terça-feira, 26 de agosto de 2014

Governo Dilma aposta em novas energias renováveis, por Giorgio Romano Schutte



Brasil Debate

Por Giorgio Romano Schutte*


O Brasil se destaca no mundo por ter uma matriz energética diferenciada, com expressiva participação de fontes renováveis – graças aos investimentos em hidrelétricas e produção de etanol. Essas fontes tradicionais, porém, estão encontrando limites socioambientais para sua expansão.
A descoberta de vastas reservas de petróleo e gás (P&G) nas províncias do Pré-sal, em alto mar, suscitaram preocupações e dúvidas a respeito do compromisso do governo brasileiro com a expansão de novas fontes de energia renováveis, em particular a eólica e a solar.
O governo Dilma demonstrou firmeza ao não confundir essas duas questões e deixou claro que o esforço exitoso na exploração servirá para substituir as importações e para gerar um excedente de produção, não para sujar a matriz energética brasileira. Assim, concomitantemente aos esforços do Pré-sal, o governo Dilma fez uma revolução silenciosa na eólica.
Leilões de eólica
Ainda no governo Lula, em 2009, o Brasil realizou com sucesso, o primeiro leilão exclusivamente para a eólica. Mas foi no governo Dilma, em 2012, que o Brasil deu um salto ao aumentar sua capacidade instalada de 1,43 GW (2011) para 2,56 GW em 2012, concluindo 40 novos parques e chegando a um total de 108, que aumentou para 115 no final de 2013.
A expansão da energia eólica continuou em 2013 com grande participação nos leilões: no leilão de energia de reserva (usinas para estarem prontas em dois anos), 1,5 mil MW, com preço médio de R$ 110 MWh; no leilão A-3 para parques que entrarão em operação em 2016: 867,6 MW, a R$ 124,43 MWh; e no leilão A-5, com início de geração de energia em 2018, 2,3 mil MW a R$ 109,93 MWh.
Se tudo isso se concretizar nos prazos previstos, a capacidade de produção de energia eólica deve dobrar em cinco anos, para chegar a 14 mil MW instalada em 2018.
Em março 2014, a Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf) entregou todas as linhas de transmissão pendentes, conectando 18 novos parques no Nordeste e, em abril, a eólica atingiu seu marco histórico ao produzir 1 GW.
O mais importante foi o parque de Alto Sertão I, no Sudeste da Bahia, na região Serra Geral. Inaugurado pelo governador Jaques Wagner no final de 2012, é o maior complexo eólico da América Latina (O complexo engloba 14 parques, foi construído em 18 meses, gerou mais de 1.300 empregos diretos, e tem capacidade instalada de 293,6 MW).
Observe-se que houve ampla cobertura na imprensa a respeito do atraso das linhas de transmissão diante da rapidez com que se ampliou os parques de produção, mas a conclusão das linhas passou despercebido.
Em todo caso, o governo se organizou para evitar esse problema no futuro e pretende aumentar o rigor do critério de cálculo da garantia física, ou seja, o volume de energia comercializável.
O Programa de Expansão e Transmissão (PET) 2013-2017 tem como uma das metas reforçar a transmissão necessária para o escoamento dos parques eólicos existentes e previstos para entrar em operação nesse período.
O governo Dilma provocou de fato uma mudança de paradigma: a energia eólica deixou de ser marginal e conquistou um papel de destaque como uma das fontes complementares à energia hídrica (ao lado das termoelétricas a gás, carvão e óleo e da energia nuclear).
A desconfiança estava ligada ao fato de a energia eólica ser também (como a própria hídrica) imprevisível e intermitente. Dois fatos relativizaram essa percepção:
1) por coincidência, a variação temporal do vento é o espelho da hidrelétrica, ou seja: quando chove pouco nas regiões nas quais se concentram as principais hidroelétricas, venta muito nos principais parques eólicos;
2) a tecnologia se desenvolve rápido, o que possibilitou aumento da utilização da capacidade instalada. Assim, os parques de primeira geração já são considerados obsoletos: torres com menos de 50 metros e pás pequenas. Os novos parques trabalham com torres de quase 100 metros e pás maiores.
Tudo indica, portanto, que a participação na matriz energética pode aumentar de 0,8%, em 2011, para 4,4%, em 2014, e 7%, em 2020. As áreas de geração se concentram no Nordeste: litoral do Ceará, Rio Grande do Norte e Sudeste da Bahia; e no Sul: litoral do Rio Grande do Sul.
Conteúdo local
Importante também é a atenção do governo em ligar políticas energéticas com políticas industriais e de inovação. O Plano Brasil Maior definiu a eólica como prioridade entre as renováveis e apontava iniciativas para adensar a cadeia e aumentar o conteúdo local.
E, embora, os leilões não estabelecessem conteúdo local, o financiamento BNDES/ Finame exige um percentual mínimo de 60%. O desafio é gerar capacidade local para o fornecimento dos principais componentes, subcomponentes e de peças necessárias à nacionalização.
Na primeira fase, os componentes inovadores são importados. Tudo depende de estímulo à inovação. Trata-se de uma indústria nascente que precisa de fortes incentivos e P&D para alcançar escala que lhe permita concorrer internacionalmente.
Energia solar
Em seguida, o governo Dilma apostou na expansão da energia solar e marcou um primeiro leilão específico para energia solar para o final de setembro de 2014.
De acordo com a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), 225 projetos de usinas solares fotovoltaicas, somando 6.102 megawatts (MW) de capacidade instalada, se inscreveram para o leilão.
O mercado de sistemas compactos, específicos para habitações de interesse social, já tinha ganhado um forte impulso graças a duas iniciativas. A primeira delas é a instalação de sistemas de aquecimento solar como ferramenta de gerenciamento pelo lado da demanda, por meio dos programas de eficiência energética das empresas do setor elétrico.
E a segunda é a introdução dos sistemas como equipamento padrão nos projetos do programa de habitação popular Minha Casa Minha Vida, envolvendo mais de dois milhões de residências.
Outro exemplo positivo foi a decisão de usar energia solar como fonte para os novos estádios construídos por ocasião da Copa 2014. Foram instalados módulos fotovoltaicos de silício nas coberturas e/ou nos entornos de arenas, chegando, em alguns casos, a garantir 30% da necessidade de energia.
Pré-sal
Em paralelo, a Petrobras está demonstrando grande capacidade em explorar as riquezas do Pré-sal. Uma coisa não inviabiliza a outra, depende das políticas adotadas.
O caminho que vem sendo seguido é explorar o Pré-sal de forma inteligente, condicionar o ritmo de exploração à ampliação da capacidade produtivo-tecnológica interna e direcionar o excedente de produção para os mercados externos.
A renda assim gerada, por sua vez, poderia ser canalizada para fomentar a superação de deficiências estruturais na área de educação e infraestrutura social, de um lado, e, de outro, contribuir com o financiamento para a transição para uma economia de baixo carbono.

*Giorgio Romano Schutte é professor de Relações Internacionais e Economia da Universidade Federal do ABC (UFABC) e membro do Núcleo Estratégico de Estudos sobre Desenvolvimento, Democracia e Sustentabilidade (NEEDDS)
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