CÉLULAS-TRONCO: ANATOMIA DO VOTO DE MENDES
Por Paulo Henrique AmorimO Presidente Gilmar Mendes (provisoriamente no exercício da Presidência do Supremo Tribunal Federal) voltou sobre a constitucionalidade das pesquisas com células-tronco embrionárias de forma que merece análise.
O Presidente (do Supremo) não precisava votar.
A maioria de 6 votos já garantia a constitucionalidade da Lei de Biossegurança.
Por que votar o Presidente? O que revela o seu voto?
É o que o Conversa Afiada tenta responder.
O Presidente votou, primeiro, para prestigiar a sua tese de que o Supremo – ou ele, o Presidente – é o Legislativo.
O Presidente fez uma longa peroração inicial para explicar que, por ele, fecha-se o Legislativo e ele – o Presidente – legisla.
O Supremo é “a casa do povo” – disse o Presidente. (Pensava que era o Congresso...)
O Supremo é um “espaço democrático”.
O Supremo é mais “idealista” que o Legislativo – disse o Presidente.
Porque o Legislativo é escravo das “emoções” – e o Supremo é a instância da “racionalidade”.
O Legislativo – disse o Presidente – se submete às relações de poder – o Supremo, não!
(O Supremo se submete ao PiG, disse o Ministro Lewandowski)
O Supremo – diz o Presidente – é a instância de “reflexão”.
O Supremo, portanto, segundo seu Presidente, é sede da “República” de Platão.
Desde Atenas que filósofos e idealistas tentam construir a “República” de Platão – sem sucesso.
O próprio Platão, quando se transformou em marqueteiro e tentou vender sua “República” a um rei, saiu fugido, antes que sua cabeça fosse separada do pescoço.
O Presidente (do Supremo) transformou os onze ministros do Supremo em reis filósofos – ele, é claro, no papel de Péricles.
Estabelecido que ele, Mendes, é o Legislativo, ele, o Presidente, passou a examinar a questão em pauta; a Lei de Biossegurança é constitucional ou não.
Aí, o voto desnecessário do Presidente – que, antes de ser lido já estava em minoria – se prestou a tentar provocar uma reviravolta, no tapetão.
Mendes, é claro, achou a lei proveniente do Legislativo uma irremediável porcaria.
Por que não uma Central Única – uma CUT – para garantir que os cientistas brasileiros – um conjunto de néscios e /ou de Franksteins – respeitassem padrões éticos?
“A manipulação genética existe exige nova ética.” – disse o Conselheiro Acácio, que ocupa a Presidência do Supremo.
“A Lei brasileira é insuficiente.” – bradou.
“Precisamos de um Comitê Central de Ética.” – exigiu o Presidente.
Temos que copiar a Alemanha! E a Espanha!
Tratava-se de irremediável tolice.
Foi o que provou o Ministro Cezar Peluso, que tomou a palavra em seguida.
A Legislação brasileira – exemplar, orgulho dos brasileiros que não são candidatos a Presidente da República – confere a duas respeitáveis instituições a tarefa de zelas pela “nova ética”.
Lembrou o Ministro Peluso que o Conselho Nacional de Saúde e o Comitê Nacional de Ética têm exatamente essa função.
A função de autorizar, dar normas, proibir e interromper pesquisas e, até, aprovar o nome dos pesquisadores que trabalhem em pesquisas de células-tronco embrionárias.
O Conselho é o “órgão último do sistema” – disse o Ministro Peluso.
O Brasil não precisa de uma CUT genética.
O que entender, então, do voto do Presidente Mendes ?
Hipótese 1: ele deu um voto inepto, porque de novo ignorou a lei brasileira sobre a matéria.
Ele entende muito de Alemanha, mas nada de Brasil – é o que se entende da declaração do Ministro Peluso!
Ou, hipótese 2: o Ministro- Presidente (do Supremo) quis ganhar no tapetão.
Os votos da minoria – minoria de 5 contra 6, é bom lembrar, sempre – eram ambíguos.
Falavam que a Lei da Biossegurança é constitucional, MAS, MAS, falta isso, falta aquilo.
E já no noticiário da véspera, o PiG – que não costuma entender nenhuma questão um pouco mais complexa – ficou em dúvida: a lei é constitucional, mas só pode ser aplicada se atender às solicitações dos Ministros que compõem a minoria?
Dúvida cruel.
Dúvida que só aumentou com o voto do Presidente (do Supremo): quer dizer que a lei só vale se houver a Central Única – a do Ministro e, não, a que já existe?
Como é que fica?
O Presidente Mendes instaurou o caos – porque é o Presidente e porque foi o último a votar.
Até que se ouviu a voz da luz e da razão.
Do Ministro Celso de Mello.
A MAIORIA de 6 votos decidiu que a lei é constitucional e basta – disse Mello.
Não tem mais nem meio mais.
O Supremo NÃO é Legislativo nem o Executivo – disse Mello.
Se o Legislativo e o Executivo quiserem ler e dar atenção às sugestões dos Ministros da MINORIA, isso é decisão deles – disse Mello.
O papel do Supremo era julgar a constitucionalidade da lei e a MAIORIA decidiu que a lei é constitucional.
O Presidente Mendes recolheu o tapetão e proclamou a vontade da MAIORIA.
Em tempo 1: o voto do Ministro Carlos Alberto Direito – responsável pelo atraso na votação – é uma obra prima de obscurantismo. Como diz a cientista Lygia Pereira (clique aqui para ler ), as opções “científicas” que ele ofereceu significariam, na verdade, o fim das pesquisas, mais ortodoxo que o católico autor da Adin – o ex-procurador Cláudio Fonteles –, Direito deu uma no cravo e outra na ferradura – ficava bem na foto, porque se disse a favor da pesquisa – e ao mesmo tempo a tornava inviável. O Ministro Direito tem a “Opus Dei” nas suas células-tronco.
Em tempo 2: Ministros do Supremo agora pensam que são renomados cientistas, teólogos ou filósofos. Ministro do Supremo julga a constitucionalidade de leis. Quem discute a origem e o fim da vida é teólogo e filósofo.
Em tempo 3: O Jornal da Globo, como sempre, esteve tão perto do que aconteceu na sessão do Supremo quanto William Waack está de Marte. O repórter Heraldo Pereira informou que o momento “Fiat Lux” da sessão foi o voto do Ministro (?) Marco Aurélio Mello. E reproduziu um truísmo enfadado do Ministro (?) Mello. É assim que se faz uma fonte. E se dá notoriedade a quem não merece.
Em tempo 4: A TV Justiça é um câncer. Os “repórteres” não sabem do que falam. As “reportagens” são inúteis. A TV Justiça só serve para transformar Ministros da Corte Suprema em estrelas de tevê. Alguém já viu uma câmera aberta na Corte Suprema da Inglaterra ou dos Estados Unidos? A TV Justiça é outra contribuição brasileira à civilização ocidental.
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