sexta-feira, 8 de junho de 2012

O Banco Imobiliário


É bom que as pessoas não entendam o funcionamento do nosso sistema bancário e monetário, porque se acontecesse acredito que explodiria uma revolução antes de amanhã de manhã (Henry Ford).


por Tibério Alloggio (*)


Passeando pelo shopping center na tarde de um domingo desses, fui surpreendido por minha filha caçula (6 anos) que, ao parar em frente de uma vitrine, disparou: “Que lindo, pai! Compra para mim?”.
O objeto, por sinal, caríssimo, e sem nenhuma utilidade para uma menina de sua idade, me levou a tentar driblar o pedido na maneira mais fácil, e respondi: “Querida, não vai dar, não tenho dinheiro”.
“Como assim pai?”, retrucou. “Não tem dinheiro? Pega no banco, ora!”
Essa episódio, deve ocorrer à toda hora, com todos os pais do mundo. Mas, devo confessar que fiquei perturbado com a rapidez do raciocínio de uma menina de apenas 6 anos.
Mais tarde, refletindo com calma, pensando sobre as repetidas crises econômicas que estão sacudindo o mundo, já não achava nada demais na atitude de minha filha. Afinal, a nossa ideia de riqueza é o dinheiro, e isso acaba sendo repassado (quase que geneticamente) de geração em geração.
Infelizmente, a ideia de riqueza que cultivamos ainda fica prisoneira à imagem romântica de um enorme cofre cheio de notas e moedas (um tesouro) com um Tio Patinha tacanho, sentado em cima dela.
Mas hoje, a verdadeira riqueza passa longe do romantismo, e consiste basicamente na capacidade de poder criar dinheiro a partir do nada.
Poxa, que maravilha!, pensará o leitor. Então podemos criar notas de dinheiro na nossa própria casa, certo? Errado! Na nossa própria casa não pode! O sistema não permite… a não ser que a nossa casa seja uma companhia privada e tenha o “gabarito” de uma instituição financeira. Ou seja, um banco! Se o caso for esse, aí sim, pode “imprimir” mais cédulas do que todos os falsários do mundo inteiro.
“Imprimir” entre aspas, pois na realidade de hoje apenas 3% do dinheiro em circulação é físico, o resto é virtual e ocorre pela via informática.
As últimas estimativas dizem que 97% de todo o dinheiro em circulação não existe. Ou melhor, existe apenas virtualmente, não fisicamente. E o mais importante, não é criado pelo Estado, a maioria do dinheiro é criado pelos bancos.
Martin Wolf, especialista membro da comissão independente acerca do setor bancário, declarou nas páginas do Financial Times: “A essência do sistema monetário é a criação de moeda, do nada, com os empréstimos muitas vezes absurdos, concedidos pelos bancos privados”.
O sistema funciona mais o menos assim: vamos ao banco e pedimos um empréstimo. O banco pede garantias que nunca temos, mas temos nosso salário. Serve? Sim serve.
Nessa altura, o banco deveria “verificar” se tem esse dinheiro no cofre e caso positivo dizer “Sim, temos o dinheiro, eis o seu empréstimo”.
Esse seria o procedimento num mundo normal, mas no mundo financeiro as coisas não funcionam assim. Os bancos nem sabem o que tem, ou o que não tem. Logo digitam o valor e pronto, o dinheiro já está na conta!
Todos os bancos fazem isso. Resultado? Uma maré de dinheiro criado a partir do nada. Um oceano de moeda em circulação. Moeda virtual, que pula de conta em conta, inflacionando a emissão da mesma moeda.
Alguém compra uma casa com dinheiro físico? Ninguém. A casa fica (cada vez) mais cara. E para sua compra é preciso de (cada vez) mais dinheiro. O que significa (cada vez) mais empréstimos. E o jogo recomeça. Com uma dívida cada vez maior, que não poderá ser paga. Isso chama-se de “bolha”.
Mas como, questionará o leitor, não há limites legais? Não há leis? Não há!
As leis acerca da criação do dinheiro nunca foram atualizadas, e nunca chegaram a abranger o dinheiro eletrônico.
A grande parte dos pagamentos são feitos hoje com dinheiro eletrônico, criado pelos bancos. A criação de dinheiro acabou privatizada e os Estados ficaram omissos.
Enquanto os falsários arriscam-se para criar e vender 2,5 biliões de dólares a cada ano, os bancos criam e vendem mais de 100.000 bilhões no mesmo período, sem violar a lei. Porque não existe uma lei.
O valor de todas as coisas presentes no planeta Terra não passa do 10% do dinheiro, títulos e valores mobiliares e imobiliares. Em outras palavras: 90% da suposta riqueza não existe, é papel.
A realidade é que nossas casas valem um quarto, as ações das empresas um décimo, e os títulos públicos podem até não valer nada e nem serem reembolsados.
Pilhas de dividas públicas, derivativos, moedas sem valores, alimentadas constantemente por um sistema sem ideias e nem futuro. Um sistema maluco, fora de controle. Um jogo: o Banco Imobiliário da vida real.
Querem imprimir cédulas e vender dívidas para toda a eternidade.
O que ganham os bancos? Interesses, juros.
O que ganhamos nós? Uma vida de dívidas.
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* É sociólogo. Reside em Santarém e escreve regularmente no blog do Jeso

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