quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

O desafio da Rede de Marina Silva


Por Claudio Bernabucci

Em um país normal, quando ocorre o lançamento de uma nova força política, liderada por alguém que possui um dote eleitoral de 20 milhões de votos como Marina Silva, a atenção da mídia deveria ser proporcional ao impacto que tal evento promete produzir na vida nacional. Aqui, na “democracia madura” celebrada por politiqueiros incautos, o principal grupo editorial do País relega a notícia a poucas linhas superficiais na página 9 do seu jornal.
 Os canais públicos não são de menos e, ao convidar Marina em programa de certa audiência, conseguiram pôr-lhe perguntas quase sempre capciosas e desprovidas de autêntico interesse.
Não é por acaso que a nova formação política – fazendo da necessidade uma virtude – se projeta então em forma de rede virtual, capaz de suprir, através dos instrumentos da tecnologia informática, deficiências crônicas de informação pluralista e preencher o vácuo de militância deixado pelo PT na sociedade brasileira desde que é governo.
Como diziam os latinos, nomina sunt consequentia rerum (os nomes são consequência das coisas). Coerentemente, o nome escolhido para a nova formação é REDE. Acredito que não se tratará de fenômeno passageiro na história política brasileira e me parece importante acompanhá-lo com atenção desde o nascimento.
Sendo a informação transmitida pela imprensa e tevê absolutamente inadequada, quando não aprioristicamente negativa, na rede, ao contrário, não tive dificuldade em encontrar fontes primárias de informação e comentários interessantes de internautas sobre o novo partido. A escolha prioritária de comunicar e se organizar através da web resulta particularmente apropriada para um país de dimensões continentais e com férreo controle oligárquico da mídia. 
Os críticos podem afirmar que os instrumentos telemáticos continuarão sendo elitistas ou, pelo menos, não populares, ainda por muitos anos. Mas a primazia no domínio de tais instrumentos aplicados à política pode garantir, no médio prazo, uma formidável vantagem, sobretudo entre os jovens.
Nas mesmas horas em que Marina Silva apresentava ao público o perfil futurístico da sua REDE (citando modelos italianos e espanhóis), o PT infligia a Lula e Dilma um cartaz comemorativo dos dez anos de governo em impecável estilo do realismo socialista. Tendo como pano de fundo a imagem de operários e camponeses sorridentes que olham para “o sol do amanhã”, o retrato de Lula, em particular, é desenhado de forma tal – seguramente à sua revelia – que se parece mais com Stalin do que com ele mesmo. É possível que se trate de um acidente de percurso na propaganda de um partido que nos havia habituado a uma qualidade de marketing sofisticada, mas a impressão geral é de que a atual direção petista olhe com saudade para o século passado.
Ao contrário de Dilma, que enfrenta o palanque sem naturalidade, Marina Silva é líder dotada de forte carisma pessoal e se candidatará à Presidência da República firmemente colocada à frente do novo partido. Ela declara querer plasmar tal formação de modo que resulte mais forte e importante do que o próprio líder. Esta seria uma novidade importante para o Brasil, onde os partidos – numerosíssimos, indistinguíveis e intercambiáveis – viraram siglas a serviço de um chefe ou tornaram-se máquinas de poder. Dilma muito provavelmente ganhará as eleições, mas encontrará em Marina importante concorrente.
Um ingrediente do possível sucesso eleitoral da REDE reside na crítica firme ao atual sistema político-partidário e suas degenerações éticas. Trata-se de amplo espaço social, igualmente deixado vazio pelo PT, acuado pelas vicissitudes judiciárias da velha-guarda e incapaz de oferecer à opinião pública respostas coerentes à questão moral. Marina e sua REDE, desde os primeiros passos, demonstraram-se hábeis a se diferenciar de forma categórica dos outros 30 partidos: administrarão tal renda de posição em situação de monopólio quase absoluto.
Em relação ao conteúdo político e programático da nova formação podemos evidenciar que representa uma nítida terceira opção, dotada de força visionária, entre as tradicionais posições desenvolvimentistas e neoliberais. Um tal modelo diferente de desenvolvimento para o Brasil – baseado na sustentabilidade ambiental somada à inclusão social – é uma ideia-força que pode encontrar amplo consenso.
Os políticos, como dizia Maquiavel, devem ser jrepresentaulgados pelas “mãos” (os fatos) e não pelas palavras, e Marina Silva, com sua tradição de lutas,  há muitos anos uma reserva de coerência política a serviço do bem público. Nos primeiros passos da REDE, enxergamos muitos elementos de interesse como também muitas lacunas. Sabemos, no entanto, que a formação política é concebida in progress e como tal teremos de julgá-la.
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