O propósito cada vez mais nítido do ex-capitão? Demolir
literalmente o próprio país
Segundo as pesquisas mais recentes, existem, de tamanho mais ou menos igual, três Brasis: um é
lulista, outro bolsonarista e o terceiro não está nem aí. Gostaria de dizer que não confio em
pesquisas, bem como em analistas, mas admito ter mais convicção em relação a estes do que àquelas.
De todo modo, temos a prova de que Bolsonaro já mostra ser uma liderança popular, a ponto de levá-
lo a anunciar, mal terminados seis meses de governo, a sua candidatura à reeleição. Salve-se quem
puder.
O ex-capitão, cercado de protetores fardados, soube como tornar a demência uma forma de governo
com o propósito cada vez mais nítido de demolir literalmente o próprio país. Com o desvairado
demolidor no comando, eleito por crentes e agnósticos, sobra muito escasso espaço nem digo para a
esperança, melhor para ilusões. As quais, no entanto, habitam o pensamento dos inúmeros descrentes
sempre à espera de um milagre, ou de uma súbita reconciliação, sob a influência da boa índole
nativa, ou mesmo de uma pretensa esquerda incerta e desunida, a não ser no Nordeste,
impropriamente chamado de “fundão do Brasil”.
Entre as pesquisas divulgadas nos últimos tempos, uma me parece especialmente representativa dos
humores nacionais, do nosso inarredável primarismo: uma consistente maioria entende que Sérgio
Moro agiu irregularmente, não como magistrado digno de um país civilizado, e sim um inquisidor
quinhentista, em atendimento às demandas de Washington e da casa-grande. Contudo, Lula deve
continuar engaiolado. Por quê? Porque algum pecado ele deve ter necessariamente cometido.
Pior que contraditória, a resposta dos pesquisados implica a saúde mental. Se o atual ministro,
premido por sua atuação, trapaceou para condenar e mandar prender o ex-presidente com o
beneplácito do STF, determina a lógica que quem foi injustamente alvejado volte à liberdade com as
desculpas do Estado. A lógica, ora a lógica… De resto, quantos brasileiros percebem que seu país,
pátria amada, idolatrada, vive uma fraude faz cinco anos, desde quando entrou em cena a Lava Jato.
Demente o governo, dementes os demais poderes da República, demente uma larga parte da
população humilhada e ofendida sem se dar conta da sua desgraça. A indiferença diante de tudo
aquilo que teria de abalá-la nas entranhas, vítima primeira ela mesma, condenada à ignorância sem a
mais pálida chance de redenção. Somos a obra-prima da dinastia de Avis, disse Raymundo Faoro em
dois formidáveis volumes em que desfia a história aterradora dos donos do poder. Sentenciados ao
cabo por uma colonização predatória como outra não houve por três séculos e meio de escravidão,
ainda presente graças à permanência da casa-grande e da senzala.
O objetivo dos colonizadores foi admiravelmente atingido pela forma mentis que se prontifica a
O objetivo dos colonizadores foi admiravelmente atingido pela forma mentis que se prontifica a
obnubilar os neurônios nativos. Até intelectuais, orgânicos ou não, são incapazes de perceber que a
Revolução Francesa nunca aportou no Brasil e acreditam habitar um país ocidental onde, ao menos,
alguns valores da civilização estão preservados. Que valores? Ruas e avenidas invadidas pelos
veículos automotores? Eles também vivem em profunda confusão e merecem o presidente eleito e o
seu governo demente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário