quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

A FELICIDADE SEGUNDO O FILOSOFO ZYGMUNT BAUMAN


Bauman

O filósofo Zygmunt Bauman, morto no último dia 9 aos 91 anos, falou com Valeria Arnaldi, do 
jornal italiano Il Messaggero, sobre felicidade. Foi uma de suas últimas entrevistas. A tradução é do 
Unisinos.

Professor Bauman, o que significa hoje “felicidade”?


A declaração de independência americana proclamou, entre os direitos invioláveis do ser humano, a 
sua busca: um marco para a civilização ocidental. As ideias de felicidade são muitas, mas que podem 
ser remetidas a duas categorias. A visão mais popular é a de uma vida plena de momentos 
agradáveis, sem problemas e desafios. A outra nos foi mostrada por Goethe. Já idoso, ele foi 
perguntado se a sua vida tinha sido feliz. Ele respondeu que sim, mas que não se lembrava de uma 
única semana em que o tivesse sido. Isso implica que ser feliz não significa não ter dificuldades, mas 
superá-las.

A atualidade mudou essas visões?

Definir o que significa ser feliz é muito complexo. A própria ideia de felicidade parece conter em si 
o pressuposto da sua não existência no mundo. A felicidade deve ser conquistada, mas, no nosso 
sistema de consumidores, vendem-se promessas de promessas de algo que nos fará nos sentirmos 
melhor. O mercado, em teoria, deveria aspirar a satisfazer todas as necessidades.

Na prática, porém…


Satisfazer os consumidores, na realidade, é o pesadelo do mercado: envolveria não ter mais nada 
para vender. Os especialistas, portanto, sabem nos manter continuamente insatisfeitos. A publicidade 
nos promete que seremos felizes com o novo celular, por exemplo, mas ela tinha feito o mesmo para 
o modelo anterior e vai refazer o mesmo para o posterior. Porém, milhões de pessoas correm para 
comprar.

O capitalismo está condenado, portanto, à infelicidade?


A atitude do sistema encoraja a ideia de que há algo que pode resolver todos os problemas e alimenta 
constantemente tal convicção. Isso torna os momentos de felicidade muito curtos. O problema é que 
somos constrangidos a gastar o dinheiro que ainda não ganhamos para comprar coisas das quais não 
precisamos para impressionar pessoas que não nos importam muito. Esse é o caminho para alongar 
os momentos de infelicidade.

É preciso repensar o nosso modo de nos imaginarmos satisfeitos?

É preciso redescobrir o prazer de comunicar. Eu não me refiro aos tuítes, mas a conversas de 
verdade. Há uma grande diferença entre encontros virtuais e tradicionais. Para voltar aos 
acontecimentos ao estilo antigo, cada um deveria diminuir as suas próprias demandas, mas o 
mercado tenta levantar as expectativas e faz isso nos forçando a pensar, desde crianças, que cada 
momento de felicidade deve ser melhor do que o anterior. Cada instante desperdiçado é uma chance 
de felicidade perdida.

A sociedade líquida ainda é capaz de ser feliz?

A ideia da sociedade líquida é de que nada permanece por muito tempo. Vivemos em um mundo de 
constante novidade, em que envelhecemos cada vez mais rápido do que antes. Estamos em um 
espaço vazio. Gramsci definiu essa situação como um interregno em que as velhas regras 
desapareceram, e as novas não foram inventadas. Isso gera ansiedade.

E para que cenários a ansiedade nos leva?


Quando eu era estudante, os professores diziam que aprender nos torna mais ricos. Eu acho que a 
cultura contemporânea não está mais fundamentada na capacidade de aprender, mas de esquecer. 
Para aprender outros conceitos, você deve eliminar os velhos. A maior qualidade seria, por isso, a 
habilidade de esquecer. Na Itália e na Espanha, vê-se menos isso. Na França, Alemanha, Inglaterra, a 
questão é evidente e é uma reação ao medo.

A crônica nos revela que muitos gostariam de respostas mais duras por parte da política: o medo está criando espaço para o retorno de regimes fortes?

Estamos voltando 200 anos atrás nas lutas por democracia e liberdade. Agora, desejam-se mais 
regras. Segurança e liberdade são valores fundamentais para a dignidade humana. A segurança sem 
liberdade é escravidão. A liberdade sem segurança é um tipo de deficiência. As pessoas, por séculos, 
procuraram equilibrar as coisas, e isso não funcionou. Cada passo em frente para a liberdade requer 
que se renuncie a uma parte da segurança. Cada passo rumo a uma maior segurança envolve 
renunciar a um pouco de liberdade. Não há um caminho direto para ter cada vez mais de uma ou da 
outra. É um pêndulo que oscila, empurrando para a mudança.

Hoje, oscilamos para a segurança.

Muitas pessoas, em diferentes partes do mundo, parecem ir na direção da renúncia a mais liberdades 
em favor da segurança, desejando uma situação mais estável. É a tendência atual. Ainda estamos em 
uma sociedade líquida, mas em que nascem sonhos de uma sociedade menos líquida.
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