terça-feira, 21 de junho de 2011

350 anos - A fundação de Santarém como parte de um contexto global

No Blog de Manuel Dutra

Pensar na fundação de Santarém, festejada neste 22 de junho, exige refletir nas formas como a Amazônia foi sendo inserida no mundo. Em verdade essa inserção teve início bem antes, desde que por aqui passaram outros povos curiosos e ávidos por novas mercadorias, e contra os quais, mais tarde, os portugueses tiveram que lutar e disseminar fortes militares desde a entrada do Rio Amazonas até os demais pontos sensíveis aos ataques de outros europeus. Estes perderam, na corrida, para os portugueses, e cuja lembrança se materializa hoje na existência da Guiana Francesa, no Suriname (ex-holandesa) e a Guiana (ex-inglesa).

A fundação de Santarém deu-se como parte de um projeto maior, de ocupação do Vale do Rio Amazonas. É a partir dessa premissa que podemos analisar a chegada e permanência dos portugueses na zona de confluência do Tapajós com o Amazonas naquele distante 1661.
Desde aquele primeiro e desaforado sermão de Betendorf aos Tapajós, como ficaram conhecidos os Tupaiús, até os dias de hoje, no percurso daquela mistura de aldeia com as primeiras edificações em estilo europeu, a região do Baixo Amazonas, que tem a cidade de Santarém como principal referência, permaneceu numa espécie de limbo, longe do céu, mas nem tanto no inferno. Num tempo/espaço que parece caminhar com as pernas bambas, feliz e ao mesmo tempo insatisfeito com o futuro que só chega aos pedaços, aos nacos. A pobreza desafiando tamanha potencialidade.
Parece herança portuguesa, do arrojo conquistador de uma nação pobre e pouco povoada, na direção de mares e territórios imensos.
Livre do jugo espanhol, após o fim da eufemística União Ibérica, Portugal empenhou-se em assegurar terras, rios e florestas que transformara em domínios seus, como espécie de vingança inteligente, ao fazer crescerem seus territórios durante a dominação espanhola. O que viria a ser a Amazônia, antes, quase inteira, pertencia à Espanha por graça e bênção do papa espanhol Alexandre VI, do tempo do Tratado das Tordesilhas, que viria a ser modificado por outros tratados.
A fundação de Santarém que, no meado do século 17 ainda não tinha esse nome, assim de como de outros núcleos, era ao mesmo tempo o sinal da aceleração do capitalismo mercantil, empurrado pela dinamização da vida econômica da Europa e a crescente necessidade de novas mercadorias. Nesse quadro, a Amazônia mostrava-se como a grande reserva de novas espécies para o mercado crescente.
Dessa forma, pensar na fundação desta cidade exige refletir nas formas como a Amazônia foi sendo inserida no mundo. Em verdade essa inserção teve início bem antes, desde que por aqui passaram outros povos curiosos contra os quais, mais tarde, os portugueses tiveram que lutar e disseminar fortes militares desde a entrada do Rio Amazonas até os demais pontos sensíveis aos ataques de outros europeus. Estes perderam, na corrida, para os portugueses, e cuja lembrança se materializa hoje na existência da Guiana Francesa, no Suriname (ex-holandesa) e a Guiana (ex-inglesa).
Uma inserção global que nunca mais parou e que, neste começo do século 21, muda de discurso, porém mantendo as mesmas motivações de antes: os recursos naturais da Amazônia, agora sob o conceito de biodiversidade, mais do nunca estão no centro de um debate globalizado que se arrasta há décadas.
A fim de explicar o real significado histórico e contemporâneo da fundação desta cidade, Santarém e o Baixo Amazonas estão clamando por historiadores que ultrapassem as barreiras locais e provincianas, alargando a visão do significado da ocupação da Amazônia no contexto brasileiro e internacional.
O que temos visto até o presente momento são obras, algumas feitas com esforço, mas que não vão além da visão de uma cidade e de uma região como descoladas do restante das motivações históricas do extermínio dos povos que aqui viviam e da superposição de outros povos e de seus novos interesses.
O livro “Santarém: seu desenvolvimento histórico”, escrito por Arthur Cezar Ferreira Reis e publicado em 1979, avança um pouco no relato dos fatos passados e de seu significado maior. Mas é muito pouco, até porque Ferreira Reis produziu essa obra como livro didático, sob encomenda do Ministério da Educação, assim como também escreveu a história de outros municípios amazônicos. Mas é um bom ponto de partida para quem desejar ir muito além.

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