por Carlos Eduardo Reis Cleto*, especial para o Viomundo é advogado especializado em Direito Eleitoral e em Direito Previdenciário.
O julgamento da ação ajuizada pelo PSDB contra a chapa Dilma/Temer está se aproximando.
E a pergunta que muitos se fazem é uma só: quais seriam as consequências caso a ação seja julgada procedente, cassando a chapa vitoriosa nas eleições presidenciais de 2014?
Em brilhante artigo publicado nessa segunda-feira (29/05), Fernando Morais denuncia o acordão que está sendo costurado para salvar a pele de Michel Temer e colocar os tucanos no poder. Entre os principais termos elencados, destaco este:
“Temer deve sair logo, para evitar a cassação pelo TSE e a eventual convocação de eleições diretas já para presidente da República”.
Morais tocou num ponto que a maior parte da esquerda não está entendendo: a renúncia é a moeda de troca com que Temer comprará a tranquilidade de seu futuro.
Explico.
Juridicamente, o trânsito em julgado de tal julgamento, ou seja, a decisão final, deve resultar em eleições diretas para presidente, como se demonstrará adiante.
Porém, não acredito que Temer fará à Democracia o favor de se deixar vencer na Ação movida pelo PSDB e, assim, provocar eleições diretas.
Afinal, para prestar seu derradeiro serviço à direita (serviço que provavelmente será muito bem remunerado), basta a Michel Temer renunciar antes da derrota final.
Na verdade, as consequências da eventual cassação da Chapa Dilma / Temer pelo TSE estão sendo mal compreendidas.
A maioria das opiniões publicadas refere o problema ao Artigo 81 da Constituição Federal:
“Art. 81. Vagando os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, far-se-á eleição noventa dias depois de aberta a última vaga.
§ 1º Ocorrendo a vacância nos últimos dois anos do período presidencial, a eleição para ambos os cargos será feita trinta dias depois da última vaga, pelo Congresso Nacional, na forma da lei.”
A expressão, “Vagando os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República” refere-se à vacância de cargos legalmente ocupados, seja por morte, renúncia ou impedimento.
Ocorre que a hipótese posta em julgamento no TSE é de NULIDADE DA ELEIÇÃO, por CASSAÇÃO DE REGISTRO da Chapa vencedora.
Ou seja: não se trata da “Vacância” referida na Constituição Federal, porque na hipótese de cassação do registro da Chapa Dilma / Temer, a eleição não foi validamente concluída. Teria sido uma eleição nula, que juridicamente não teve valor algum.
Nessa hipótese, o que se aplica é o Artigo 224 do Código Eleitoral (aquele que frequentemente é mal citado pelos que pregam o “voto nulo que vai anular a eleição”, confundindo voto nulo com eleição nula):
“Art. 224. Se a nulidade atingir a mais de metade dos votos do país nas eleições presidenciais, do Estado nas eleições federais e estaduais ou do município nas eleições municipais, julgar-se-ão prejudicadas as demais votações e o Tribunal marcará dia para nova eleição dentro do prazo de 20 (vinte) a 40 (quarenta) dias.
§ 1º Se o Tribunal Regional na área de sua competência, deixar de cumprir o disposto neste artigo, o Procurador Regional levará o fato ao conhecimento do Procurador Geral, que providenciará junto ao Tribunal Superior para que seja marcada imediatamente nova eleição.
§ 2º Ocorrendo qualquer dos casos previstos neste capítulo o Ministério Público promoverá, imediatamente a punição dos culpados.
§ 3º A decisão da Justiça Eleitoral que importe o indeferimento do registro, a cassação do diploma ou a perda do mandato de candidato eleito em pleito majoritário acarreta, após o trânsito em julgado, a realização de novas eleições, independentemente do número de votos anulados.
§ 4º A eleição a que se refere o § 3º correrá a expensas da Justiça Eleitoral e será:
I – indireta, se a vacância do cargo ocorrer a menos de seis meses do final do mandato;
II – direta, nos demais casos.”
Ou seja: a eleição apenas não será direta se a decisão final sobre a cassação ocorrer a menos de seis meses do final do mandato.
Os §§ 3º e 4º são inclusão recente (pela Lei nº 13.165 / 2015), mas apenas vieram positivar em Lei o que já era entendimento do TSE, como posto no Acórdão do MS 162-58.2011, em que o TSE decidiu que o Artigo 81 da Constituição Federal não se aplica nos casos de cassação de registro da chapa vencedora; apenas foi criada a restrição, posta no § 4º, de que nos últimos seis meses não se fará eleição direta.
Devido ao grande desgaste político de Temer e ao efeito paralisante da tramitação de um novo processo de impedimento, o seguinte cenário torna-se bastante possível:
1) Já que Temer diz “não renuncio, se quiserem me derrubem”, o TSE chama para si a responsabilidade e decreta a cassação da chapa, sem atrasos ou pedidos de vista;
2) Vencido no TSE, Temer ajuíza recurso ao STF, suspendendo dessa maneira a decisão do TSE e garantindo para si mais algum tempo no poder;
3) Decepcionando Temer, que torce por longa demora, o STF marca pauta rápido para julgar o recurso;
4) Sem mais nenhuma saída, Temer enfim dá-se por vencido e renuncia antes da cassação do registro transitar em julgado, para afastar a incidência do Artigo 224 da Lei Eleitoral e garantir a realização da eleição indireta.
Claro que esse cenário tem um pressuposto fundamental. A de que o Poder Judiciário queira chamar para si a responsabilidade pela saída de Temer:
Primeiro, o TSE tem que julgar logo, sem manobras e pedidos de vista,
Segundo, o STF tem que marcar pauta de julgamento em breve prazo.
Em seu artigo, Fernando Morais põe o dedo na ferida ao mencionar a necessidade de os golpistas acharem uma “fórmula legal para oferecer garantias a Temer após sua saída – seja ela indulto, perdão ou salvo-conduto”.
Em resumo, caso a situação de Temer se deteriore de maneira definitiva no TSE, ele terá uma perigosa moeda de troca:
a) se se deixar cassar, provocará eleições diretas (Artigo 224 do Código Eleitoral);
b) se renunciar antes de ser cassado, as eleições serão indiretas (Artigo 81 da Constituição Federal).
Portanto, poderá estar nas mãos de Michel Temer a decisão entre DIRETAS OU INDIRETAS.
Tremo em pensar qual será o preço que ele irá cobrar.
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