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, onde avaliaram sua “higidez laboral”. Cesca fora aprovado em concurso público na segunda colocação, aos 27 anos.
Antes disso, já havia passado em outro concurso, indo trabalhar em Guarapuava (PR) como juiz federal substituto do TRF da 4ª Região, cuja sede fica em Porto Alegre. Foi em Guarapuava que ele se meteu numa trama rocambolesca, em que o selfie na areia é apenas o último ato.
Num e mail enviado em 2011 a Eliana Calmon, então corregedora nacional de Justiça, Cesca conta que chegou a ele um “velho inquérito policial”: “Coisa feia, pois envolvia atos de desvio de drogas e de cobrança de valores indevidos por aproximadamente nove policiais rodoviários federais, então lotados em Laranjeiras do Sul/PR, cidade que mais se parece com um ‘filme de faroeste’, tamanho o número de ilegalidades que habitualmente ocorre naquele lugar”, escreveu.
Ele diz que acionou o Poder Judiciário para saber onde foram parar 58 peças de madeira recheadas de cocaína. Elas deveriam estar depositadas na delegacia de Laranjeiras do Sul, mas desapareceram e ninguém mais quis saber o destino delas — a não ser Marcelo Cesca. A apreensão ocorrera em 2001.
Cesca requereu ao CNJ a abertura de processos de investigação contra pessoas que considerou imputáveis de responsabilidade pelo sumiço da droga. A lista incluía o então escrivão da Vara Criminal da Comarca de Laranjeiras do Sul/PR; de dois juízes de Direito da Comarca de Laranjeiras do Sul; do então presidente da Associação dos Magistrados do Paraná; do então corregedor-geral de Justiça do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná; e do então corregedor-regional da Justiça Federal da 4ª Região.
Cesca teria começado a sofrer ameaças de traficantes. Em sua carta ao CNJ, faz um lamento: “Sabem o que aconteceu com os policiais Rodoviários Federais acusados de desvio de conduta no exercício da função federal?
ABSOLUTAMENTE NADA, porque as 58 peças de madeira sumiram (…).
Afinal de contas, o que aconteceu com os policiais corruptos? NADA.
O que aconteceu com os juízes e promotores estaduais que usurparam a competência criminal da Justiça Federal? NADA.
O que houve com os corregedores do TJ/PR e do TRF/4ª Região que, ao tomarem ciência de tão graves fatos, nenhuma providência adotaram para apurar o evidente crime de fraude processual qualificada? NADA.”
Continua: “Quem está sendo responsabilizado por tentar localizar o corpo de delito (as 58 peças de madeira apreendidas)? EU, que expedi uma ordem jurisdicional de busca e apreensão que incomodou os policiais e juízes estaduais de Laranjeiras do Sul, que contra mim ajuizaram reclamações disciplinares no CNJ e na Corregedoria do TRF/4ª Região.”
Finalizou com uma frase de efeito: “O sol é o melhor desinfetante. Sempre.” Ironicamente, no sol mesmo ele foi flagrado como mais um fanfarrão federal.
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