quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Saiba quem é Chuck Hagel, nome escolhido por Obama para chefiar Pentágono

Se aprovado, ex-militar pode representar uma mudança sutil na política de Defesa do atual governo

Nos últimos dias, vem sendo veiculada em todos os Estados Unidos uma propaganda de TV nada abonadora para Chuck Hagel, ex-senador nomeado pelo presidente Barack Obama como seu novo secretário de Defesa.
Ele se prepara para enfrentar, nesta quinta-feira (31/01), uma sabatina de confirmação no Senado norte-americano.
Financiada pelo American Future Fund (AFF), organização que “defende princípios conservadores e de livre-mercado”, a peça publicitária chama a atenção para supostos conflitos de interesses caso ele de fato assuma o comando do Pentágono. “Quando era senador, Chuck Hagel recusou-se a divulgar seus bens ocultos”, diz o narrador. “Hagel aceitou caras viagens oferecidas por lobistas e doações de campanha de bancos que ele deveria regular”, completa.
A propaganda, que vai ao ar em canais como Fox News e CNN, revela ainda que o ex-senador é parte dos conselhos da petrolífera Chevron – que, por sua vez, se beneficia de contratos com o Pentágono – e de uma empresa que mantém investimentos no Irã.
Os ataques a Hagel presentes no vídeo do AFF estão focados exclusivamente em questões éticas. Mas suas motivações são claramente políticas – e isso apesar de o ex-senador integrar há décadas as fileiras do Partido Republicano.
Desde que seu nome apareceu como provável sucessor de Leon Panetta, no fim do ano passado, uma campanha de oposição à sua confirmação no cargo vem ganhando força entre os setores conservadores dos Estados Unidos. Embora sua aprovação pelo Senado seja o cenário mais provável – possivelmente, por uma pequena margem –, as manifestações explícitas de desagrado por parte de alguns parlamentares alertam que há riscos de veto.
Republicano moderado do estado de Nebraska, Hagel é famoso por suas críticas ao lobby israelense, pela oposição às guerras norte-americanas no Iraque e no Afeganistão e pela defesa de uma solução negociada no caso da suposta intenção iraniana de produzir uma bomba atômica. Além disso, é favorável a cortes no orçamento de Defesa.
Tal perfil poderia prenunciar alterações na política de Segurança Nacional do governo Obama, que promoveu trocas de comando nos outros dois postos-chave do setor. No Departamento de Estado, o senador democrata John Kerry – confirmado pelo Senado nessa terça-feira (29/01) – substitui Hillary Clinton.
Na CIA, o presidente norte-americano nomeou John Brennan, que, se aprovado na sabatina marcada para 7 de fevereiro, assumirá o cargo deixado vago por David Petraeus após um escândalo sexual.
Análise
Na opinião de analistas ouvidos pelo Opera Mundi, no entanto, a estratégia fundamental permanecerá a mesma. “Kerry, Hagel e Brennan não são pessoas que eu escolheria ou que os norte-americanos escolheriam por meio do voto. São apoiadores da guerra, opositores da lei internacional e servidores do poder”, afirma o ativista e escritor norte-americano David Swanson, integrante da organização Democratas Progressistas da América.
Para Jack Hammond, professor de Sociologia da City University, de Nova York, haverá apenas diferenças de estilo. “De maneira geral, podemos esperar que a nova equipe permanecerá próxima à Casa Branca e atuará em conjunto”, pontua. Ele acredita que se Chuck Hagel mantiver suas posições como secretário de Defesa, poderá exercer alguma influência positiva sobre os rumos do governo.
“A oposição a ele vem de apoiadores linha-dura da política israelense, que acreditam que os Estados Unidos devem estar preparados para executar uma ação militar contra o Irã com o objetivo de aniquilar sua capacidade nuclear. Nesse sentido, se ele for confirmado – como suponho que será –, será um sinal de que essas forças não são fortes o bastante para fazer Obama adotar uma posição mais linha-dura”, analisa.
O analista político norte-americano Alex Main é mais otimista. Em sua visão, as nomeações anunciadas por Obama entre o fim do ano passado e o começo de 2013 parecem confirmar que o presidente dos Estados Unidos esteja focando crescentemente na limitação do engajamento militar do país no exterior, particularmente na Ásia Central e no Oriente Médio.
“A mais emblemática e corajosa nomeação é a de Hagel, que foi muito mais crítico da política de Defesa de Bush que muitos proeminentes democratas, incluindo Hillary Clinton, quando era senadora. Então, do ponto de vista político, ele representa uma guinada à esquerda em comparação com os dois secretários de Defesa anteriores de Obama [Robert Gates e Leon Panetta]”, opina.
Segundo Main, as críticas abertas do ex-senador à influência do lobby israelense em Washington podem significar que ele esteja preparado para desafiar o atual governo de Israel, especialmente em relação às ameaças de um ataque militar ao Irã. “O fato de o presidente ter nomeado um franco defensor de posições que rompem claramente com as orientações da política para a Defesa dos últimos 12 anos sugere que podemos antecipar mudanças significativas nessa política.”
Oposição no Senado
Nesta quinta-feira, Hagel será sabatinado no Senado dos Estados Unidos pelo Comitê de Serviços Armados, cuja composição é de 14 democratas e 12 republicanos. Após a votação desses 26 parlamentares – que pode ocorrer em alguns dias – o nome do secretário de Defesa nomeado por Obama ainda tem de ser aprovado pelo plenário da Casa.
Muitos integrantes republicanos do Comitê já anunciaram – aberta ou veladamente – ser quase certo votarem contra a nomeação do ex-senador, entre eles Ted Cruz, Marco Rubio, Lindsay Graham, Kelly Ayotte e John McCain, concorrente de Obama nas eleições presidenciais de 2008.
“Há muito tempo ele rompeu seus laços com o Partido Republicano. Sua nomeação é um tapa do presidente na cara de todos nós que apoiamos Israel”, disse Graham no dia 7. Em entrevista à CNN, o senador afirmou acreditar que Hagel, se confirmado, “seria o secretário de Defesa mais antagonista de Israel da história de nossa nação”. O problema para o indicado de Obama é ainda maior porque se especula que, pressionados pelo lobby judeu, mesmo integrantes democratas do Comitê de Serviços Armados podem vetá-lo.
“Hagel é um político diferente de um militar. Portanto, sua característica deve ser a habilidade de costurar tanto apoio interno – dentro do Congresso, espaço importante da formulação da política externa dos Estados Unidos – quanto no âmbito diplomático”, analisa o sociólogo Reginaldo Nasser, professor de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
Segundo ele, no entanto, Hagel precisaria de um apoio maior no parlamento norte-americano para conseguir enfrentar o lobby israelense – algo muito difícil de acontecer. “Se por um lado suas posições representam um sinal importante, por outro a política dos Estados Unidos para Israel não sofreu alteração alguma durante os últimos 30 anos. Não é impossível, mas é difícil acreditar que possa acontecer uma mudança como essa”, pondera.
Brennan e Kerry
Quase tão polêmica quanto a nomeação de Hagel para o Pentágono é a de Brennan para o comando da CIA – nesse caso, porém, a oposição vem de setores mais progressistas. Funcionário da agência de inteligência norte-americana há 25 anos, ele é desde 2009 o principal assessor de contraterrorismo de Obama. É considerado um dos responsáveis pela operação de assassinato de Osama bin Laden em 2011 e um dos principais mentores da polêmica política de assassinatos seletivos por meio do uso de aviões não tripulados, os chamados drones.
Chegou a ser cotado para o cargo no início do primeiro mandato do atual presidente, mas retirou seu nome em meio a questionamentos sobre sua suposta ligação com as criticadas técnicas de interrogatório utilizadas contra suspeitos de terrorismo, incluindo o afogamento. Ele nega o envolvimento.
“Brennan mentiu sobre o ataque a Osama bin Laden e geriu o programa de assassinatos por drones de fora da Casa Branca e, portanto, livre de qualquer supervisão do Congresso. Ele foi o Dick Cheney [vice-presidente de Bush, conhecido por seu militarismo linha-dura] do Obama. Brennan foi considerado inaceitável há quatro anos por causa do seu apoio à tortura. Agora, ele é mais aceitável; o que nos mostra para qual direção os Estados Unidos estão voltados”, critica David Swanson.
De qualquer forma, na avaliação de Reginaldo Nasser, o possível novo comandante da CIA não será definidor de políticas e estratégias. “De técnicas, de táticas, para lidar com a questão do terror, isso sim. Mas a definição de grandes objetivos políticos, a médio e longo prazo, não viria dele, e sim do Pentágono, que desde o 11 de Setembro tem se credenciado mais para isso do que propriamente a CIA”, analisa.
Sobre John Kerry, Jack Hammond não acredita que haverá diferenças significativas em relação à Hillary Clinton. “Notavelmente, Hillary atuava mais com uma pessoa independente e de alto perfil do que o normal para uma secretária de Estado, chamando mais atenção para si. É menos provável que Kerry faça isso”, opina.
O professor da City University lembra que nos anos 1970, como veterano da Guerra do Vietnã, ele depôs sobre as violações de direitos humanos cometidas por soldados norte-americanos contra civis vietnamitas. “Em seus primeiros anos no Congresso e no Senado ele defendeu visões pacifistas. Mais experiente, e especialmente em sua campanha presidencial de 2004, teve muito menos vontade de se opor ao militarismo. Não tenho muita expectativa de que ele irá se distanciar da linha ‘pragmática’ de Obama, relutante a usar a força militar, mas disposto a fazê-lo quando parece ser politicamente necessário.”
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