A Revista Fórum deste mês traz um artigo (matéria de capa) sobre Barack Obama. Aí vão os três primeiros parágrafos do texto:
O fenômeno Barack Obama deixou atônita a liderança do Partido Democrata, surpreendeu a favorita Hillary Clinton e fez proliferar um sem-fim de clichês. Da infeliz declaração de Caetano Veloso -- “prefiro Obama a Hillary porque gosto mais de preto que de mulher” -- à irresponsável previsão de um assassinato por Doris Lessing, sua condição de primeiro candidato negro à presidência tem funcionado como uma metonímia à qual tudo deveria ser redutível. O simplismo se exarcerbou pelo fato de que as primárias democratas foram disputadas entre ele e a primeira mulher em condições de aspirar à Casa Branca. Sexismo e racismo – elementos muito presentes na sociedade estadunidense – passaram a ser chaves explicativas mágicas. É de magnitude inegável e merecedor de análise o fato do Partido Democrata ter ungido um negro como seu candidato. Mas para se entender a dimensão do movimento Obama, há que se começar por outro lado.
A vitória de Obama representa o declínio da política consagrada no Partido Democrata pela dinastia Clinton. Depois de surrados durante década e meia pelos Republicanos, os Democratas nos acostumamos a ver a ascensão de Bill Clinton em 1992 como prova de que nossa viabilidade eleitoral dependia da estratégia clintoniana de apropriação de bandeiras Republicanas como o rigor fiscal, a “transição da ajuda social para o trabalho”, a ênfase na segurança e a política externa agressiva. Junte-se as táticas violentas de corpo-a-corpo contra os adversários, a sanha controladora sobre jornalistas e um populismo simbólico, baseado no carisma e na inteligência de Bill Clinton, e você terá os componentes do sucesso do primeiro Democrata a cumprir dois mandatos presidenciais desde Roosevelt.
Um elemento importante foi a profissionalização das campanhas eleitorais, que passaram a ser focadas em certos grupos. Ficou famosa a expressão soccer mom, cunhada por Mark Penn, conselheiro da campanha de Clinton em 1996. As “mamães do futebol” seriam aquelas que levam as filhas para a prática de um esporte que é, nos EUA, com a exceção da população latina, praticado pela classe média alta. Para essas senhoras, a questão da segurança seria decisiva e a isso havia que responder. Embora a devastação planetária dos anos Bush tenha criado a sensação de que a administração Clinton foi um paraíso, seus dois mandatos foram marcados por uma série de traições a negros, sindicalistas, feministas, gays/lésbicas e ambientalistas, parceiros fracos, sem opções à esquerda, que foram sendo rifados para que o Partido Democrata pudesse ocupar o centro do espectro político sem questionar o movimento da sociedade rumo à direita. Essa política foi vitoriosa nas eleições presidenciais dos anos 90, mas deixou um desastre no Congresso e nas eleições estaduais. Com os Clinton na Casa Branca, o Partido Democrata passou de 30 governadores em 1992 a 18 em 2000, 258 deputados em 1992 a 212 oito anos depois.
A Fórum está nas bancas, por 6 mangos e 90 centavos. Há outras matérias muito boas, incluindo-se uma sobre a Nicarágua.
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