sexta-feira, 29 de abril de 2011

O casal real e nós, os plebeus de alma

By Paulo Nogueira

A execução de Carlos I
Qual a importância do casamento de hoje?
Por que tanto espaço tem sido dado pela mídia?
Para a primeira questão, tenho resposta: nenhuma. O casamento de Andrew e Kate é apenas um a mais. A diferença são as carruagens, a pompa, os holofotes. Só isso.
Para a segunda questão, não tenho resposta. Há mutos anos este tipo de coisa é um mistério para mim. É como se, nestes momentos, o mundo inteiro se tornasse plebeu na alma e olhasse com deslumbramento tolo a pompa de reis extemporâneos. Como jornalista, sempre achei estranho tanto interesse. Lembro que era quase um garoto nos anos 80 na Veja quando a brilhante, cerebral editora-executiva Dorrit Harazim foi mandada a Londres para cobrir o casamento de Charles e Diana. Do casamento em si não tenho lembrança.
O que lembro mais vivamente é que o texto, imenso, foi refeito na redação em São Paulo na madrugada de fechamento por um dos melhores copis que vi em ação: Ricardo Setti. Talvez a própria Dorrit não tenha entendido o que estava fazendo lá.
Monarquia, na Inglaterra, se divide entre antes e depois de Carlos I. Carlos, que governou em meados do século 17, tinha poder. Muito. Mas tinha também, por perto, uma coisa chamada Parlamento. Num determinado momento, ficaram incomodados um com o outro. Carlos achava que o Parlamento tinha poder demais. O Parlamento achava o inverso.
Carlos tentou enquadrar o Parlamento, estimulado em boa parte pela mulher, mas enfrentou uma resistência épica. Numa cena histórica, um líder do Parlamento que era a favor de Carlos tinha que se levantar da cadeira para que uma medida pró-rei fosse chancelada. Parlamentares impediram, com os braços, que o líder se erguesse.
O conflito terminou em guerra civil. Em sua História da Inglaterra para Crianças, Dickens escreve com tristeza que ingleses estavam matando matando ingleses.
Foram quatro anos de guerra, ao fim da qual o Parlamento triunfou.
Carlos foi julgado pela morte de seus conterrâneos e condenado à morte. Comportou-se com bravura de filósofo na derrota e na execução.
Foi decapitado. Manteve até o fim o humor. A um militar das forças vitoriosas que elegantemente disse que estava “às suas ordens”, ele retrucou que, naquele momento, lhe restava apenas “obedecer ordens”.
Numa outra ocasião, quando estava numa espécie de prisão domiciliar, pediu a um oficial insurgente que mostrasse o s documentos legais com os quais ele o estava abordando. O oficial apontou para os soldados do lado de fora da casa. “Belos documentos”, disse o rei.
A moderna Inglaterra surgiu daí.
Nunca mais os reis tiveram poder como nos dias de Henrique VIII e outros. A força efetiva estava e sempre estaria , dali para a frente, com o Parlamento.
Quanto ao casamento de Andrew e Kate, em si, o que me ocorre é uma máxima de Rochefoucauld que coloquei hoje na Frase do Dia: “Pode haver bons casamentos. Divertidos, não.”
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