sábado, 29 de julho de 2017

OS "PEIDOS" DO BARBICHA DO "BANESTADO"


Luis Nassif

A entrevista do procurador  Carlos Fernando dos Santos Lima à Folha é significativa dos
males que a Lava Jato causou ao Ministério Público Federal pela falta de comando do PGR
(Procurador Geral da República) e do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público). E
mostra como a espetacularização do Judiciário prejudicou a Justiça, em benefício de
membros dos dois poderes.
Anos atrás participei de um debate sobre o tema no Encontro Nacional dos Juízes Federais.
Eugênio Bucci dizia que os holofotes sobre a Justiça aumentariam a transparência do
Judiciário. Eu rebati sustentando que quem participasse desse show da vida acabaria se
comportando de acordo com as características do ambiente. Para se manter no show
teriam que ceder cada vez mais às exigências do público.
Do pré-mensalão para cá, o maior fator de estímulo à opinião pública – especialmente dos
executivos de mercado e de grandes empresas – foi a anti-política, o anti-petismo radical.
Tornou-se a bola da vez, abrindo espaço para palestras, consultorias de toda espécie.
É só conferir aquele economista que participa do Manhatan Connection. No início, era um
sujeito de bom senso e conhecimento técnico, em meio a colegas jejunos no assunto. Hoje
em dia, no Twitter, suas mensagens são do nível de um Lobão. E sempre acompanhadas de
mensagens autopromocionais.
O primeiro a surfar nessas ondas do ódio à política foi Joaquim Barbosa, que trocou o cargo
de Ministro do Supremo por uma banca de advocacia à qual recorrem grandes empresas
que não querem dificuldades com a lei. Nem se diga que o radicalismo de Barbosa foi
ensaiado. É de nascença mesmo.
Não se trata meramente da crítica à política, mas da propagação do ódio em todos os
níveis como ferramenta de marketing.
Se esse marketing rentável pegou até quem galgou todos os degraus da carreira de
procurador, o que não dizer de procuradores que fizeram toda sua carreira em centros
menores, como é o caso de Curitiba.
Em todos esses momentos, exercitaram, por palavras e atos, o exercício do ódio mais
visceral.
É só conferir as declaração de Carlos Fernando, sobre as fraquezas de Sérgio Moro de
absolver socialites cariocas claramente envolvidas e beneficiadas com os golpes dos
maridos:
- Ele tende a ser mais brando com as mulheres, mesmo. Nós pedimos autorização para
condução coercitiva de Marisa Lula e ele não concedeu.
Ou seja, não bastava invadir a casa de Lula, revirar camas e quartos, conduzi-lo
coercitivamente com toda a imprensa avisada. Tinha também que submeter a esposa ao
mesmo rito de humilhação.
E contou isso, em uma entrevista, com a mesma naturalidade de qualquer frequentador de
boteco contando as últimas machezas para a roda.
Em seu perfil ataca os “inimigos da operação” e adota frases como "vamos acreditar que
podemos ser livres, que podemos escolher pessoas íntegras, que existe esperança".
Na entrevista à Folha, Carlos Fernando conta, de passagem, o final da grande encenação:
aposentadoria do MPF e montagem de um escritório de advocacia que se especializará em
... compliance, é claro.
Com a quantidade de empresas envolvidas devida ou indevidamente com a Lava Jato, é
previsível o sucesso do futuro escritório. Afinal, não contratará apenas um escritório
especializado em compliance,  mas um escritório especializado em uma ciência à parte: o
que o MPF, mais especificamente, o MPF brasileiro, mas especificamente, as Forças Tarefas,
entendem por compliance. Contratar o futuro advogado significará percorrer o caminho das
pessoas íntegras e descobrir que existe a esperança. Amém!
Seu poder não deriva mais do cargo, nem ele está mais submetido às regras disciplinares
do MPF. Agora, o procurador está dotado da Força: a capacidade de cada pum no Facebook
se tornar manchete em jornais que perderam totalmente a capacidade de avaliar as
notícias pela relevância. Com o Poder, ele se considera mais forte que o próprio PGR.
Na entrevista, critica os erros de comunicação do PGR no acordo com a JBS, critica a
decisão do TRF4 de absolver Vaccari, ensina jurisprudência ao Judiciário. Critica tudo. Os
únicos que têm o monopólio do acerto são eles, da Lava Jato. E se a Justiça não aceita
apenas indícios como prova, é porque o Judiciário está desatualizado. Não se conhece um
trabalho de fôlego do procurador sobre o tema.
Indagado sobre a falta de isenção de quem se manifesta politicamente na rede, é taxativo
“Se eu estivesse fazendo consideração político-partidária, eu estaria realmente vinculado a
certos posicionamentos. Se você defende princípios que estão na Constituição, esse
argumento é absurdo. Eu vou falar. Não posso deixar de falar. Eu tenho uma obrigação de
falar”. Obviamente, do PT e do PMDB, sem nenhuma menção ao PSDB. Durante toda a
entrevista fala dos processos. E, obviamente, aproveita para anunciar seu futuro escritório
de advocacia especializado em compliance.
Não se pode negar que ambos – ele e Deltan Dallagnol – tem o faro apurado do investidor
de oportunidades. Aproveitaram ao máximo os holofotes da mídia, exercitaram com
maestria o discurso do ódio, forneceram carne fresca à vontade para um mercado sedento
de sangue, e fincaram as bases para o salto profissional. Mas é piada falar em meritocracia.
Por mérito, Carlos Fernando jamais passaria de procurador regional no Paraná.
À Folha ele afirmou que seu objetivo, com as catilinárias nas redes sociais, é inspirar os
procuradores que combatem a corrupção Brasil afora.
Aliás, um bravo procurador, envolvido com a Lava Jato e com outras grandes operações,
dia desses se queixava da tendência das novas gerações, de usarem o MPF como
trampolim para carreiras no setor privado. Esta é a parte pior da herança deixada por por
Janot: a leniência com o protagonismo excessivo da Lava Jato, que escancarou a falta de
isenção e, agora, a falta de disciplina e de discrição que deveria caracterizar a carreira de
procurador.
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