quinta-feira, 26 de outubro de 2017

O MICO DA PATRULHA GLOBO JATO


O blefe da Lava Jato virou mico

por GUILHERME SCALZILLI


A ideia até parece engenhosa. Se as buscas policiais não encontraram recibos do aluguel de um
imóvel usado por Lula, bastaria desenvolver uma narrativa incriminadora cuja contestação 
dependesse dos tais documentos. Afinal, os delatores servem exatamente para atar os fios soltos do 
PowerPoint.
Os heróis da Lava Jato estavam tão convictos na infalibilidade da estratégia que não lembraram que 
o mandado da Polícia Federal se restringia a papéis de outro inquérito. Iguais a jogadores neófitos, 
subestimaram os adversários, blefaram na hora errada e transformaram um lance trivial numa série 
de tropeços juvenis.
Recapitulemos brevemente os lances da partida.

1) Os procuradores cobram os recibos. 2) A defesa fornece cópias. 3) Os procuradores divulgam 
papéis com erros e, incentivados pela mídia, apostam alto. 4) A defesa cobre a aposta e deixa que 
questão dos recibos vire o centro da teoria acusatória. 5) O Ministério Público acusa a falsidade 
ideológica, jogando nela todas as suas fichas. 6) Só então a defesa afirma ter periciado os 
documentos e exige condições para apresentar os originais.
É um caso clássico de esperteza que engoliu o sabujo. Acostumados aos confortos da pós-verdade 
coercitiva, os procuradores achavam que os recibos deixariam de existir apenas porque isso convinha 
à trama do Lula falsário. Terminaram enredados numa comédia em que os próprios acusadores 
ajudam o réu a desmoralizá-los.
Cabe salientar que a trapalhada não confirma nem desacredita o efetivo pagamento do aluguel ou a 
lisura das cópias apresentadas. A questão é que o MP engasgou, deixando no ar uma dúvida que, no 
desequilíbrio de forças em disputa, só favorece o acusado. E nunca é demais lembrar que essa 
ninharia imobiliária deveria esconder um hipotético desvio de imensas fortunas ilegais. 
A ingenuidade presunçosa do MP conseguiu estremecer toda a linha de trabalho da perseguição a 
Lula. Desqualificou os informantes. Colocou a questão das provas materiais em destaque. Forneceu 
um triunfo simbólico à defesa e, principalmente, permitiu a ela constranger Sérgio Moro na delicada 
seara ética. Em resumo, demonstrou um amadorismo que decerto embaraçou muitos profissionais 
tarimbados do Judiciário.
Vivêssemos sob um regime jurídico “normal”, talvez Moro fosse obrigado à vexatória absolvição do 
desafeto. Mas, sob um regime jurídico “normal”, ele já teria sido afastadode qualquer processo 
envolvendo Lula. Por isso, apesar da agressão ao bom-senso, não acredito em reviravoltas na 
primeira instância.
Resta observar como serão os desdobramentos do episódio. Por um lado, a questão das perícias, que 
não apenas terá grande influência nas etapas recursais, mas também pode causar danos à própria 
Lava Jato. Por outro, a nova tática do MP, a um passo de ver seus delatores caírem em desgraça, 
precisando urgentemente das provas que ele mesmo exigiu.
De qualquer forma, quanto maior o silêncio da mídia a respeito, mais eloquente é o sinal da 
importância que o assunto vem ganhando nos bastidores.

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