quarta-feira, 4 de março de 2020

Davi Kopenawa: “Os garimpeiros, sem dúvida, vão matar os índios isolados na área Yanomani”

Líder Yanomani denuncia na ONU desmonte de políticas públicas do Governo Bolsonaro, 
invasão de seu território pelos garimpeiros e a situação crítica dos grupos isolados
“Meu povo tem o direito de viver em paz e em boa saúde, porque ele vive em sua própria casa. Na 
floresta estamos em casa! Os Brancos não podem destruir nossa casa, senão, tudo isso não vai 
terminar bem para o mundo”. Este foi o alerta do líder indígena Davi Kopenawa Yanomami, que 
participou nesta terça-feira de uma audiência na Comissão de Direitos Humanos da Organização das 
Nações Unidas (ONU), em Genebra, onde deu seu testemunho sobre a invasão do território 
Yanomami pelos garimpeiros e a ameaça que isto representa aos grupos isolados Moxihatetea.
A sessão, promovida pelo Instituto Socioambiental (ISA), pela Comissão Arns e pelo Conectas
denuncia a frágil situação dos povos indígenas em isolamento no Brasil, e riscos de etnocídio e 
genocídio destas populações. U relatório do ISA, apresentado na audiência mostra que, em 2019, a 
derrubada da floresta nessas terras cresceu 113% no Brasil, sendo que na somatória de todas as 
Terras Indígenas (TIs), o aumento foi de 80%. Seis terras indígenas ―Ituna/Itatá, Kayapó, 
Munduruku, Uru-Eu-Wau-Wau, Yanomami e Zoró―, que possuem dez registros de povos indígenas 
isolados, estão listadas entre as treze TIs que respondem por 90% do desmatamento nesses 
territórios”, aponta o relatório.
perseguição a servidores, deslegitimação dos dados de desmatamento” estão entre as razões 
apontadas pelo relatório para o estímulo a invasões.

Leia a íntegra do testemunho de Davi Kopenawa
As coisas estão assim. Agora os Brancos não vivem longe de nós. Eles não param de se aproximar. 
Na cidade de Boa Vista, eles se tornaram muito numerosos, vão aumentar sem trégua, e agora eles se 
exortam uns aos outros. Eles dizem: “Sim, vamos nos apoderar dos bens preciosos da terra dos 
Yanomami. Esses bens ainda não são mercadorias de verdade, mas são bens preciosos, escondidos no 
cascalho da terra. Nós vamos tomar essas riquezas, e ainda as árvores da floresta e vamos nos 
instalar nos Yanomami!”. É o que os Brancos dizem uns aos outros e é como eles se encorajam: 
”Venham para Boa Vista! Eu, Governo de Roraima, vou lhes dar trabalho! Vocês não serão mais 
pobres!”. Estas são as palavras deles. Com elas querem trocar seu dinheiro e suas mercadorias. 
Assim os Brancos, todos eles, não param de fixar seu olhar sobre a nossa floresta para tentar se 
apoderar dela. Eles dizem: “Sim, nós vamos arrancar dinheiro da floresta. Os Yanomami não sabem 
de nada, portanto são nossas as riquezas”. É isso o que os Brancos falam ao encorajar seus 
trabalhadores a virem para a floresta. “Sim, podem ir! Não tenham medo! Os Yanomami parecem 
numerosos, mas nós é que somos, de verdade! Mesmo que eles flechem alguns de nós, ainda assim 
seremos ainda muito numerosos!”
Dizendo dessas coisas todas é que eles aumentaram tanto e por toda a parte, na floresta, nos rios, nas 
terras altas. Eles querem o ouro. O valor do ouro aumentou cada vez mais e eles aumentam sem 
cessar. Eles pensaram: “Sim, agora o valor do ouro está muito alto. Vamos todos para a terra 
Yanomami!”. É assim que eles adentraram a floresta por todos os lados, através dos rios, pelas 
trilhas, com seus aviões e helicópteros. É assim que as coisas estão hoje em dia. Eles abriram portas 
de entrada pelos rios e pelo ar. Eles desmataram para fazer pistas de aterrissagem por toda a parte. 
Também desmataram para fazer novas trilhas na floresta. Na bacia do Rio Apiaú, é por aí que eles 
chegam em grande número. Pelo rio Parimiú também. Eles já foram expulsos de lá, mas voltaram 
ainda mais numerosos! Há também uma outra trilha, que sobe ao longo do Rio Catrimani.
Pela trilha do Rio Apiaú, eles se aproximaram do lugar onde vive o grupo isolado Moxihatetea. Nas 
nascentes do Rio Apiaú, onde vivem esses povos isolados, começaram a atacar e a destruir a floresta 
e seus rios. No início, eles trabalhavam com as mãos, mas agora usam máquinas. Descem as peças 
dessas máquinas de um helicóptero para, depois, montá-las ali mesmo. É assim. Os Moxihatetea 
estão vigilantes e desejam ficar longe dos Brancos. Eles não conhecem garimpeiros e não querem 
que se aproximem. Então já fugiram muitas vezes. Mas agora, não podem mais fugir. Antes eles se 
refugiavam na floresta profunda, longe das trilhas, e lá ficavam em acampamentos provisórios, como 
quando estavam em expedições de caça, longe de casa. Os garimpeiros então começaram a roubar a 
comida dos roçados – a mandioca, as bananas, as canas de açúcar, quando as suas provisões de arroz, 
farinha e latas de conservas se esgotaram. Então os guerreiros Moxihatetea os atacaram com flechas, 
com os Moxihatetea isolados, e eu acho isso muito errado.
Então eles fugiram de novo subindo o rio, mas nessa direção também há garimpeiros instalados no 
Rio Catrimani, criando obstáculo. Os índios agora estão cercados. Por isso estou falando para 
defender os Moxihatetea. Mas eu não conheço as suas casas, assim como vocês também não 
conhecem. Eu só as vi do céu, do avião. Nunca os visitei a pé. Nunca nos falamos. É por isso que 
estou muito preocupado. Talvez em breve estarão exterminados. É o que eu acho. Os garimpeiros 
sem dúvida vão matá-los com suas espingardas e suas doenças, a sua malária, a sua pneumonia... Os 
indígenas não têm vacinas de proteção, vão todos desaparecer.
E não há só eles na terra-floresta Yanomami. Mais além, na região de Erico, vivem outros povos 
isolados. São como os Moxihatetea. E também, na outra margem do Rio Catrimani, a jusante, nas 
cabeceiras do Rio Xeriuini, há outros isolados. E ainda num afluente do Rio Arca, no centro. É por 
isso que lutamos por eles. Estamos muito inquietos pelo que possa lhes acontecer. Há outros isolados 
na floresta próxima dos Waimiri-Atroari e há outros em toda a Amazônia! Viviam assim há muito 
tempo e querem continuar assim! São eles que cuidam verdadeiramente da floresta. São os 
Moxihatetea e todos os povos isolados da Amazônia que ainda guardam a última floresta. Mas os 
Brancos não sabem disso, porque eles não compreendem a língua desses povos. Os brancos apenas 
pensam: “O que eles estão fazendo aqui?” E quando os Brancos chegam, são suas epidemias que 
chegam também com eles.
É por isso que eu reflito: “O que acham os Grandes Homens [autoridades] dos brancos? Não querem 
nos deixar viver em paz e em boa saúde? Eles nos detestam, de verdade?”. É evidente que nos 
consideram como inimigos, porque somos outras gentes, somos habitantes da floresta. Fomos criados 
na floresta da Amazônia, no Brasil, e por isso os Brancos não nos conhecem. Eles se contentam em 
atacar e destruir à vontade nossa floresta. Não é a terra deles mas eles declararam que lhe pertence. 
Eles pensam: “Essa floresta é nossa. Vamos arrancar o ouro do solo, cortar as suas árvores e vamos 
instalar aqui outros brancos que necessitam de terra, os criadores de gado, os colonos, e vamos então 
acabar com os Yanomami”. Não é só o que eles pensam, agora é até o que eles dizem mesmo!
O novo presidente do Brasil, eu nem menciono o seu nome, nem digo para ele: “Como você é o 
presidente, você deveria nos proteger!”. Eu já conheço as palavras desse presidente: “Que venham 
todos os Brancos que queiram dinheiro, os criadores de gado, os madeireiros, os garimpeiros e os 
colonos também. Eu vou dar-lhes essa floresta, para acabar com todos os Yanomami, todos eles, e 
para que os Brancos se tornem os proprietários. É nossa terra e tudo bem! Assim é, eu sou o único 
senhor dessa terra!”. Essas são as suas palavras. Essas são as palavras daquele que se faz de grande 
homem no Brasil e se diz Presidente da República. É o que ele verdadeiramente diz: “Eu sou o dono 
dessa floresta, desses rios, desse subsolo, dos minérios, do ouro e das pedras preciosas! Tudo isso me 
pertence, então, vão lá buscar tudo e trazer para a cidade. Faremos tudo virar mercadoria!”.
É o que os Brancos acham e é com essas palavras que destroem a floresta, desde sempre. Mas, hoje, 
eles estão acabando com o pouco que resta. Eles já destruíram os nossas trilhas, sujaram os nossos 
rios, envenenaram os peixes, queimaram as árvores e os animais que caçamos. Eles nos matam 
também com as suas epidemias. Alguns Brancos têm pena de nós, mas não os seus Grandes Homens, 
que dizem que nós somos animais. Eles dizem: “São macacos, porcos do mato!”. No entanto, são 
esses homens que não sabem pensar. Eles não sabem trabalhar na floresta, não conhecem seu poder 
de fertilidade në rope. Só ficam andando de um lado para o outro, destruindo. Eles só querem 
conhecer a floresta do alto de suas máquinas satélites, que saem das cidades e que olham de relance 
as árvores, as nossas casas, os rios, as colinas, a beleza da floresta. Depois disso eles chamam os 
outros: “Sim, venham pra cá. Nós todos do Brasil vamos tirar os bens preciosos! Nós vamos 
acumular tudo isso nas cidades! Nós vamos, de verdade, virar o Povo da Mercadoria! Não seremos 
mais pobres, vamos ter muitos bens!”. É o que eles dizem entre eles. Era isso que eu queria contar 
aqui. Essa gente é indiferente às palavras daqueles que defendem os Yanomami. Mesmo assim, envio 
essa mensagem.
Gostaria que os Direitos Humanos da ONU pudessem olhar para nós e nos dar um apoio muito forte 
para que as autoridades do Brasil ―os políticos dos municípios, dos estados e da capital ―todos 
esses Brancos das cidades, nos respeitem e não nos molestem mais. Que eles compreendam e 
reconheçam os direitos dos seres humanos, assim como faz a ONU. Os Direitos Humanos da ONU 
são construídos para defender os que sofrem. Então, eu gostaria que a ONU faça um bom trabalho, 
denunciando com muita força o que nos acontece, para que as autoridades do Brasil respeitem os 
Yanomami, os povos isolados e todos os povos ainda não reconhecidos.
Meu povo tem o direito de viver em paz e em boa saúde, porque ele vive em sua própria casa. Na 
floresta estamos em casa! Os Brancos não podem destruir nossa casa, senão, tudo isso não vai 
terminar bem para o mundo. Cuidamos da floresta para todos, não só para os Yanomami e os povos 
isolados. Trabalhamos com os nossos xamãs, que conhecem bem essas coisas, que possuem uma 
sabedoria que tem contato com a terra. A ONU precisa falar com as autoridades do Brasil para retirar 
―imediatamente― os garimpeiros que cercam os isolados e todos os outros em nossa floresta.
Tradução do Yanomami por Bruce Albert, antropólogo, Laura Greenhalg e Manuela C da Cunha.

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