sexta-feira, 26 de outubro de 2007

PARA REFLETIR SOBRE A MÍDIA

O repórter Rodrigo Vianna (TV Record), aquele perseguido pela Rede Globo, ao receber o prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos, pronunciou o seguinte discurso.

Meus amigos.
Muito mais que um prêmio, ou um troféu, o Vladimir Herzog é um símbolo. Símbolo de uma época em que jornalista morria quando desafiava o poder, ou quando queria simplesmente fazer o seu trabalho. Hoje, o risco maior é perder o emprego - e alguns aqui sabem bem do que estou falando.

Em 1975, quando Vlado foi assassinado num quartel em São Paulo, um ato corriqueiro como esse aqui - uma reunião pública - era proibido! Muita gente morreu, e milhares de brasileiros foram às ruas lutar, pra que a gente hoje possa estar aqui. Digo isso, pra celebrar a Democracia. Não importa que alguns, em gabinetes oficiais, avacalhem com o mandato que recebem. A Democracia não pertence a eles. Muito menos aos que se julgam donos da "opinião pública", no comando das redações por aí! A Democracia é nossa, e devemos defendê-la.

O Vladimir Herzog é também um símbolo de que há muito a se fazer nesse país. A nossa série de reportagens mostrou uma situação escabrosa no interior da Bahia: 64 mortes na explosão de uma fábrica de fogos. Crianças e mulheres, que trabalhavam sem registro, sem segurança, sem direito nenhum. Por salários miseráveis!

Quase 10 anos depois, ninguém foi julgado. Não vejo nossa classe média cansada - e iluminada pela Philips - fazer passeatas por esses mortos. Valem menos do que outros mortos? Por que essa indignação seletiva no país?
Ainda bem que existe o Vladimir Herzog, pra falar disso! E ainda bem que agora há mais concorrência no Jornalismo de TV! Isso também é simbólico nesse caso!

O sujeito que chefia a fabricação de fogos em Santo Antonio de Jesus tem ligações com o grupo politico que mandava na Bahia até pouco tempo... Esse mesmo grupo é dono da maior emissora baiana. E essa emissora, concorrente da Record, nunca deu muita bola pro caso. Por que será? É curioso: eles têm equipe a postos pra atacar os quilombolas, como fizeram recentemente na Bahia. Pra estigmatizar os movimentos sociais. Mas, pra lembrar impunidade, num caso de 64 mortes, aí não há equipe. Curioso!

Mas, tudo bem. Porque agora há essa turma aqui na Record, disposta a contar essas histórias. Fico muito contente de estar nesse time, que aposta num Jornalismo de verdade! E não num Jornalismo que testa hipóteses ou que defende teses estranhas - como a de que não existe racismo no Brasil! Aí,não dá! Francamente...

Já que cheguei a esse ponto, peço licença pra falar de um assunto pessoal. Ano passado, vivi momentos um tanto conturbados quando deixei a empresa onde trabalhei por 12 anos. Tenho lá muitos amigos. Há muita gente séria lá, certamente... Mas, hoje, estão sob comando de uma direção meio aloprada... No momento da minha saída, com um comunicado covarde, tentaram me desqualificar. Na época, me diziam: reaja, processe, parta pra cima!

Não dei bola. Eu me lembrei de uma entrevista do Pepe, antigo craque da seleção... Perguntaram pra ele uma vez: "Pepe, quando vocês iam à Argentina, nos anos 60, já chamavam os brasileiros de macaquitos?" E o Pepe: "sim, claro, isso sempre existiu".
"E o que vocês faziam?".
"A gente metia gol neles".
Isso é muito bom. Quanto mais os argentinos xingavam, mais gol levavam...

Humildemente, porque não sou o Pepe, acho que nós fizemos um belo gol, com a matéria e com o prêmio. A gente gosta é de ganhar na bola! A gente sabe ganhar na bola! Mas, se precisar, a gente também sabe dar umas caneladas! Queria, por fim, agradecer a todos que me deram apoio naquele momento conturbado. Amigos de infância, de Faculdade - jornalistas ou não. Agradeço a todos aqui, publicamente! Mas, gostaria de agradecer especialmente à minha mulher, Teresa - ponta firme e guerreira. Agradeço a meus pais, que me ensinaram a encarar as brigas que valem a pena! A meu irmão - que sabe travar o bom combate. À minha irmã querida, e à família toda. E, claro, a meus filhos André e Vicente. Por eles, principalmente, vale lutar por um mundo melhor.
Viva a Democracia! Viva o Jornalismo plural! Viva Vladimir Herzog! Obrigado a todos."

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