Dez índios makuxis foram baleados por seguranças da fazenda Depósito, na área conhecida como Raposa Serra do Sol, em Roraima. Os índios afirmam que a terra é deles e ocuparam uma área da fazenda. Os seguranças que atiraram contra os índios usavam capuz.
O coordenador de programas do Conselho Indígena de Roraima Júlio Makuxi disse entrevista a Paulo Henrique Amorim que os homens encapuzados saíram da sede da fazenda e andaram sete quilômetros para chegar ao local da ocupação e atirar nos índios.
Já o dono da fazenda Depósito Paulo César Quartiero disse em entrevista a Paulo Henrique Amorim que os índios entraram na fazenda e atacaram primeiro os seguranças com pedras e flechadas.
Em tempo: O Ministro (?) Marco Aurélio de Mello declarou seu voto na disputa entre índios e produtores de arroz, em Roraima. Disse ele: “se exacerbarmos a ocupação pretérita” ... teremos que devolver o Rio aos índios. “Ocupação pretérita” ... francamente, só o PiG leva esse Ministro (?) a sério. O Ministro (?) disse também que “todo conflito gera preocupação” ! Isso é um gênio !, diria o Chico Anísio. O Conversa Afiada perguntou ao Presidente do Supremo (provisoriamente, até assumir a Presidência da República), Ministro Gilmar Mendes, se considera o Ministro (?) Mello legalmente qualificado para votar sobre a reserva Raposa Serra do Sol no Supremo, uma vez que Mello já declarou seu voto ao PiG. O Conversa Afiada perguntou também à liderança do PT se não é o caso de interpelar, de novo, o Ministro (?) Mello, já que, de novo, ele anuncia o voto ao PiG, antes de julgar.
Em tempo 2: Hoje, terça-feira, no “Bom (?) Dia Brasil”, Renato Machado e Alexandre Garcia vestiram o chapéu de John Wayne a partiram para cima dos índios. Ficou difícil saber quem era mais corajoso na defesa do homem branco.
Leia as íntegras das entrevistas com Júlio Makuxi e Paulo César Quartiero e conheça as duas versões para o confronto:
Entrevista com Júlio Makuxi:
Paulo Henrique Amorim – Eu vou conversar agora com Júlio Macuxi, que é coordenador de programas da associação indígena da área de Raposa Serra do Sol em Roraima. Como vai, Júlio? Tudo bem?
Júlio Macuxi – Tudo jóia. Estamos na correria, com dez parentes baleados.
Paulo Henrique Amorim – Júlio, você pode me descrever o que aconteceu nesse conflito entre índios macuxi e Ingarikó, que foram feridos a bala? O que aconteceu?
Júlio Macuxi – Na verdade, as comunidades indígenas estão dentro de uma terra homologada, demarcada e registrada foram fazer comunidades indígenas com essa ocupação, como de costume. A gente tem caça, pesca. E fomos surpreendidos por pistoleiros, uma milícia armada e liderados por Paulo César Quartieiro. E já chegaram dando tiros e jogando bombas em cima das comunidades indígenas. E nesse confronto dez indígenas foram baleados e dois em estado grave, que estão internados no hospital. Os outros já tiveram alta.
Paulo Henrique Amorim – É possível identificar esses pistoleiros?
Júlio Macuxi – Olha, nós temos algumas... eles estavam encapuzados esses pistoleiros. Eles saíram da sede da fazenda e atacar a comunidade em torno de 7 quilômetros nós estamos fazendo as casas, já perto da fazenda. E foram de motos, caminhonetes atacar as comunidades indígenas.
Paulo Henrique Amorim – E você disse que eles trabalham ou estavam a serviço de um plantador de arroz, é isso?
Júlio Macuxi – Eles saíram da sede da fazenda, que é posse do invasor Paulo César Quartieiro que, inclusive, está com o pagamento em juízo, do depósito de pagamento da prefeitura em juízo. Então, ele ataca as comunidades indígenas.
Paulo Henrique Amorim – Os pistoleiros saíram da sede da fazenda de Paulo César Quartieiro, é isso?
Júlio Macuxi – Isso. Saíram da sede da fazenda e andaram sete quilômetros para atacar a a comunidade.
Paulo Henrique Amorim – Como é que se chama essa fazenda do Quartieiro?
Júlio Macuxi – Fazenda Depósito. E fica na Raposa Serra do Sol.
Paulo Henrique Amorim – Quantos homens encapuzados eram, você sabe?
Júlio Macuxi – Mais ou menos em torno de cinco pessoas encapuzadas fortemente armadas, mas tinha mais gente que isso, também lá com eles. Mas os que estão na linha de frente, atacando as comunidades, é em torno de cinco a seis pessoas armadas.
Paulo Henrique Amorim – Como elas estavam armadas?
Júlio Macuxi – Revólveres, pelo tamanho da arma, e também espingardas. E bombas, que ficaram jogando nas comunidades.
Paulo Henrique Amorim – Eles atiraram com revólver ou com espingarda ou com os dois?
Júlio Macuxi – Os dois. É uma milícia armada. Eles avançavam em direção à comunidade atirando.
Paulo Henrique Amorim – O Quartieiro, eu leio aqui uma reportagem de Loide Gomes, do jornal O Estado de S. Paulo, ele diz que os índios atacaram ou invadiram a fazenda dele, armados de cacetetes e de arco e flecha, os funcionários disseram que quando tentaram retirá-los, eles atiraram flechas. Então, houve a reação. Alguns índios entraram na fazenda Depósito, do Quartieiro, ou não?
Júlio Macuxi – Não. Não entraram na fazenda. Só para ter uma idéia: as comunidades estão a sete quilômetros de distância da sede da fazenda. E se fossem atacados, eram em torno de 110 pessoas que estão lá para trabalhar. E esse pessoal armado era apenas sete. Se fosse o caso... A gente não foi para o confronto, a gente não atacou ninguém.
Paulo Henrique Amorim – Vocês não jogaram pedra nem usaram arco e flecha nos pistoleiros?
Júlio Macuxi – Não, não. Não foi feito isso porque eles chegaram atirando, jogando bombas e fez as vítimas. Então, na verdade, eles correram dali, mas depois retornaram para juntar as pessoas baleadas.
Paulo Henrique Amorim – Quantos estão feridos?
Júlio Macuxi – Dez feridos.
Paulo Henrique Amorim – Quanto tempo durou o conflito?
Júlio Macuxi – O conflito durou acho que em torno de uma hora. A Força Nacional chegou a tempo de os pistoleiros saírem do local.
Paulo Henrique Amorim – Por que a Força Nacional não prendeu eles?
Júlio Macuxi – Essa é a nossa mesma pergunta. Por que não prende as pessoas que andam armadas, fortemente armadas na terra indígena.
Paulo Henrique Amorim – Quando a Força Nacional chegou eles ainda estavam lá?
Júlio Macuxi – Eles perceberam a chegada dos carros da Força Nacional, da Polícia Federal no local.
Paulo Henrique Amorim – Você descreve isso por que você estava lá ou você ouviu o testemunho de pessoas que estavam lá?
Júlio Macuxi – Eu ouvi testemunhos e vi as fitas gravadas, as filmagens de lá. Eu posso até te passar se você quiser.
Paulo Henrique Amorim – Mas você não estava no local na hora do conflito.
Júlio Macuxi – Não estava no local na hora do conflito, eu só ouvi as testemunhas e vi as filmagens.
Paulo Henrique Amorim – Quem filmou?
Júlio Macuxi – Um cinegrafista indígena, que acompanha o trabalho, lá da própria comunidade.
Entrevista como Paulo César Quartiero:
Paulo Henrique Amorim – Eu vou conversar agora com o produtor de arroz Paulo César Quartiero, que trabalha na fazenda Depósito, que opera na fazenda Depósito, na área Raposa Serra do Sol, em Roraima. Senhor Paulo César Quartiero, eu gostaria de saber o seguinte: eram homens que trabalhavam para o senhor aqueles encapuzados que atiraram nos índios a 7 quilômetros da sede da sua fazenda?
Paulo César Quartiero – Eram funcionários, vigias, da fazenda, sim.
Paulo Henrique Amorim – E por que eles estavam encapuzados?
Paulo César Quartiero – Na realidade, eu não sei. Eu não estava lá, eu não vi. Eu não estava lá e o fato de estarem encapuzados eu nem sei. Vi um filme aqui que passou, mas eu não estava lá. Mas certamente alguma coisa houve, mas eu não sei explicar o por quê.
Paulo Henrique Amorim – Se eles estavam encapuzados, como se pode dizer que eles trabalham para o senhor?
Paulo César Quartiero – Não, isso aí, eu já falei. Eu não estava lá e nem estava também... minha comunicação lá é deficiente. Agora, o pessoal lá... o que a gente tem que entender é a circunstância que as coisas aconteceram. Há até lá uma forte presença da Polícia Federal, que trabalha exclusivamente protegendo um lado, que é o lado dos índios, que é o lado que...
Paulo Henrique Amorim – Senhor Quartiero, antes de entender a posição da Polícia Federal, eu gostaria de entender o episódio que ocorreu lá perto da sede da sua fazenda. Eu pergunto: o senhor não estava no local na hora?
Paulo César Quartiero – Não, não estava. Estava aqui na prefeitura.
Paulo Henrique Amorim – O senhor é prefeito de que cidade?
Paulo César Quartiero – Pacaraima.
Paulo Henrique Amorim – Há quanto tempo fica a sede da prefeitura da sede da fazenda, quantos quilômetros de distância?
Paulo César Quartiero – Em torno de 80 quilômetros.
Paulo Henrique Amorim – A informação que o senhor tem revela o que? Quem atacou quem?
Paulo César Quartiero – A informação que eu tenho, não. Os índios invadiram a fazenda capitaneados pela Funai e entraram lá houve reação e houve o confronto. Nesse confronto se feriu gente. E eles estão lá até hoje. Estão lá dentro da minha fazenda. Invadiram e estão lá até hoje, construíram barraco. Estão lá e a Polícia Federal assiste.
Paulo Henrique Amorim – Os índios invadiram a sede da sua fazenda Depósito?
Paulo César Quartiero – Não, eles invadiram a área da fazenda Depósito, não a sede. Invadiram uma área da frente da fazenda.
Paulo Henrique Amorim – Mas acontece que eu conversei antes com o Julio Makuxi, que é coordenador de programas do Conselho Indígena de Roraima, e ele me disse que esses homens encapuzados viajaram 7 quilômetros para chegar aonde estavam os índios e aí começaram a atirar nos índios?
Paulo César Quartiero – Essa é uma explicação dele. A fazenda, inclusive, acho que não dá essa distância da sede até o local onde eles estavam. Mas tem uma declaração dele aqui no jornal dizendo que, do Julio Makuxi, dizendo que “a ocupação da fazenda Depósito, do Paulo César Quartiero, se deu pela necessidade de ampliar a comunidade Renascer, que fica próximo à cerca de propriedade. Segundo ele, a comunidade Renascer estava sufocada e a área da fazenda Depósito se deu como melhor alternativa para a comunidade”.
Paulo Henrique Amorim – Mas essa é uma discussão que o Supremo via definir: se a área pertence ao senhor ou se a área pertence aos índios. É uma questão que está sub judice, digamos assim. O que eu quero saber é o seguinte: quem iniciou o ataque, foram esses homens encapuzados, que o senhor identifica como sendo homens que trabalham na sua segurança, ou foram os índios?
Paulo César Quartiero – Quem invadiu a propriedade e cortou os 50 metros de cerca? Nós que fomos na comunidade deles ou eles que vieram na fazenda? Eles invadiram a fazenda e houve reação, houve o confronto. Invadiram de forma agressiva, flechando os meus funcionários, e houve esse entrevero e, infelizmente, houve feridos.
Paulo Henrique Amorim – Eu gostaria de entender, então, segundo essa sua descrição. Quem atirou primeiro, os homens encapuzados armados ou os índios com flechas?
Paulo César Quartiero – A notícia que eu tenho é que o pessoal chegou lá e foi flechado.
Paulo Henrique Amorim – Portanto, na sua versão os índios flecharam os homens encapuzados?
Paulo César Quartiero – Exatamente, porque eles foram lá exigir que se retirassem da fazenda e foram recebidos dessa maneira.
Paulo Henrique Amorim – Agora, o senhor considera que o senhor foi invadido, os índios dizem que a terra é deles. Por que o senhor diz que a terra é sua?
Paulo César Quartiero – Quem vai dizer se a terra é deles ou minha é o Supremo Tribunal Federal. Eu estou aguardando a decisão. E por que eles não aguardam? Por que partem para a violência? Nós estamos aguardando, esperando que o Supremo decida a questão. Vamos acatar a decisão, seja qual for. E eles estão dizendo que não vão obedecer, que a terra é deles e acabou. Eles estão desconhecendo a Lei e partiram para a violência, como sempre fizeram.
Paulo Henrique Amorim – Então, o senhor considera que eles jogando flechas e pedras nesses homens é um ato tão violento quanto os tiros desferidos contra eles por esses homens que o senhor identifica como sendo homens que trabalham para o senhor?
Paulo César Quartiero – Veja bem, a violência, na realidade, é a invasão da propriedade e o desrespeito à decisão da Justiça do Brasil, isso é violência. Agora, o direito de resistir à violência nos cabe. Na verdade, além do direito, nós temos a obrigação de nos defender.
Paulo Henrique Amorim – O senhor sabe que há 10 índios feridos?
Paulo César Quartiero – Sim, sim. Eles foram tratados inclusive aqui no nosso hospital de Pacaraima.
Paulo Henrique Amorim – E no momento qual a sua atitude? O que o senhor vai fazer com esses índios acampados nessa área que o senhor considera que é sua e que eles consideram que é deles?
Paulo César Quartiero – Já pedi a reintegração de posse na Justiça e vou tratar a questão de forma legal. O interessante é que lá tinha um forte destacamento da Polícia Federal que estava lá para manter a ordem e assistiu a essa invasão sem fazer nada. Então a responsabilidade por essa situação é a atitude do Governo Federal, incentivando a violência dentro de Roraima, dentro do Município. Nós temos aqui há um mês prédios da prefeitura ocupados com a presença da Polícia Federal, temos ameaças constantes de retiradas de não-índios. Eles disseram que em 48 horas iriam retirar todos os não-índios à força, temos a proibição de entrar e enquanto isso a Polícia Federal a passear, a gastar dinheiro público sem fazer nada. Então, aqui, o responsável pela violência chama-se Governo Federal. Outra coisa, o Ministro da Justiça sabia que havia no Supremo Tribunal Federal 33 ações contestando aquelas terras. Como ele mandou esse exército de invasores aqui para Roraima, gastar dinheiro público, intimidar as pessoas de bem aqui? Ele não sabia que o Supremo ia dar essa liminar?
Paulo Henrique Amorim – Quem são as pessoas de bem no seu Estado?
Paulo César Quartiero – São os habitantes do Estado. Aqui nós temos patriotas, trabalhadores. Infelizmente, como em todos os lugares, temos alguns que envergonham, mas nosso povo é trabalhador, é honesto e é responsável por manter a soberania brasileira nesse rincão distante, abandonado. Aqui o Governo brasileiro só se apresenta com exército a fim de pisar e humilhar as pessoas do nosso Estado.
Paulo Henrique Amorim – O senhor acredita que a decisão do Supremo deva sair em quando tempo?
Paulo César Quartiero – Não sei. De Justiça, eu não entendo nada. Eu sou um agrônomo, não entendo de Justiça, simplesmente acredito na Justiça.
Paulo Henrique Amorim – Qual a sua produção na sua fazenda?
Paulo César Quartiero – Nós produzimos aqui em torno de 300 mil sacos de arroz. E temos lá 1.250 hectares de soja e temos também uma 4 mil cabeças de gado.
Paulo Henrique Amorim – O senhor já viu o voto proferido pelo Ministro Marco Aurélio Mello?
Paulo César Quartiero – Não, ele comentou. Aquilo não é voto. Ele comentou alguma coisa. Em questão de Justiça eu não dou palpite porque não é minha área.
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