Ana Júlia Carepa nunca teve três mil assessores especiais.
Entre exonerações e nomeações, o saldo da ex-governadora petista deve ter ficado em torno de 1.500 ou 2000 assessores – quer dizer, quase a mesma quantidade dos governos tucanos.
Tal disputa, porém, é irrelevante.
Afinal de contas, o que importa se tucanos ou petistas nomearam mais ou menos assessores que os seus rivais?
Assessorias especiais, assim como incentivos fiscais e outras questões administrativas ou de governo, não são um mal em si.
O problema é a maneira como são usadas e até, é claro, a compatibilidade com a legislação.
II
Na imoralidade que cerca o uso das assessorias especiais se lambuzaram tucanos, petistas, peemedebistas e praticamente todos os partidos paraenses.
Até porque essa imoralidade envolve não apenas quem concede, mas, também, quem recebe tais “favores”.
É preciso, portanto, acabar com essa infantilidade e hipocrisia.
Estão todos atolados até o pescoço nessa imundície.
Todos são responsáveis pelo mal uso desses recursos públicos.
E todos são responsáveis até pelo vexame a que estão expostos os técnicos que efetivamente trabalham, colocados, muitas vezes, no mesmo balaio que os assessores cuja nomeação busca apenas a obtenção de um “comportamento ameno” diante dos atos do Executivo.
Então, a primeira necessidade que salta aos olhos é a de acabar com a imoralidade na utilização das assessorias especiais.
Talvez a regulamentar tais assessorias, como propõe o projeto do deputado Airton Faleiro; talvez até acabar com elas, mediante o aumento do número e da remuneração dos DAS.
III
No entanto, até a moralização do uso das assessorias especiais se torna “menor” diante de outra questão: o comportamento do Judiciário paraense.
Na série de reportagens publicada neste blog você viu os fortes indícios acerca da contratação das filhas e da mulher dos desembargadores Constantino Guerreiro e Cláudio Montalvão para a assessoria do Governo do Estado.
No final de semana, o blog conseguiu confirmar, através de uma boa fonte, que também a desembargadora Vania Lúcia Azevedo da Silva e o juiz Paulo Jussara, possuem filhos com nomes idênticos aos de assessores recentemente nomeados: Roberta Silveira Azevedo da Silva, assessor especial II; e Gabriel Pinheiro Jussara, assessor especial (ambos estão na listagem publicada aqui na Perereca).
Além disso, há indícios de que o procurador-chefe da Procuradoria Judicial da Secretaria Municipal de Assuntos Jurídicos (Semaj), da Prefeitura de Belém, Leonardo do Amaral Maroja, é filho do desembargador João José da Silva Maroja, que até recentemente presidiu o Tribunal Regional Eleitoral (TRE).
Para completar, o ex-presidente do Tribunal de Justiça do Estado e conselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Milton Nobre, aluga uma casa ao Governo do Estado, como você também leu aqui.
Ora, o quadro que surge diante de tudo isso, aos olhos de nós, cidadãos, é assustador.
Afinal, qual a garantia de IMPARCIALIDADE do Judiciário paraense, quando desembargadores têm mulher e filhos empregados pelo Governo e Prefeitura, e até casa alugada ao Governo?
Mais que nepotismo, isso é PROMISCUIDADE.
A nomeação dos filhos e da mulher dos ilustres magistrados pode nem configurar nepotismo cruzado, como defendem alguns; o aluguel da casa de Milton Nobre pode até estar nos trinques, do ponto de vista formal, como afirmam alguns.
Mas a legalidade não torna nada disso moral.
Tudo continua a ser uma IMORALIDADE, um desrespeito aos cidadãos, uma afronta à República, uma ameaça à Democracia.
E como tudo isso é feito praticamente em “segredo” – quer dizer, se publicam as nomeações, mas não o parentesco dos nomeados com os ilustres desembargadores – o que resta ao cidadão é, simplesmente, o desespero.
Quem colocaria a mão no fogo pelo comportamento de um magistrado que deve “favores” ao Governo?
Quem colocaria a mão no fogo por um Judiciário em que um número expressivo de magistrados deve “favores” ao Governo?
E se não pudermos recorrer nem mesmo ao Judiciário para a garantia de direitos, a quem, afinal, poderemos recorrer?
IV
Tenho pela Magistratura, assim como pelo Ministério Público, a maior admiração.
Penso que magistrados e promotores talvez nem recebam a remuneração que merecem, tendo em vista a formação que deles se exige e a responsabilidade que carregam.
Nada disso, porém, torna menos vergonhosa a promiscuidade existente no estado do Pará.
E se é certo que ela remonta há séculos, isso não significa que possa prosseguir.
Precisamos passar a limpo o Judiciário paraense.
Simplesmente porque sem um Judiciário independente não chegaremos a lado nenhum.
Pouco importa se o governante é Simão Jatene, Ana Júlia Carepa ou até mesmo Jesus Cristo.
Nenhuma sociedade, por mais organizada que seja; nenhum cidadão, ou até mesmo um Deus, será capaz de arrancar este estado das trevas medievais em que ainda se encontra, se não tivermos um Judiciário que funcione como tem de funcionar.
Os próprios magistrados – e são muitos aqueles que honram a Magistratura – precisam ter a coragem de cortar na própria carne.
E nós todos, os “cidadãos comuns”, temos de pressionar nesse sentido.
Esta é a tarefa mais importante que temos hoje, no Pará e até no Brasil: garantir o Judiciário que os brasileiros e os paraenses realmente merecemos.
Um Judiciário independente, e composto por cidadãos que, por seu honroso comportamento, estejam, de fato, acima de qualquer suspeita.
V
Frente a uma questão tão importante, essa quizília interna da OAB se parece com mera cortina de fumaça, proveniente de uma vergonhosa disputa político-partidária.
Tão vergonhosa que faz com que partidos como o PSDB e o PT, e até entidades como a OAB, acabem se transformando em meros agentes do retrocesso.
O PT e o PSDB erraram por terem se lambuzado nessa lama? É claro que erraram.
A OAB errou por não ter se manifestado antes? É claro que errou.
Nada disso, porém, desqualifica as providências agora adotadas pela OAB, como a queixa ao CNJ e o processo no TRF.
Nada disso torna menos importante o projeto do deputado Airton Faleiro e o debate em torno das assessorias especiais e da necessidade de independência entre os poderes republicanos.
E mesmo que exista “oportunismo” ou “senso de oportunidade” de alguns, tudo continua a ser de somenos importância.
Nenhum erro autoriza a permanência no erro.
E quem se presta a tentar reduzir questões tão importantes à mera politicagem, deveria era ter vergonha de tamanho desserviço à sociedade paraense.
VI
Infelizmente, até jornalistas têm agido nesse sentido, até com recurso a essa falácia tão primária que é o “argumento contra o homem”.
Acusam quem acusa; apontam os erros alheios e não o erro em si.
Nada dizem acerca da imoralidade da utilização dessas assessorias e do comportamento de alguns magistrados.
Agem para tentar nos convencer da “normalidade” de tudo isso – e até para tentar nos condenar a continuar a conviver com tudo isso.
Será esse o papel dos jornalistas?
Será esse o papel da blogosfera?
Para que, afinal, existem os blogs?
Apenas para se transformarem em extensões dos jornalões ou arautos da versão oficial?
Ou será que o nosso papel é justamente levar ao conhecimento do distinto público aquilo que ele precisa e tem o direito de saber, até para que possa reagir?
Toda essa questão das assessorias especiais e da promiscuidade entre o Governo e magistrados paraenses está a exigir uma profunda reflexão até mesmo acerca disto: o papel social dos jornalistas e blogueiros.
Pelas partes que me tocam, penso que a blogosfera não será jamais o espaço apropriado para as panelinhas, os convescotes, dos apaniguados dos governantes e dos donos de jornais.
Vejo a blogosfera como uma nova realidade da informação, com infinitas possibilidades em termos de democratização da notícia e da fiscalização do Poder.
E penso que toda a repercussão alcançada por essas questões é o resultado da ação dos jornalistas, blogueiros e blogonautas que conseguem enxergar essa nova realidade e a importância dela para a construção de um Pará melhor.
Pena é que, para outros, o mais importante seja apenas o interesse partidário. Ou até as fartas verbas de propaganda da Secom.
FUUUUIIIIIIIIII!!!!!!!!!
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