terça-feira, 27 de junho de 2017

FRANGOTE E PROCURADORIA OMITEM DESTINO DOS VALORES COBRADOS NAS PALESTRAS DE 2017


O Frangote da Globo Jato, Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil.   Na polêmica se o 
ato é legal ou ilegal, coordenador da força-tarefa da Lava Jato no Paraná se 
empenha em justificar 2016. Mas e 2017? 

Patricia Faermann

Jornal GGN - Ao se justificar sobre as palestras remuneradas, o coordenador da força-tarefa do Paraná, Deltan Dallagnol, omite esclarecimentos sobre um suposto fundo para o combate à corrupção que está sendo alimentado com as participações do procurador da República em seminários e exposições pagas no ano de 2017.
 
Após reportagem da Folha de S. Paulo informar que o procurador da República receberia, por meio de uma agência, entre R$ 30 mil e R$ 40 mil por palestra concedida, e diante da falta de regulamentações que garantam, efetivamente, que a prática seja legal, Dallagnol emitiu uma nota pública, no dia 17 de junho, informando que "para que não haja dúvidas" sobre a sua motivação pessoal, a maior parte do dinheiro era doado.
Sobre o ano de 2016, trouxe detalhes: os pagamentos para as palestras daquele ano foram destinados à "construção do hospital oncopediátrico Erasto Gaertner, uma entidade filantrópica que contribuirá com o tratamento de câncer em crianças de vários locais do país". 
Após uma participação em evento promovido pela XP Investimentos, na capital paulista, na última quinta-feira (22), Dallagnol respondeu a questionamentos de jornalistas (leia aqui) e disse que as suas doações representaram R$ 219 mil em 2016 para as obras do hospital. 
Três dias depois, o próprio Hospital Erasto Gaertner confirmou o dado:
 
 
Ainda assim, o investigador vêm insistindo na tese dos repasses do ano de 2016, sem trazer esclarecimentos sobre o destino desses pagamentos neste ano de 2017. A única informação divulgada, até o momento, foi em sua primeira nota publicada no início do mês:
"Em 2017, após descontado o valor de 10% para despesas pessoais e os tributos, os valores estão sendo destinados a um fundo que será empregado em despesas ou custos decorrentes da atuação de servidores públicos em operações de combate à corrupção, tal como a Operação Lava Jato, para o custeio de iniciativas contra a corrupção e a impunidade, ou ainda para iniciativas que objetivam promover, em geral, a cidadania e a ética."
GGN contatou a Procuradoria da República do Paraná, na manhã desta segunda (26), solicitando mais informações. Outras questões feitas pelo jornal foram respondidas pela Assessoria de Comunicação (acompanhe abaixo), mas nada foi esclarecido sobre o fundo mencionado pelo procurador. Insistimos em um posicionamento sobre o destino dos pagamentos feitos a Dallagnol pelos eventos de 2017 e não obtivemos um retorno. 
Entre as palestras, que resultaram em remunerações ao procurador membro da força-tarefa da Lava Jato no Paraná, Dallagnol não revelou, por exemplo, o cachê recebido no Expert 2017, patrocinado pela XP Investimentos. A entrada para o público custava R$ 800. E a estimativa é que cerca de 4.500 pessoas estiveram presentes nos três dias. "Não falo sobre contratos específicos por cláusulas de confidencialidade, não posso expor o contratante", disse.
 
 
No segundo semestre do ano, também em encontro voltado a investidores e área financeira, Deltan Dallagnol confirmou a participação como palestrante no 8º Congresso Internacional de Mercados Financeiro e de Capitais, nos dias 24 a 26 de agosto, em Campos do Jordão, cidade de trânsito da alta sociedade paulista nos períodos de inverno.
Conhecido como o "Congresso da Bolsa", também realizado em três dias e com dezenas de palestrantes, incluindo os já confirmados ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, o nobel de Economia Daniel Kahneman, e também o senador Ronaldo Caiado (DEM-GO), o preço para o público é de R$ 4.720 se garantida a entrada com antecedência. Após o dia 2 de julho, o valor da inscrição por pessoa é de R$ 5.900.
 
 
Em meio às polêmicas, o próprio presidente da OAB, Cláudio Lamachia, cobrou que o coordenador da força-tarefa do Paraná divulgue, publicamente, quem são todos os contratantes e quanto recebeu por cada uma das palestras. "A sociedade tem o direito de saber quem são e quanto ele recebe por elas. O princípio da transparência vale para todos os servidores públicos", defendeu Lamachia.
 
Palestras por procuradores: legais ou não?
 
Conforme o GGN mostrou (leia aqui), não existe regulamentação hoje para o exercício remunerado de palestras e seminários para membros do Ministério Público, principalmente quando se trata de atividades junto a instituições que não são relacionadas ao ensino, cursos ou educação superior. 
Entretanto, tanto Dallagnol, quanto a Procuradoria da República do Paraná sustentam que a atividade é legal e lícita, regulamentada por dispositivos. A polêmica sobre o tema é que o próprio Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), órgão responsável por fiscalizar membros do MP, admite que não há normas que dispõem sobre palestras.
Após contatar o CNMP e analisar todo o material disponível sobre regulamentações e normas para cargos do Ministério Público, verificando a inexistência de regimentos para o tema, GGN contatou a Procuradoria do Paraná para entender o posicionamento defendido.
Questionamos, ponto a ponto, algumas controversas existentes e expostas na reportagem "Não há regulamentação que permita Dallagnol receber por palestras". A comunicação da Procuradoria do Paraná trouxe a seguinte defesa, que publicamos, a seguir, na íntegra:
"Como é algo que se aplica a todos os procuradores, a ANPR se manifestou conjuntamente:
Existe uma simetria constitucional entre a Magistratura e o Ministério Público, como o próprio CNJ já reconheceu, por exemplo, na Resolução nº 133. Há paralelismo constitucional entre as carreiras do Ministério Público e do Judiciário, o que determina, na maior parte dos casos, uma equivalência de direitos, prerrogativas e deveres. A possibilidade de cumulação da função de procurador e de juiz com o magistério aparece de modo idêntico na Constituição. De fato, o art. 95, parágrafo único, I, da Constituição Federal, estabelece que é vedado aos juízes “exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função, salvo uma de magistério”. O art. 128, § 5º, II, “d”, da Constituição, tem regra idêntica para o Ministério Público, estabelecendo a vedação para “exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo uma de magistério”. A Resolução 34/2007 é um marco interpretativo, estabelecido por um órgão de cúpula do próprio Poder Judiciário, no tocante ao que está compreendido dentro da atividade docente. A Resolução reconhece, de modo correto, que a realização de palestras está compreendida dentro do conceito de atividade docente, que é um mesmo tipo de atividade, seja para o Ministério Público, seja para o Poder Judiciário. Portanto, em razão da simetria constitucional amplamente reconhecida, inclusive pelo próprio CNJ, entre o MP e o Judiciário, o conceito de atividade docente é um só para ambas as carreiras - e não haveria como ser diferente porque é a mesma Constituição que a prevê. Tal conceito, inequivocamente, engloba a realização de palestras. Acrescente-se que, como já explicado pela ANPR, que o Conselho Nacional do Ministério Público, na Res. 73/2011 que trata do exercício do magistério, não incluiu a realização das palestras entre as proibições a serem observadas pelos integrantes do Ministério Público. Como acima esclarecido, a atividade docente engloba, de modo inequívoco, a realização de palestras.
A permissão para tal atividade decorre diretamente da Constituição Federal. Evidentemente, na linha das Resoluções do CNJ e do CNMP, a atividade docente do membro do Ministério Público e do Judiciário deve ser compatível com o exercício das funções ministeriais. A Resolução 73/2011 do CNMP veio regular especificamente um tipo de atividade docente, que é aquela prestada em salas de aula. O limite de 20 horas-aulas, em sala de aula de comarca próxima, refere-se, evidentemente, à atividade docente com vínculo empregatício em Universidades, e não à realização de palestras, que é atividade docente permitida e normalmente ocorre em auditórios, sem exigência de vínculo territorial próximo ou vínculo empregatício com instituição de ensino. É prática consolidada, absolutamente legal, e jamais censurada a realização de milhares de palestras eventuais, sem vínculo empregatício, por centenas de membros do Ministério Público, em auditórios em cidades distantes de sua lotação, inclusive no exterior. Do mesmo modo, é lícita a realização de palestras nos mais variados ambientes, que não constituem instituições de ensino e incluem plenários de órgãos legislativos, associações de defesa do meio ambiente, de direitos indígenas, do consumidor ou ainda que objetivam promover uma melhor educação. Não há, no ordenamento, proibição alguma da participação de membros do Ministério Público em qualquer evento como palestrante. Na Resolução 73/2011, há uma série de proibições a quem pretende exercer a docência. Nenhuma delas refere-se à participação em palestras. A razão disso é óbvia: o caráter eventual das palestras não traz para o exercício da função as mesmas dificuldades que o vínculo empregatício com instituições de ensino. Não é demais lembrar que os membros do Ministério Público são regidos somente e tão somente pela Constituição Federal e pela Lei Complementar 75/93. Tentar impor a eles obrigações outras que não as previstas no ordenamento equivale a ignorar o disposto no art. 128, § 5, da CF/88, segundo o qual o estatuto dos membros do MP será definido por lei complementar, obedecidos os nortes constitucionais. 
Buscar dar interpretação diferente às normas regedoras do Ministério Público para atacar a honra de procurador da República atenta não só contra a Constituição, as boas práticas estabelecidas e os fatos, mas também contra todos os Procuradores.
Att.
Rubens Chueire Jr.
Assessoria de Comunicação - Ascom - Procuradoria da República no Paraná

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