por : Kiko Nogueira
“É isso que o Brasil deseja há 22 anos”, disse na Câmara o deputado Felipe Maia, do DEM do RN, sobre a redução da maioridade penal. “É a posição majoritária nas ruas”.
Uma comissão especial vai analisar a PEC 171 (sim, 171). O texto original, de 1993, é do ex-deputado Benedito Domingos (PP-DF) e altera o artigo 228 da Constituição, baixando de 18 para 16 anos a idade mínima para a responsabilização penal.
Domingos, que é evangélico, se define como um “visionário”. No ano passado, foi condenado em segunda instância por envolvimento no esquema de corrupção da Operação Caixa de Pandora. O TJ do DF o considerou culpado por improbidade administrativa ao ter recebido dinheiro para levar a estrutura de seu partido a apoiar o governo. Essa foi a segunda condenação de segunda instância de Benedito em menos de um ano.
Um Congresso conservador com crise de credibilidade tirou da gaveta uma proposta para atender uma demanda da população. De acordo com pelo menos duas pesquisas, da CNT e do Datafolha, mais de 90% das pessoas são a favor da medida.
A intenção é explorar os sentimentos mais primitivos — a vingança — de uma população amedrontada. O que o estado pode oferecer? A solução mágica com uma canetada constitucional e mais violência.
Não existe uma mísera estatística indicando que a questão central do aumento da criminalidade seja essa. Ao contrário: em São Paulo, dados de 2013 da Fundação Casa mostravam que, dos 9016 meninos e meninas internados, 49 eram menores suspeitos de latrocínio. Menos de 1%. Segundo o Ministério da Justiça, 0,9% dos crimes no país foram cometidos por jovens entre 16 e 18. Falando apenas em homicídio, o número cai para 0,5%.
A lei não é aplicada no Brasil. O recrudescimento não resolve. Um exemplo citado com frequencia por juristas é o da extorsão mediante sequestro. Em meados dos anos 80, houve uma onda de casos de repercussão. Em 1990, também sob “clamor popular”, foi aprovada a Lei dos Crimes Hediondos, que aumentou a pena e agravou seu regime de cumprimento. O que aconteceu? Nada. Ou melhor, um aumento dessas ocorrências.
Acreditar que jogar esse pessoal nas nossas masmorras vai resolver alguma coisa é absurdo. O CNJ calcula em 70% a reincidência no Brasil. No exterior, de 54 países analisados pelo Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), 78% fixam a maioridade penal em 18 anos ou mais.Nos Estados Unidos, a maioria dos estados permite que jovens com mais de 12 anos sejam submetidos à Justiça comum, incluindo a aplicação de pena de morte e prisão perpétua. Há dois anos, havia 75 milhões de delinquentes juvenis lá — um em cada quatro americanos. Em 2007, eram 73 milhões. Nesse período, a violência cresceu.
O Brasil é um país violento e é compreensível que o medo impere. Mas a ideia de que exista uma epidemia de assassinatos cometidos por crianças é falsa. Tem um enorme apelo nos instintos básicos e favorece o surgimento de falsos heróis como os cunhas que mandam no Brasil.
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