João Salame participou esta manhã do ato público promovido pelo MST na Curva do S.
Em dezessete anos, pela primeira vez um prefeito de Marabá é convidado e aceita participar do
evento que marca um dos momentos - entre tantos - na história da Amazônia no qual sangue,
tiros, luta pela terra e ignorância misturam-se em doses cavalares para produzir cadáveres e dor.
Estávamos em Parauapebas naquele 17 de abril de 1996. Junto com D.Nega, fomos uns dos primeiros a chegar ao Hospital de Curionópolis para onde uma legião de miseráveis estropiados, feridos - no corpo e na alma - e desesperados acorriam em busca de algum socorro.
Mais não morreram devido à imperícia dos assassinos.
O massacre manchou para sempre a biografia de um homem que aprendi a respeitar. Almir Gabriel, ainda que obviamente isento de responsabilidade direta pelas mortes, carregou consigo até o túmulo a pecha de "mandante" da carnificina.
As imagens, que correram mundo, mostram que a interrupção do diálogo é capaz de produzir genocídios com uma facilidade assustadora.
Hoje, ao acompanhar João na Curva do S foi inevitável lembrar do cheiro azedo de sangue e suor que parecia entranhar-se nos poros, após ter ficado tão próximo aos cadáveres. A morte deixa suas marcas e algumas não são retiradas com água e sabão, ficam para sempre na memória, ainda que adormecidas, apenas à espera que um evento as desperte.
João lembrou que pouco mudou nos últimos anos. É verdade. Ainda que acampamentos tenham sido "promovidos" à categoria de assentamentos, são raros aqueles realmente produtivos e esta improdutividade anima o movimento crescente de reconcentração fundiária na região.
A política de reforma agrária do governo federal, tantos anos depois, foi incapaz de levar dignidade e paz ao campo.
Fazendeiros armam-se. Posseiros armam-se. O resultado desta escalada pode ser visto em episódios de violência explícita, na qual todos os lados estão errados.
A disposição de João, prefeito da mais importante e influente cidade do futuro Estado do Carajás, em manter-se próximo aos movimentos sociais é um alento. Quem sabe, com o apoio de outros prefeitos e parlamentares, será possível que dentro de alguns anos, com o novo estado criado, possamos escrever páginas menos dramáticas desta crônica de violência e ignorância nos campos da Amazônia.
Só nos resta torcer e trabalhar para construir um estado de paz e prosperidade na região, ainda que o fedor de pólvora queimada e sangue pisado jamais saia das narinas.
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