sexta-feira, 5 de abril de 2019

DOSSIÊ: PORQUE PRENDERAM LULA


Democracia em frangalhos: por que Toffoli 
recuou? POR RICARDO CAPPELLI
O que está por trás do recuo de Toffoli, retirando da pauta a votação sobre a legalidade da prisão após condenação em segunda instância? A data estava marcada desde o ano passado.
Existem algumas hipóteses para a decisão.
O presidente do STF pode ter recuado porque a posição de que a prisão só pode acontecer após o trânsito em julgado seria derrotada. Seria uma manobra defensiva, uma tentativa de ganhar tempo e fortalecer a instituição para que ela, mais a frente, adote a posição.
Alguns movimentos corroboram com esta leitura. Foi grave o que aconteceu no último dia 3 de abril. OAB, CNBB, UNE, CNI e outras entidades foram ao STF entregar um manifesto de defesa do…STF! Não foram defender posições, foram defender a instituição. Por que ela precisa ser defendida? A Suprema Corte está ameaçada? Quem está ameaçando?
Outra hipótese é que Toffoli recuou em busca de uma saída negociada, que empurre a prisão para a terceira instância, após julgamento pelo STJ. O adiamento seria uma manobra para permitir que o STJ julgue e condene Lula antes da decisão do STF, retirando o ex-presidente do alcance dos efeitos desta revisão.
Neste raciocínio, poderia estar sendo negociada com o STJ uma prisão domiciliar para Lula. A Lava Jato sofreria uma “meia derrota”, com a prisão sendo permitida apenas após a terceira instância. E Lula seria enviado para uma “meia prisão”.
A terceira hipótese é que Toffoli adiou porque iria ganhar a votação. Faz sentido?
A vitória do Estado Democrático de Direito tiraria Lula da cadeia. Seria uma derrota dos “Torquemadas”. Se a vitória era provável, que forças foram capazes de impor um recuo?
Militares de alta patente ocupam oito ministérios. E estão por toda a Esplanada. Nunca antes, nem mesmo na Ditadura, militares tiveram tanto poder. Enquanto a autoproclamada esquerda dança serelepe ao som do “Bonde do Tigrão”, debatendo se “tchuchuca” é termo machista ou não, um jogo real e perigoso vai sendo montado.
Na cerimônia de transmissão do Comando do Exército, o general Villas Bôas disse que o Brasil vivia um novo momento graças a dois homens: Jair Bolsonaro e Sérgio Moro. Quem será o próximo a receber a mais alta comenda do exército brasileiro? Deltan Dallagnol.
No início da caminhada do Capitão, os militares externaram a preocupação de que a instituição não misturasse sua imagem com a do candidato. Hoje, parecem embebedados pelo poder.
No seu jogo, Bolsonaro continua tratando com desdém o parlamento. Os sinais públicos de aproximação são apenas parte de um ritual “fake”. No núcleo militar do Planalto, políticos são tratados como bandidos.
Guedes fez calar o plenário da CCJ com uma ironia ameaçadora. Repetiu por quatro vezes diante de deputados mudos: “Vocês acham que os militares estão contribuindo pouco na reforma da previdência? Por que não mudam? Vocês têm medo? Têm medo?
A democracia no Brasil está em frangalhos. Os pessimistas dizem que já chegamos a 64, restaria saber apenas se iremos para 68.
Existem várias formas de fechamento. Com forças de inteligência do aparato de estado alimentadas pela NSA, setores antinacionais da burocracia estatal engajados e um braço forte armado, os “cabos e soldados” podem ser dispensados de alguma exibição mais extravagante.
Por que Toffoli recuou? Que pressões atuaram sobre ele? Por que temem tanto a soltura de Lula? Por que é necessário manter o regramento de um Estado de Exceção?
O PIB deve crescer no máximo 1% este ano, aprofundando o desemprego e o drama social. Será preciso encontrar culpados, ou “uma culpada” para o desastre. A democracia, infelizmente, parece ser a primeira da fila.
“Já são cinco anos de investigação e nenhuma 
prova” POR LEONARDO FERNANDES
Nos últimos cinco anos, Cristiano Zanin Martins, advogado criminalista e membro da equipe de defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tem tido pouco descanso. Ele e outros advogados e advogadas têm travado uma verdadeira batalha judicial para garantir que os direitos fundamentais do ex-mandatário sejam respeitados.
Lula está preso desde o dia 7 de abril em Curitiba, acusado pelo Ministério Público Federal (MPF) de haver recebido recursos ilícitos de uma empreiteira, através da reforma de um apartamento triplex na cidade de Guarujá, litoral paulista.
Lula não só nega a acusação, como afirma que é vítima de uma perseguição jurídica com fins políticos. Ao completar um ano de sua prisão, o Brasil de Fato conversou com Zanin para saber quais serão os próximos passos da defesa pela liberdade do ex-presidente. Confira:
Brasil de Fato: Já se passou quase um ano desde a decretação da prisão do ex-presidente pelo ex-juiz Sérgio Moro. Um ano que, apesar de todo o trabalho da defesa, o ex-presidente permaneceu preso e acabou impedido de participar das eleições presidenciais. Qual o balanço que a defesa faz de tudo o que aconteceu até agora?
Cristiano Zanin Martins: Lamentavelmente, tudo o que nós afirmamos no comunicado feito ao Comitê de Direitos Humanos da ONU em 2016, veio a ocorrer. Em julho de 2016, quando nós protocolamos aquele comunicado perante a ONU, nós já dissemos que o ex-presidente Lula estava sendo vítima de uma intensa perseguição, de uma verdadeira cruzada de alguns setores do sistema de Justiça brasileiro, e que o objetivo era condená-lo sem prova de culpa com o fim de inviabilizar, de impedir a sua atuação política e até mesmo uma eventual candidatura à Presidência da República em 2018.
Tudo isso veio a ser confirmado por um processo marcado por graves violações ao direito de defesa, às garantias fundamentais do ex-presidente Lula. Depois sobreveio uma sentença que claramente condenou o ex-presidente Lula sem nenhum elemento concreto, sem nenhuma base jurídica e que foi confirmada pela segunda instância. O ex-presidente não teve, até o momento, o direito a um processo justo, a um julgamento imparcial e independente, e isso, possivelmente, foi levado em consideração pela ONU nas decisões liminares que foram concedidas no ano passado para que o ex-presidente pudesse concorrer nas eleições presidenciais, quando ele inclusive liderava todas as pesquisas de opinião. Infelizmente, o Brasil, descumprindo uma obrigação internacional que havia assumido por meio de tratados, deixou de cumprir essas liminares que foram concedidas pelo Comitê de Direitos Humanos da ONU.
O que ocorreu na sequência, que é público e notório, foi que o juiz Sérgio Moro, que capitaneou todo o processo de condenação do ex-presidente Lula, veio se tornar o principal ministro de um governo eleito nessas circunstâncias, eleito a partir de um impedimento indevido da candidatura do ex-presidente Lula. Então, esse cenário, esse desfecho inclusive, da própria ida do ex-juiz Sérgio Moro ao governo federal, um governo de oposição ao ex-presidente, deixou claro para quem poderia ter alguma dúvida, de que Lula não teve jamais um julgamento imparcial e um julgamento justo. Nós esperamos que todo esse cenário possa levar o Comitê de Direitos Humanos da ONU a confirmar as violações grosseiras que nós afirmamos e que também haja sensibilidade das cortes superiores brasileiras para que venha a reverter essa condenação imposta ao ex-presidente Lula e restabelecer a sua liberdade plena o mais breve possível porque essa é a única situação compatível com a de uma pessoa que não praticou qualquer crime. E isso fica muito claro a partir de tudo o que aconteceu até hoje. Já são cinco anos de investigação intensa contra o ex-presidente Lula, contra os seus familiares e colaboradores e nenhuma prova de culpa foi apresentada, nenhum elemento concreto foi apresentado, a não ser insinuações, ilações que, como todos sabemos, não podem jamais fundamentar uma condenação criminal.
A defesa tem reiterado que o ex-presidente é vítima de lawfare. Gostaria que o senhor explicasse aos nossos ouvintes e leitores do que se trata e quais são as evidências dessa prática no caso do ex-presidente Lula?
A acusação que foi dirigida contra o ex-presidente Lula no caso do triplex, assim como outras acusações, têm em comum a absoluta falta de materialidade. Não há nenhuma evidência, não há nenhuma prova contra o ex-presidente Lula, mas isso não impediu que ele fosse condenado e essa decisão utilizada para mantê-lo preso há cerca de um ano. Então, essa situação, associada a uma clara intenção de perseguição política, nos leva a classificar esse caso como um caso emblemático de lawfare, que é justamente o uso perverso das leis e dos procedimentos jurídicos para fins de perseguição política.
A defesa também tem afirmado reiteradas vezes que durante todo o processo de instrução apresentou provas da inocência do ex-presidente Lula no caso do triplex do Guarujá. Quais provas foram essas? Em contraponto, o que a acusação apresentou?
A acusação não fez qualquer prova de culpa do ex-presidente Lula. A sentença condenatória, assim como a sua confirmação em segundo grau pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, deu-se fundamentalmente com base no depoimento de um corréu, em um depoimento prestado sem o compromisso com a verdade e por uma pessoa claramente interessada em obter benefícios do Ministério Público. Por outro lado, nós fizemos as provas, durante diversas audiências, após oitivas de 73 testemunhas, de que o ex-presidente Lula não praticou qualquer ato ilícito, não praticou nenhum ato de ofício, não recebeu qualquer contrapartida, ao contrário do que foi afirmado pela denúncia feita pelo Ministério Público. E fomos além. Nós demonstramos que aquele apartamento do Guarujá pertencia, ou pertence até hoje à OAS, e havia sido dado em garantia em uma operação feita entre a OAS e a Caixa Econômica Federal e, portanto, para que alguém recebesse a propriedade daquele apartamento teria, segundo aquele contrato feito entre a OAS e a Caixa, que pagar 100% do valor do apartamento à Caixa Econômica Federal. O que jamais aconteceu.
Então essa situação mostra o caráter frívolo da acusação que foi dirigida contra o ex-presidente Lula, mostra a absoluta falta de materialidade, mostra que o Ministério Público não fez qualquer prova de culpa do ex-presidente e mostra ainda que as provas de inocência que nós, advogados de defesa, fizemos, foram desprezadas tanto em primeira instância quanto na segunda instância. Nós temos recursos pendentes de julgamento nos tribunais superiores e entendemos que esses recursos devem levar à reversão da decisão condenatória porque essa decisão condenatória viola frontalmente a legislação federal e também a Constituição Federal.
Como o senhor já mencionou nessa entrevista, além das duas instâncias superiores ainda há uma expectativa sobre o julgamento do mérito do caso do ex-presidente no Comitê de Direitos Humanos da ONU. Como vai esse processo?
Nós apresentamos esse comunicado individual ao Comitê de Direitos Humanos da ONU em 2016, fizemos diversas atualizações desse comunicado até o presente momento, tínhamos uma expectativa de que ele pudesse ser analisado no mês de março, quando ocorreu uma reunião do Comitê, mas tivemos conhecimento de que o Brasil acabou por apresentar uma nova manifestação no último dia 19 de março que pode ter inviabilizado essa análise.
Mas outras duas sessões do comitê irão acontecer ainda neste ano, possivelmente em julho e em novembro, e nós temos a expectativa de que o Comitê possa, em uma dessas duas sessões que ocorrerão neste ano, analisar esse comunicado porque é um comunicado já instruído, com todas as evidências de violações grosseiras às garantias fundamentais do ex-presidente Lula e que está, portanto, pronto para julgamento, e esse julgamento poderá reconhecer a ocorrência dessas grosseiras violações às garantias fundamentais do ex-presidente Lula e ajudar o Brasil a se reencontrar com o Estado de Direito, com a legalidade e, consequentemente, permitir o restabelecimento da liberdade plena do ex-presidente Lula porque ele não praticou qualquer crime.
Além dos recursos impetrados pela defesa em outras instâncias, também há um julgamento no STF que pode ter impacto sobre o caso do ex-presidente Lula e é o julgamento das ADCs que questionam o entendimento do Supremo sobre a prisão após condenação em segunda instância. O presidente do Supremo, Dias Toffoli, retirou esse julgamento da pauta, atendendo a um pedido da OAB, como o senhor avalia esse adiamento?
Nós da defesa do ex-presidente Lula não participamos diretamente dessas ações que tramitam no Supremo Tribunal Federal discutindo a questão da prisão em segunda instância. Mas, evidentemente, acompanhamos porque é um tema que tem total interesse da defesa e cujo desfecho pode ter bastante repercussão no caso do ex-presidente Lula.
A nossa visão é de que a Constituição Federal brasileira não permite outra interpretação que não seja a de impedir qualquer execução de pena sem a existência de uma decisão condenatória transitada em julgado. A Constituição é expressa nesse sentido, ao garantir, ao assegurar a presunção de inocência até que haja uma decisão definitiva transitada em julgado. E, por isso, nós entendemos também que seria muito importante que o Supremo possa reafirmar esse entendimento o quanto antes, possa restabelecer uma linha jurisprudencial que já era afirmada anteriormente por aquela corte, exatamente nesse sentido.
A interpretação dada em 2016 por maioria de votos, com todo respeito, não é compatível com a nossa Constituição. As pessoas podem ter opiniões, podem gostar ou não dessa leitura constitucional. Mas não e possível modificar o texto constitucional por uma interpretação que venha a se dar pelo Supremo Tribunal Federal em outro sentido. É preciso, efetivamente, garantir a inteireza do texto constitucional, e isso somente será possível se o Supremo Tribunal Federal reafirmar essa posição, a posição de que ninguém pode ser preso, ninguém pode ser obrigado a cumprir uma pena sem que haja uma decisão condenatória definitiva transitada em julgado.
Finalmente, os senhores, advogados de defesa, chegaram a apresentar provas de uma suposta cooperação ilícita entre agentes da Operação Lava Jato e autoridades dos Estados Unidos. A quem foi dirigida essa denúncia e resultou em quê?
Nós levamos ao processo que tramitou na 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba provas de que houve cooperação informal de autoridades estadunidenses com autoridades brasileiras. Inclusive, naquilo que chamaram de construção do caso. É preciso ressaltar que o Brasil tem um acordo firmado com os Estados Unidos, prevendo uma série de formalidades para que haja uma cooperação entre os dois países. E no caso do ex-presidente Lula, nós mostramos que essas formalidades não foram observadas. A própria cooperação dos Estados Unidos é classificada como informal, o que não é possível. Cooperação informal é algo ilegal, é algo ilícito, é algo que não pode ser aceito no nosso país porque viola o tratado internacional que foi firmado com os Estados Unidos.

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